Erguidos do zero ou recauchutados no entusiasmo da Copa do Mundo de 2014, grandes estádios de futebol do Brasil passaram a atender por arenas. Gourmetizados no conceito e na aparência, porém, boa parte desses novos templos do esporte nacional, que acenavam em direção a uma era de maior profissionalismo na gestão dos clubes e, principalmente, no tratamento ao público que banca o espetáculo, está ainda distante de oferecer experiência plenamente satisfatória em todo o seu ciclo: o antes, o durante e o depois do jogo.
Em que pese a abissal diferença entre as realidades econômica e social de Brasil e Alemanha, encontra-se na Allianz Arena, casa do Bayern em Munique, o exemplo do estádio em que o espectador é tratado com a devida reverência. Porque oferece, além do show dos atletas em campo, uma integração de serviços que, descontados os fartos recursos privados, destaca o poder público cumprindo obrigações em áreas vitais negligenciadas no Brasil, como transporte, mobilidade e segurança.
Dinheiro, sabe-se, não falta ao Bayern. Clube de futebol com maior número de associados no mundo (fechou 2017 com 290 mil carteirinhas, recorde na sua história), e receita próxima dos 640 milhões de euros na temporada passada (em torno de R$ 2,5 bilhões), o time bávaro é colecionador de títulos nacionais e continentais.
Agrega em seu orçamento milionário marcas como Allianz, Audi, Adidas, Lufthansa, Goodyear e uma que se destaca por colocar o clube na linha de frente das inovações tecnológicas: a gigante industrial Siemens, também com sede em Munique.
O Bayern ocupa a Allianz Arena desde maio de 2005. Em julho do ano passado, seus dirigentes firmaram com a Siemens um contrato para incrementar, até 2020, a presença do conglomerado alemão no estádio para além dos elementos já presentes, como telefonia e iluminação.
É um trabalho que agregará soluções digitais inovadoras, que abrangem segurança, com sistemas de reconhecimento facial e acesso biométrico nas catracas, automação de operações, como gestão de tráfego e mobilidade, e ações sustentáveis nos campos de suprimento de energia e água. Tudo em benefício direto ao público e extensivo também ao Audi Dome, sede do time de basquete do Bayern, localizada a 15 quilômetros de distância.
Estreitar os laços com um dos mais poderosos times de futebol do planeta foi de tal importância para a Siemens que a empresa destacou a parceria no grande evento que promoveu em Munique, em dezembro, reunindo jornalistas de todo o mundo. O encontro incluiu uma visita guiada à Allianz Arena, um dia após o Bayern vencer o Colônia por 1 a 0 pelo campeonato alemão.
Sacos de lixo transparentes com copos de cerveja, depositados discretamente em cantos do estádio, e o piso um pouco grudento em alguns setores restavam como indícios perceptíveis de que 75 mil pessoas estiveram ali horas antes confortavelmente acomodadas. Nenhum papelzinho indevido no entorno do estádio, banheiros todos reluzentes.
EM 2017, A ARENA RECEBEU 3,5 MILHÕES DE VISITANTES
A arena do Bayern fica aberta 365 dias por ano. Abriga shopping, restaurantes, bistrôs, cervejaria (a Paulaner é uma das marcas associadas ao time) e centros de eventos. A movimentação diária com turistas faz a roda do faturamento girar. Em 2017, foram 3,5 milhões de visitantes cumprindo o passeio de 60 minutos, que circula por vestiários, sala de entrevistas, os três anéis das cadeiras e, momento de clímax, proporciona um simulação de entrada em campo, com as pessoas enfileiradas como os atletas da casa e do time visitante.
Essa visita parte de valores mais acessíveis para grupos, entre R$ 48 e R$ 26 (seis a 13 anos) e alcança salgados R$ 200 (maiores de 13 anos) e R$ 160 (zero a 13) em dias de jogos – com ingresso comprado em separado, exceto em partidas da Liga dos Campeões.
Aos jornalistas, foram abertas duas áreas fundamentais nas operações da Allianz Arena. Na sala da segurança, profissionais do clube e policiais de Munique trabalham em conjunto diante de um grande painel com o mosaico das 90 câmeras de altíssima definição espalhadas dentro e fora do estádio. Em caso de alerta, cerca de 150 agentes localizados em pontos estratégicos (número que varia conforme a importância do jogo) podem agir em poucos segundos.
Já na sala de monitoramento de trânsito, agentes da prefeitura de Munique podem coordenar horários das linhas de metrô, ônibus elétrico e trem e também agilizar o fluxo de veículos no entorno e nas rodovias próximas – interferindo, por exemplo, no tempo de sinaleiras e providenciando eventuais bloqueios. O projeto arquitetônico do estádio garante que, após o apito final, não se tenha mais nenhum torcedor lá dentro em 15 minutos, todos rumando em direção a 11 mil vagas dos estacionamentos e às estações de transporte público.
Curiosamente, o caráter multiuso da Allianz Arena não comporta uma fonte de receita comum nas arenas brasileiras, os grandes espetáculos musicais.
– Só quem canta aqui é o nosso torcedor – brincou Michael Fichtner, responsável pela área de tecnologia da informação do Bayern.
Por dentro da Arena
-Inauguração em 30 de maio de 2005
-Capacidade para 75 mil pessoas
-Três anéis com cadeiras
-Wi-fi grátis para acesso simultâneo de até cem mil pessoas
-Em operação 365 dias do ano
-3,5 milhões de visitantes por ano
-90 câmeras de monitoramento de alta definição
-Dois telões ultra HD com 200metros quadrados
-Estrutura iluminada com 304,1 mil lâmpadas de led, que permitem milhões de diferentes combinações de cores
POR DENTRO DO BAYERN
-Fundado em 27 de fevereiro de 1900
-290 mil sócios em dezembro de 2017
-Clube com maior número de sócios do mundo, à frente de Benfica (156 mil) e Barcelona (143 mil)
-640 milhões de euros de receita em 2017 (R$ 2,5 bilhões)
-652 milhões de seguidores nas redes sociais em diferentes idiomas (34 milhões no Brasil e na Argentina)
-Um título do Mundial de Clubes, cinco da Liga dos Campeões e 27 do campeonato alemão, entre outros
*O repórter viajou a convite da Siemens