Aqui no Brasil me conhecem bem. Aliás, me respeitam tanto que várias vezes perguntam se sou o maior do país. Mais: chegam a me comparar a Boca x River, Real Madrid x Barcelona, Celtic x Rangers. Mas vou te contar um segredo: eles estão errados.
Porque não sou um encontro dos dois maiores clubes do país, ou de grifes milionárias de regiões antagônicas, ou de religiosos. Sou mais.
Sem nenhuma dessas diferenças prévias a separar meus torcedores, consegui juntá-los nas maiores façanhas que o futebol pode oferecer. Unindo minhas duas partes, acumulo 20 títulos fora do meu Estado. Saí de um cantinho do Brasil para dominar o mundo. Duas vezes.
Mas essa união só vale aqui, agora. Quando os dois se encontram, vira cada um por si. Cada dividida significa mais do que só ficar com a bola. Um gol é comemorado como um título. A vitória é um troféu.
É como se o tempo parasse, quando o juiz apita o início. Principalmente para quem está ganhando. Aliás, essa é uma curiosidade do confronto: quem está feliz, na teoria, quer mais é que acabe. E quem está triste deseja que tudo se prolongue mais. Por isso que garanto: só gosta de mim quem não me vive, não me sente. Aliás, já ouvi falar que sou bom apenas quando termina — e com vitória.
Sou numerado. Há quase 110 anos, em julho de 1909, apareci pela primeira vez. Um lado existia havia seis anos e o outro estreava. Meu número 1 acabou 10 a 0. O dois, 5 a 0. O três, 10 a 1. Só no número 7 (olha que ironia, ser logo em uma cifra tão simbólica!), o vermelho ganhou do azul. Azul, aliás, foi minha cor predominante até o 89, em 1945. Dali em diante, vermelhei, atropelado por um rolo compressor.
Mas sou equilibrado, veja bem. O vermelho tem mais vitórias. Mas o azul tem soberania em Campeonatos Brasileiros. Mas o vermelho fez mais gols. Mas o azul está há seis encontros invicto. Mas o vermelho foi o primeiro a vencer na casa rival. Mas o azul ganhou o último...
Já fui decidido aos 14 segundos de jogo e aos 14 minutos do segundo tempo da prorrogação. E nos pênaltis, em finais de Gauchão e quartas de Copa do Brasil. Lancei — e aposentei — uniformes. Inaugurei estádios — com goleada ou com briga.
Abriguei amistosos, torneios citadinos, gaúchos, brasileiros, Copa do Brasil, Seletiva e Sul-Americana. Fui disputado em Porto Alegre, Rio Grande, Pelotas, Erechim e Caxias do Sul. E até fora do Brasil (em Rivera, bem pertinho, é verdade). Dias atrás, decidi o maior campeonato de base do país e meus seguidores amarraram os cavalos no obelisco.
Faltava só um lugar, um campeonato. O mais importante, o mais charmoso. Aquele que todos sonham.
Pois nesta quinta-feira, a América toda vai me ver e ouvir. Enfim poderão sentir o que ocorre aqui no sul do Brasil naqueles 90 e poucos minutos mais tensos da semana de cada um, que todos só gostam quando acaba — e eles ganham. Serei o assunto do continente, como sempre mereci. E é apenas o começo. Em abril tem de novo, do outro lado da cidade.
Prazer, Libertadores, eu sou o Gre-Nal.