Há um local de culto no Beira-Rio. Uma espécie de altar informal. Uma religiosidade no ar. Tudo dedicado ao jogador que terá a sua história contada por gerações e gerações de colorados. A estátua de Fernandão, inspirada no momento em que o capitão ergueu a taça em Yokohama, é o símbolo de um Inter vencedor. Um Inter que talvez jamais imaginasse décadas atrás chegar ao ponto mais alto do futebol mundial. Inaugurada no dia do oitavo aniversário da conquista do Mundial de Clubes, o monumento a Fernandão levou milhares de colorados ao Beira-Rio naquela tarde de 17 de dezembro de 2014, que começou chuvosa, e que terminou com um arco-íris no céu.
Hoje, o boulevard onde a estátua com a camisa 9 às costas mora, é símbolo da fé colorada. Não é raro observar torcedores em frente ao Fernandão de bronze com os olhos cerrados, conversando com o capitão. Orações são feitas ali, agradecimentos e pedidos, em dias de jogos mais complicados.
— Dia destes, uma moça deixou um anel ali (em frente à estátua) porque havia feito uma promessa. Houve uma época, quando o Inter não estava bem, que eu via as pessoas rezando ajoelhadas. É uma coisa que até assusta. Acho que os torcedores pensam que se trata de um lugar que alguém pode escutá-los — comenta a viúva Fernanda Biazzotto Costa.
Na próxima sexta-feira (7) completam cinco anos da morte do ídolo colorado. E GaúchaZH prepara um material especial em homenagem ao centroavante. Nesta quinta-feira, a história da maquiadora Cássia Machado Rossi, 37 anos, será a primeira a ser contada.
Ela é uma devota de Fernandão. Nascida em família colorada, Cássia pertencia a uma geração sem um grande ídolo, sem uma grande referência. Isto, ao menos, até o dia 10 de julho de 2004, quando Fernandão estreou, saindo do banco de reservas no Beira-Rio para fazer de cabeça o segundo gol do Inter, no 2 a 0 diante do Grêmio, o gol que entrou para a história como o Gol Mil dos Gre-Nais.
— Naquele momento senti que era o Fernandão quem resgataria a nossa alegria. Tive uma sensação diferente naquele momento — conta Cássia.
Desde aquele clássico até a tragédia de Aruanã, Cássia colecionou mais de dois mil recortes de jornais e de revista sobre o ídolo. Onde havia matéria ou foto sobre Fernandão, lá estava a colorada de tesoura em punho. A cada pasta cheia, Cássia se dirigia ao Beira-Rio para que Fernandão autografasse o material.
— Ele brincava e me dizia: "Oh, quando eu não lembrar algo sobre a minha carreira vou te procurar. Você tem até matérias das minhas lesões". Cheguei a comprar jornais antigos para guardar material que eu não tinha sobre o Fernandão — conta Cássia.
O ritual das assinaturas nas pastas de recortes foi feito pela última vez em novembro de 2012. Fernandão havia passado de diretor executivo do Inter a treinador, após a demissão de Dorival Júnior. Pressionado pelos recentes maus resultados, em um vestiário que passava por crise naquele momento, Fernandão prometeu uma camisa a Cássia. Dias depois, o treinador foi demitido.
— Nunca mais o vi. Depois, em 2014, meu marido e meus filhos não queriam me contar que Fernandão havia morrido. Quando soube, desabei. Sofri tanto com a morte dele, quanto quando minha mãe faleceu — diz Cássia. — O curioso é que, na madrugada do acidente, sonhei com Fernandão. Estava no Beira-Rio para pegar um autógrafo, ele passava por mim e me ignorava. Parece que estava se despedindo, que não estava mais aqui — emenda ela, emocionada.
Ele foi cedo demais, mas sei que está olhando por nós
CÁSSIA MACHADO ROSSI
Fã de Fernandão
Cássia faz parte deste rol de colorados que ora por Fernandão, em frente à estátua:
— Pelo menos uma vez por mês eu vou até o Beira-Rio, apenas para conversar com ele. Nem precisa ser em dia de jogo. Me enrolo na bandeira do Inter, com o rosto dele, com a camisa 9, e vou até lá. Faço uma oração para ele. No ano do rebaixamento, cheguei a xingá-lo, perguntando por que ele não havia ajudado o Inter a permanece na Série A.
Agora, no aniversário de cinco anos da morte do ídolo, Cássia pretende transformar os seus tesouros em uma espécie de altar em casa.
— Tenho muito material guardado. E pretendo prestar mais esta homenagem ao Fernandão. Ele foi cedo demais, mas sei que está olhando por nós — finaliza a fã.