Após a publicação da série de reportagens Submundo das Lutas, representantes da Federação Gaúcha de Muay Thai Esportivo decidiram organizar uma etapa do campeonato estadual da modalidade em Porto Alegre para arrecadar fundos à família de Maria Luiza Ramos, jovem de 22 anos que está em estado vegetativo desde outubro de 2011.
Com apenas três meses de treino, ela se inscreveu em um campeonato de muay thai e foi colocada para lutar com um adversária com dez anos de experiência. No momento da luta, entraram em acordo para dispensar os equipamentos de proteção. Maria Luiz sofreu diversos golpes na cabeça e, ao final do combate, sofreu um desmaio seguido de um derrame cerebral. A ambulância do evento se negou a levá-la ao hospital. Mais de 50% do seu cérebro foi comprometido e hoje a menina, moradora de Canoas, vive sobre uma cama, sem nenhum tipo de comunicação e utilizando fraldas.
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A tragédia de Luiza, resultado de uma série de irresponsabilidades em torneios sem as mínimas condições de segurança, sensibilizou parte da comunidade das lutas.
- O muay thai tem de dar uma resposta para a família - afirmou Eduardo Virissimo, presidente da Federação Gaúcha de Muay Thai Esportivo.
A intenção dos líderes da entidade é organizar o torneio no primeiro semestre de 2015, como uma etapa do campeonato estadual. A previsão é reunir entre 400 e 600 atletas. Parte da arrecadação com inscrições e ingressos deverá ser repassada a Vera Lucia Mello Ramos, 58 anos, mãe de Luiza. Para cuidar da filha, ele teve de parar de trabalhar. Atualmente, um de seus objetivos é construir um banheiro adaptado na casa humilde para atender melhor as necessidades da jovem. Vera move um processo contra a Transul, empresa de ambulância contratada para atuar no campeonato de 2011 e que não prestou socorro a sua filha, solicitando indenização de R$ 1 milhão.
- Somos filiados à Confederação Brasileira de Muay Thai (CBMT), com sede no Rio, presidida pelo Artur Mariano. Estamos esperando a divulgação do calendário nacional e, depois, vamos analisar as datas disponíveis para organizar esse torneio. Está na nossa pauta - explicou Virissimo, se referindo ao evento destinado a angariar fundos para Luiza.
Na série Submundo das Lutas, ZH mostrou a face mais obscura e menos charmosa do muay thai e do MMA. Em campeonatos amadores em Porto Alegre, um repórter sedentário conseguiu fazer a inscrição e obter autorização para lutar em um evento de MMA mesmo sem jamais ter praticado artes marciais vinculadas ao esporte. Bastou pagar a taxa de inscrição. Nos torneios, foram verificadas outras fragilidades, como a dispensa de equipamentos de proteção, lutas com desníveis técnicos e ambulâncias proibidas de deixar o local dos enfrentamentos para transportar lesionados.
Com a proliferação de federações que disputam o mesmo espaço de mercado, a reportagem de ZH também conseguiu negociar a compra de prajied - a faixa do muay thai - com quatro entidades. Com uma delas, a transação foi efetivada e um repórter de ZH sem nenhum conhecimento da arte marcial obteve certificado de grau preto de muay thai, com autorização para atuar como professor. Não foi preciso comprovar nada ou demonstrar conhecimento, bastou fazer o pagamento de dois salários mínimos (R$ 1.448).
Para Virissimo, é fundamental trabalhar com maior grau de exigência. Em campeonatos, diz ele, somente podem ser aceitas inscrições de atletas registrados em federações e academias, com a indicação de professor graduado responsável. Outra providência da federação foi aconselhar os seus instrutores e professores afiliados a fazerem o curso de Educação Física.
- Estamos tentando parcerias com pessoas do meio jurídico para estabelecer um regulamento esportivo das artes marciais no Rio Grande do Sul - diz Virissimo, apontando uma alternativa para fiscalizar e estabelecer padrões mais seguros para o muay thai.
Diretor técnico da Federação Gaúcha de Muay Thai Esportivo, Hélio Dipp afirma que é possível praticar arte marcial de forma sadia. Entre os feitos positivos das lutas, cita a formação de atletas e um projeto social que atende gratuitamente cerca de 600 crianças em situação de vulnerabilidade social. Elas estão praticando muay thai e jiu-jítsu em Bento Gonçalves, na Serra gaúcha.
Submundo das Lutas: repórter compra faixa preta de muay thai por R$ 1.448