O técnico Mano Menezes versão Inter 2022 vem se caracterizando por escalar os times de acordo com as circunstâncias do jogo, levando em conta os pontos fortes e fracos dos adversários. Trata-se de uma faceta já vista no Rio Grande do Sul, mas que havia sido deixada de lado em trabalhos de sucesso do treinador em Corinthians e Cruzeiro.
Há exemplos recentes. Contra o Santos, o treinador deixou Alan Patrick no banco justificando a linha ofensiva mais robusta. Diante do Goiás, escalou Alan Patrick junto a De Pena e Mauricio, com Johnny como cabeça de área, deixando no banco Liziero, alegando que o time de Jair Ventura não tinha um meia central — e mexeu nisso a partir da entrada de Marquinhos Gabriel.
Além do adversário, outros aspectos também influenciaram nas decisões. Uma das lembranças é a de que o técnico botou no banco Gabriel Mercado e Rodrigo Moledo contra o Athletico-PR por causa do piso sintético, a fim de não desgatar os zagueiros mais veteranos. A outra é em eventuais sequências: quando houve jogos em meios e finais de semana, o treinador preservou os mais desgastados, mas tentando não descaracterizar o time (veja quadro com algumas partidas emblemáticas abaixo).
Isso tem sido possível porque o Inter conseguiu fortalecer o grupo de jogadores, um dos gargalos nas temporadas anteriores. Opções como Wanderson e Pedro Henrique para as pontas, por exemplo, ou um trio do porte de Mercado, Moledo e Vitão, além de Alan Patrick, Mauricio, De Pena, Edenilson e Taison ajudaram a rodar o time, manter todos em atividade e facilitar a gestão de grupo.
O que faz atualmente não é exatamente uma novidade na carreira de Mano Menezes, mas, segundo pessoas que o acompanharam de perto em outros trabalhos, fazia um tempinho que não ocorria. O treinador, em sua primeira passagem pela elite do futebol brasileiro, ficou marcado por uma mudança em time que se mostrou decisiva. Quem lembra é o repórter Fernando Becker, da RBS TV.
Mano era técnico do Grêmio em 2006 e encontrou o Inter de Abel Braga, futuro campeão mundial, na final do Gauchão. O então treinador do Tricolor fez alteração tática nas duas partidas das finais: na primeira, colocou o lateral-direito Alessandro no meio-campo; na segunda, o adiantado foi o lateral-esquerdo Wellington. Não venceu nenhum dos jogos, mas os dois empates deram o título estadual graças ao gol marcado como visitante.
— Ele tinha um time visivelmente inferior, por isso precisava surpreender. Em ambas as partidas, confundiu o Inter e teve superioridade em determinados momentos — recorda Becker.
Depois do Grêmio, porém, em dois de seus maiores sucessos como treinador, não repetiu tanto assim essa prática. É o que atestam os repórteres Rodrigo Vessoni, setorista do Corinthians, e Samuel Venâncio, dedicado a acompanhar o Cruzeiro. Nas duas equipes, ele montava uma plataforma tática, criava uma identidade e os jogadores se adaptavam a esse sistema.
— Só mexia na equipe por necessidade, lesão ou sequência. No máximo fazia alguma troca se alguém não estava bem. Mas mudar taticamente não ocorria — lembra Vessoni, do Portal Meu Timão.
No Cruzeiro, ocorria algo semelhante:
— Ele quase nunca mudava o time. Era a mesma base e o mesmo estilo — atesta Samuel Venâncio, proprietário de um canal especializado no Cruzeiro.
O Mano versão 2022 mudou. E está caminhando para buscar o mesmo sucesso que teve em Corinthians e Cruzeiro. Com um "novo velho" estilo.
Bragantino 0x2 Inter — 5/6/2022 — 9ª rodada
4-2-3-1 - Daniel; Bustos, Vitão, Mercado e Renê; Dourado, Gabriel; Edenilson, Alan Patrick, Wanderson; David
O Inter viajou para duas partidas seguidas no interior paulista com um mistério no ataque: Alemão ou David (na época ainda bastante usado como 9). A certeza era a formação do meio-campo com Dourado, Edenilson, De Pena e Alan Patrick. Mas na hora do jogo contra o Bragantino, Mano Menezes apresentou Dourado e Gabriel juntos, com De Pena no banco e David de centroavante. Explicou:
— Foi uma escolha em relação ao histórico do adversário como mandante, que tem um início avassalador, muito forte. Precisávamos um jogador mais de contenção.
De fato, o Bragantino amassou o Inter nos primeiros minutos. Teve bola na trave, milagre de Daniel e outras chances. Os gaúchos resistiram, equilibraram o jogo na segunda etapa e, chegaram à vitória nos acréscimos, quando De Pena já havia entrado em campo.
Inter 1x0 Santos — 29ª rodada - 1º/10/2022
4-1-4-1 - Keiller; Bustos, Moledo, Vitão e Renê; Gabriel; Mauricio, Johnny, De Pena e Pedro Henrique; Alemão
Depois de ter empatado com o Bragantino em casa, o Inter precisava vencer o Santos de qualquer jeito. Mano Menezes montou um meio-campo mais leve, sem Alan Patrick, e com o retorno de Mauricio pela dupla função que pode fazer, tanto de ser meia-atacante quanto de ser extrema. O técnico escolheu Johnny e De Pena para completar o setor, tendo Gabriel como cabeça de área. A justificativa:
– Tínhamos preocupação de ter um terceiro jogador por dentro, já esperávamos Sanchez, se não tivesse um terceiro jogador teria que baixar o meia para defender. Demos a missão a Pena e Johnny a sustentar os dois homens de lado deles.
O Inter saiu na frente ainda no primeiro tempo, em uma jogada de Bustos que De Pena completou. O Santos deu apenas um chute a gol, em conclusão de fora da área.
Inter 4x2 Goiás - 31ª rodada - 9/10/2022
4-2-1-3 - Keiller; Bustos, Moledo, Vitão e Renê; Johnny e De Pena; Alan Patrick; Mauricio, Alemão e Pedro Henrique
Era preciso vencer em casa, e sem Gabriel definitivamente (a lesão no joelho deve afastá-lo por oito meses), Mano Menezes tinha o dilema de escalar alguém de contenção, como Liziero, de boa atuação contra o Flamengo ou abrir mais a equipe. Optou pela segunda alternativa: o meio teve Johnny de volante, Alan Patrick e De Pena mais adiantados. Mauricio começou aberto pela direita, Alemão como centroavante e Pedro Henrique na ponta esquerda. Comentou:
— Jogamos com dois volantes, Johnny e De Pena, que não são primeiros homens. Contra o adversário que joga bola direta, longa, sofremos. Jogo ficou um pouco solto.
O Inter esteve à frente do placar, mas duas vezes cedeu o empate. Na segunda etapa, depois de fazer o 3 a 2, Mano colocou Liziero e controlou o jogo.