A primeira surpresa após a chegada foi ver Nick Bollettieri de camisa.
Por muito tempo, ele foi o treinador de tênis mais famoso do mundo, até Ivan Lendl, Boris Becker e companhia virarem a profissão do avesso. E a escolha irremediável de Bollettieri pelo sol da Flórida faz tanto parte de sua persona quanto sua incapacidade de guardar nomes, sua voz de vendedor nato, seus inúmeros casamentos e sua capacidade de criar campeões.
Porém, aos 82 anos de idade, com o recente anúncio de sua inclusão no Hall da Fama Internacional do Tênis, seus dias de jogar sem camisa na quadra são mais curtos e mais espaçados, mesmo que a pele permanentemente bronzeada tenha permanecido.
- Tive sorte com o câncer de pele, rapaz. Tudo o que meus patrocinadores precisavam fazer era me dar os shorts.
Muitas outras coisas mudaram ao longo das décadas. Agora, ele passa a maior parte do tempo treinando jogadores em uma quadra coberta e já não chega tão cedo para trabalhar, embora ainda veja o sol nascer com frequência. Ele grita menos e elogia mais, além disso, ele também parece - embora seja apressado dizer que por muito tempo - ter finalmente arranjado um casamento duradouro com Cindi, sua oitava esposa, e seus dois filhos adotados - de 6 e 9 anos de idade - da Etiópia.
- Ela é uma ótima mãe. E ela fez um ótimo estudo de onde adotar as crianças. A Etiópia era o lugar com as crianças mais gentis. Dois anos de pesquisa e os dois são uma doçura. Meu Deus, como eles são bonzinhos. Tem um que é a minha cara. É um doidinho. O outro é calmo, tranquilo e reservado - afirmou Bollettieri em uma entrevista recente na IMG Academy, em Bradenton.
O que não mudou é a abordagem de Bollettieri em relação ao esporte que nunca permitiu que ele se arrependesse de abandonar a faculdade de direito aos 20 e poucos anos; o esporte que ele nunca jogou - para a consternação de alguns de seus críticos - em nível profissional.
Ele ainda é apaixonado pelo que faz, ainda faz muitas anotações enquanto assiste torneios profissionais e ainda vive à procura do próximo campeão, ou do próximo grande nome em meio aos atletas jovens, mesmo que tenha aprendido da pior forma que prever o resultado do Grand Slam quase sempre é um lance de sorte.
- Agora estou pensando que temos que ser mais realistas a respeito do futuro. Hoje em dia o mundo todo joga tênis e, há muitos anos, só existiam uns seis países com jogadores. Agora estamos competindo contra o mundo, de forma que é muito mais difícil para mim quando alguém chega e pede para eu falar sobre o próximo campeão. Estou muito mais relutante - afirmou, apontando para quatro alunos de sua academia que estavam na quadra.
- Não costumava ser fácil, mas era mais simples. Vou contar uma história curiosa sobre Dick Vitale. Dick estava lá na nossa quadra e eu estava acompanhando uma menina magrela. O Dick começou a me xingar: 'O que você está fazendo com essa magrela aí? Olha minhas filhas lá do outro lado, Nick'. Então eu respondi: 'Dicky, esta menina vai ser a Número 1 do mundo'. E ele respondeu: 'Nick! Você está maluco? Como é que ela se chama?' E eu disse: 'Monica Seles' - continuou Bollettieri. Vitale é um velho treinador de basquete que se tornou locutor da ESPN.
Seles, nascida na antiga Iugoslávia, realmente chegou ao topo, como muitos dos futuros Número 1 que treinaram ou viveram na academia, incluindo Andre Agassi, Jim Courier, Maria Sharapova, Marcelo Rios e Serena e Venus Williams. Sharapova, que tem uma casa em Longboat Key, ainda usa a academia como base. Outros atletas que estão na ativa e que treinaram ali recentemente incluem Tommy Haas, Kei Nishikori, Sabine Lisicki, Petra Kvitova e o namorado Radek Stepanek.
Bollettieri afirmou que pediu US$ 1 milhão emprestados de um amigo, Louis Marx Jr., e construiu a academia em 1980, em um lugar onde havia uma plantação de tomates. Entretanto, a capacidade de gestão de Bollettieri não se mostrou tão boa quanto suas habilidades motivacionais, e ele vendeu a propriedade em 1987 durante um momento de crise para a IMG e seu fundador, Mark McCormack.
