A gritaria era a mesma, o trabalho em campo reduzido foi semelhante, o objetivo de manter a bola ou recuperá-la rapidamente era idêntico. Na comparação com a comissão técnica que saiu do Inter, a maior diferença do novo grupo que comanda o time é o idioma. Saiu o "dale, dale!", entrou o "gurizada", o "goleira", o "tu". Roger Machado traz de volta o gauchês ao Beira-Rio, um trabalho já conhecido no Estado e que começa agora para tentar salvar a temporada 2024.
Essa questão regional não foi preponderante, mas ajudou. Roger está acostumado ao desafio que os clubes gaúchos estão enfrentando pós-enchentes.
— É um momento difícil do Rio Grande do Sul, e o Roger sabe as dificuldades que encontramos nos deslocamentos, nas viagens, na condição de treino — citou o presidente Alessandro Barcellos.
Primeiro treino
Em Alvorada, Roger comandou nesta quinta-feira o primeiro treino como técnico do Inter. Ao lado de seus auxiliares Adailton Bolzan e Roberto Ribas, além de Paulo Paixão, preparador físico, ele fez atividades focando na troca de passes curtos e na intensidade para a recuperação da bola.
Enérgico, o novo comandante colorado gritou, incentivou e orientou seus atletas.
Pareceu já ambientado ao time, mesmo com tantas ausências. Vitão, Fernando, Thiago Maia, Aranguiz e Enner Valencia estão lesionados. Wanderson teve desgaste muscular. Bustos também não treinou, mas não houve explicação para isso. Será preciso superar tudo para iniciar com sucesso um trabalho cujo contrato vai até dezembro de 2025. O prazo, aliás, foi sugerido pelo Inter e aceito pelo treinador.
— Todos sabem da história do Roger. Muito nos honra ele aceitar esse convite. Tivemos uma conversa muito ética pelo confronto com o Juventude. Essa escolha passou por um processo no departamento de futebol e as evidências da carreira dele pesaram. Foi uma unanimidade que ele representava a melhor alternativa. Um treinador com qualidades técnicas que farão nosso elenco se adaptar e vice-versa. É um profissional acima de tudo — completou Barcellos.
Rivalidade e amadurecimento
Roger, em suas primeiras palavras, agradeceu a oportunidade, não fugiu de perguntas sobre rivalidade, por ter feito a maior parte da carreira no Grêmio e declarou:
— É um desafio importante, do tamanho do Inter. Como profissional, penso estar à altura dessa missão. Foram 20 anos no campo, depois a academia e logo depois na casamata. Estou amadurecido por esse período todo.
Claro que há desconfiança, como ocorreria em qualquer profissional. No caso de Roger, a ligação com o rival agrava. Por isso, desde o começo da apresentação, o treinador teve de responder algumas vezes sobre esse tema. Inclusive com perguntas mais duras. E já na primeira resposta não se esquivou:
— Acolho com naturalidade esse processo. Sou do Estado, sei como é essa rivalidade. E sempre deixei no campo, tratei como adversário e não como inimigo. Entendo o torcedor, que é passional pelo clube. Eu sou apaixonado pelo jogo, entendo a torcida. Consigo administrar isso.
O novo técnico do Inter, se estava nervoso, não transpareceu. Manteve aquele tom de voz calmo, meio rouco. Quase não olhou para os dirigentes, que ficaram próximos aos repórteres no auditório do Beira-Rio.
Pelo contrário, Roger parecia tão seguro que se permitiu brincar. Ele reconheceu, entre os repórteres, um ex-atleta seu nos tempos de professor de escolinha de futebol. Marcinho Black, da Rádio Gre-Nal, identificado com o Inter, elogiou o técnico por "vestir vermelho". O treinador, então, devolveu, aos risos:
— É para te chamar de Marcinho, como nos tempos de sub-16? Ou de Black, teu nome agora?
Consciência
Cor, aliás, foi tema da entrevista. Roger é o sétimo técnico negro da história do Inter. Ele usou termos de quem é familiarizado com o assunto. Falou sobre a ancestralidade, consciência de onde chegou e da dificuldade extra por causa da pele.
A outra descontração ocorreu ao receber um pedido para "se apresentar" à torcida do Inter, que o conhece bastante como rival. Ele brincou novamente. Deu seu nome todo, falou da esposa e das filhas e completou com expressões de efeito:
— Sou apaixonado pelo jogo. Compreendo o torcedor e a necessidade de títulos, ainda mais quando há esses hiatos. Que a torcida, que sempre apoiou o Inter, continue acreditando. Queremos resgatar os melhores momentos, fazer uma equipe competitiva e que seja o rosto do torcedor. E conquiste títulos.
A estreia de Roger, se sair no BID, será às 18h30min deste sábado, no Estádio Nilton Santos, contra o Botafogo, pelo Brasileirão. No Beira-Rio, começará sua história na partida de volta do playoff da Copa Sul-Americana contra o Rosario Central, na terça-feira. Roger terá apoio da torcida. A direção lançou uma promoção na qual associados de todas as modalidades, que estiverem em dia, terão acesso gratuito às áreas livres do estádio.