— No dia que a guerra começou, minha esposa me ligou e disse que ouviu explosões em Kiev, meu filho me ligou e disse que a guerra havia começado. Meu filho me perguntou se ele iria morrer (emocionado). Eu falei que ele ia continuar vivo e que eu tinha esperança nos nossos militares. Nosso espírito ucraniano é muito forte.
Esse foi o relato de Dmytro Ukrainets, goleiro da equipe de futebol masculina da Ucrânia, que está em Caxias do Sul para a disputa das Surdolimpíadas, sobre o contato que ele tinha com a sua esposa Valentina Ukrainets e com o filho Dmytro Ukrainets no dia em que o conflito entre os ucranianos e a Rússia começou no Leste Europeu. Tanto a esposa quanto o filho encontram-se na Itália. Ele espera reencontrar ambos assim que os jogos no Brasil acabarem.
A fala dele comoveu todos os presentes na coletiva de imprensa da delegação ucraniana no Bolicho dos Piardi, nos Pavilhões da Festa da Uva.
A fala é apenas mais uma das inúmeras manifestações que os representantes ucranianos vêm fazendo durante as disputas das competições nas Surdolimpíadas. Ainda na cerimônia de abertura, a delegação ucraniana entrou no ginásio do Sesi com uma bandeira do país com os dizeres "Stop War" ("pare a guerra'', em tradução para o português).
A Ucrânia possui a segunda maior delegação das Surdolimpíadas, com 258 atletas, atrás apenas do Brasil, que conta com 325. Muitos atletas foram acolhidos em outras nações para treinarem durante a preparação para o evento — o que implica que muitos estejam passando mais de meses longe de familiares e amigos.
— É um momento muito emocionante para a gente. Apesar de todas as incertezas, nosso time chegou para participar das Surdolimpíadas. É emocionante como o Brasil está recebendo os nossos atletas. Nesse momento, a Ucrânia está vivendo uma guerra, protegendo a si mesmo, mas também a democracia. As pessoas surdas são as que não estão ouvindo a mensagem “paz para a Ucrânia” — Anatoliy Tkach, responsável de negócios do embaixador ucraniano no Brasil, uma das autoridades presentes no evento da tarde desta terça-feira (03).
Além deles, também compareceram ao evento o presidente do Comitê Surdo Ucraniano, Leonid Kasitskyi, e o presidente do Comitê Nacional de Esportes para Deficientes, Valeriy Sushkevych. É consenso entre eles que a possibilidade de conquistar uma medalha é também um incentivo para levar um pouco de felicidade para um povo que vem sofrendo com a guerra em seu território.
— Nunca na história do nosso movimento tivemos que participar enquanto está tendo uma guerra. É algo muito grave no nosso país. Nós vamos mostrar o nosso melhor resultado e tenho certeza que a gente vai conseguir muitas medalhas e conquistas para todo o povo ucraniano, que luta na nossa terra. Nossos corações estão lá com eles — explicou Kasitskyi.
Ainda que outras nações estejam tentando mediar um cessar-fogo entre Ucrânia e Rússia, as negociações ainda não avançaram muito, o que pode não garantir que os atletas consigam voltar para casa quando as Surdolimpíadas se encerrarem no dia 15 de maio.
Se por um lado os russos foram excluídos da competição pelo Conselho Executivo do Comitê Internacional de Esportes de Surdos (ICSD) em virtude da guerra, os ucranianos surgem como os principais favoritos para conquistarem medalhas em Caxias do Sul.