Quase 30 anos depois, muitos ainda chamam o lugar de Bollettieri Academy. Contudo, embora haja uma estátua de bronze feita à imagem de Bollettieri na entrada principal, seu sobrenome não está mais em destaque. Ele foi retirado em 2001, e a IMG Academy treina oito esportes diferentes, com a adição recente do atletismo.
O programa de treinamento de tênis, com suas 52 quadras e 215 alunos, ainda é conhecido como Bollettieri Tennis Program. Rohan Goetzke, um australiano que já treinou o campeão de Wimbledon, Richard Krajicek, foi escolhido como diretor em 2012. Bollettieri permanece como presidente e fundador.
Goetzke afirmou que admira a força de vontade de Bollettieri, seus poderes motivacionais e a capacidade de observar detalhes, embora reconheça que a mania de autopromoção de Bollettieri não agrade todo mundo.
- A gente sempre pode encontrar alguma coisa errada, ou que não é boa o bastante. Porém, isso aqui não aparece se você for fraco e suave e não assumir certos riscos - afirmou Goetzke, antes de apontar para a academia.
A academia exige cada vez mais de seus 182 hectares de área construída. Há novos alojamentos e uma escola dentro do campus, com um novo estádio de futebol americano e uma pista olímpica de atletismo.
- Eu vejo muito dinheiro, muitas grana investida nisso aqui. Quero dizer, quando um lugar precisa de um sistema de bondes, isso significa que ele cresceu muito - afirmou Sharapova, enquanto se dirigia para o treinamento em dezembro.
Independentemente de seus problemas de transporte, esse é um local onde aspirantes a jogadores de futebol e basquete compartilham sonhos e ambições com futuras estrelas do lacrosse e do tênis, e é um local completamente internacional, com um corpo discente de mais de 900 alunos vindos de 80 países, especialmente da Ásia e da América do Sul.
Bollettieri ainda identifica jovens talentos e foi uma ajuda fundamental para Michael Mmoh, um americano de 16 anos que é aluno em tempo integral da academia e está em nono lugar no ranking juvenil da Federação Internacional de Tênis.
- Ele ainda trabalha tão duro e sempre se preocupa com os jogadores mais jovens. Ele sempre esteve lá para me ajudar e quando eu percebi que precisava de conselhos para melhorar meu jogo, ele me ajudou com os voleios e os backhands - afirmou Mmoh.
Bollettieri criou um padrão para sua academia e o resto do mundo continua a copiá-lo: da França ao Qatar, passando pelo próprio bairro.
- Acho que existem oito academias em Sarasota-Bradenton, oito! - afirmou Bollettieri.
A London's Evening Standard já o colocou em primeiro lugar na lista de pessoas que se importa mais com o tênis do que o casamento:
- Dois lugares à frente de Henrique VIII (que jogava tênis real).
Agora, ele está no momento da vida em que seu legado se torna uma obsessão, razão pela qual ele trabalha há muito tempo em sua segunda autobiografia (a primeira, "My Aces, My Faults", foi publicada em 1996). Seus colegas e amigos, que já ouvem falar desse projeto há anos sem ver resultados, fazem cara de dúvida quando o assunto aparece. Todavia, depois de muitas largadas queimadas, cópias avançadas foram impressas e Bollettieri afirmou que o livro finalmente será publicado em abril.
O legado também é a razão que o leva a se preocupar tanto com sua inclusão no Hall da Fama Internacional do Tênis, depois de ser rejeitado em 2010 e 2012.
- Muitas pessoas vieram até mim quando eu não fui aceito no passado e isso tudo apagou o fato de que eu não entrei. Desta vez, depois de escrever o livro, de conceder entrevistas e de verem o que eu tentei fazer e o que eu continuo tentando fazer, seria um grande desapontamento. Eu não sei o que mais poderia fazer: ir a cidades do interior, conceder bolsas de estudo, ajudar as pessoas a mudarem de vida - afirmou antes do anúncio dos selecionados do ano.
Com sua aceitação no dia 3 de março, parece que Bollettieri já fez tudo o que queria.