O Instituto-Geral de Perícias entregou, nesta quarta-feira (8), o laudo pericial sobre o pedido de perícia de leitura labial do caso Edenilson, ocorrido na 6ª rodada do Brasileirão, na partida entre Inter e Corinthians. Na ocasião, o jogador colorado alegou ter sido chamado de "macaco" pelo lateral-direito Rafael Ramos, do time paulista. No entanto, não foi possível identificar a palavra dita pelo jogador corintiano.
Conforme o documento enviado pelo IGP, quatro vídeos foram enviados para análise, mas apenas um foi selecionado (por apresentar maior parte da cena e melhor qualidade de sinal), do qual foram extraídos 41 frames. Conforme o laudo, uma eventual tentativa de saber o que teria sido proferido por Rafael Ramos seria muito mais uma conjectura do que realmente uma evidência.
O inquérito policial, que está sob o comando da delegada Ana Luiza Caruso, responsável pela 2ª Delegacia de Polícia Civil de Porto Alegre, aguardava o laudo do IGP para ser finalizado. As primeiras provas do inquérito foram colhidas ainda na noite de 14 de abril, quando Inter e Corinthians se enfrentaram pelo Brasileirão. No Beira-Rio, o delegado plantonista Carlo Butarelli ouviu os dois jogadores e decretou a prisão em flagrante de Ramos por injúria racial. O jogador foi liberado após o Corinthians pagar uma fiança no valor de R$ 10 mil.
A defesa da Rafael Ramos, no entanto, apresentou uma outra versão do que teria dito o jogador. De acordo com o advogado Fabiano Cerveira, em entrevista ao programa "Sala de Domingo", da Rádio Gaúcha, um dia após o fato, o português fez um xingamento a Edenilson usando o termo “mano, caralho”.
No dia 21 de maio, laudo encomendado pela defesa de Rafael Ramos apontou que ele não chamou Edenilson de "macaco". A análise foi feita pelo Centro de Perícias de Curitiba, que concluiu que o lateral do Corinthians usou o palavrão "caralho". Em uma análise fonética, a perícia diz ainda que a sílaba "ma" só pode ser pronunciada a partir da junção dos lábios, o que, segundo o documento, não ocorreu no caso.
Justiça Desportiva
O Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) começou na última semana as oitivas do caso. O português Rafael Ramos foi ouvido na segunda (30/5) e Edenilson na segunda passada (6/6). As partes têm até o dia 20 para juntar todas as provas desejadas. Após isso, o STJD irá encomendar uma perícia própria, que será a válida no processo.
Será após essa fase que o auditor Paulo Feuz irá decidir se oferecerá a denúncia contra Rafael Ramos e Corinthians. Esse processo na esfera desportiva é independente do que ocorre na justiça criminal. O inquérito deve ser encerrado até o fim deste mês.
Se a denúncia for encaminhada, tanto Ramos quanto o Corinthians podem ser punidos pelo Tribunal. Conforme o artigo 243-G do Código Brasileiro de Justiça Desportiva (CBJD), "praticar ato discriminatório, desdenhoso ou ultrajante, relacionado a preconceito em razão de origem étnica, raça, sexo, cor, idade, condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência" pode ter como pena a suspensão de cinco a 10 partidas, se praticada por atleta, além de multa de R$ 100 a R$ 100 mil.
Caso a infração seja considerada de extrema gravidade, o órgão judicante, no caso o STJD, poderá aplicar penas dos incisos V, VII e XI do art. 170, que preveem punições como advertência (a mais leve) até exclusão de campeonato ou torneio (a mais grave).
Confira a nota divulgada pelo IGP
"O Instituto-Geral de Perícias remeteu hoje à 2a Delegacia de Polícia de Porto Alegre o Laudo Pericial sobre o pedido de perícia de leitura labial acerca dos fatos ocorridos em jogo no Estádio Beira Rio em 14 de maio.
Quatro vídeos foram enviados para análise. Um deles foi selecionado, por apresentar maior extensão da cena questionada e melhor qualidade de sinal. As imagens foram tratadas com softwares de melhoramento e apresentaram qualidade suficiente para análise. Da cena questionada, foram extraídos 41 frames.
Não sendo possível identificar os movimentos realizados na porção interna da cavidade oral do jogador de camiseta branca, é tecnicamente inviável localizar todos os vestígios que definem a sequência de consoantes e vogais emitidas. A maior parte dos gestos que compõem a fala ocorrem justamente no ambiente intraoral ou em outras porções internas, como a faringe e a laringe. Nem em vídeos com excelente qualidade de imagem é possível obter as informações do que se passa na parte não visível do aparelho fonador.
Sobre o pedido de exame pericial de leitura labial, ressalta-se que não foi encontrada metodologia científica, aplicada à análise forense de vídeos, que sustente esse tipo de trabalho. Existem apenas publicações sobre percepção visual da fala e aprendizagem de leitura labial. Além disso, o registro enviado não possui o som das falas que interessavam à investigação, tornando impossível a perícia de áudio.
Por essas razões, é impróprio que a perícia criminal oficial do Estado afirme, com responsabilidade do ponto de vista processual e científico, o que foi proferido pelo jogador na cena questionada. O Laudo afirma que “sem que haja o respectivo sinal sonoro para realização de adequada análise percepto-auditiva e acústica, é conceitualmente inviável a definição confiável e inequívoca da pauta sonora proferida por um indivíduo a partir, exclusivamente, das informações relativas aos gestos articulatórios componentes que sejam exteriormente visíveis (como os de lábios e mandíbula)”. O documento afirma ainda que “resultados advindos da tentativa de mapeamento do que teria sido enunciado por um locutor questionado em uma imagem sem o áudio de fala associado (e consequente sinal acústico) seriam meramente exploratórios, representando muito mais conjecturas em torno de possibilidades anatomofuncionais do que evidências materiais per se”."