Quando o Inter completou 109 anos, no último 4 de abril, D'Alessandro foi designado pela assessoria de imprensa do clube para a entrevista coletiva. Era o capitão do time, figura mais representativa do atual grupo de jogadores, a cara da instituição. Naquela tarde de outono, dias antes da reestreia colorada na Série A, o argentino alertou o torcedor para que não criasse expectativas em relação à campanha da equipe no Brasileirão.
Disse o 10:
– Somos conscientes de que a história do clube está em outro momento. O torcedor tem de entender isso. Que o Inter não é o Inter dos últimos anos, que mandava nos jogos. Não é se apequenar. É reconhecer quem está hoje num patamar acima no Brasileiro, por qualidade, elenco, patrocínio, poder econômico. O Inter já esteve nesse patamar, e o nosso objetivo é voltar a ter um trabalho muito bom para colocar o Inter de volta lá em cima e brigando por coisas importantes.
Após um começo difícil, o time cresceu na competição e até chegou à liderança do Brasileirão. O Inter estava onde nem mesmo os jogadores acreditavam que estariam antes do começo do campeonato. Mas algo se perdeu na reta final da temporada. Em um momento decisivo do ano, foi derrotado por Botafogo e Atlético-MG na sequência, queimou a gordura na tabela e agora já corre risco de ficar sem a vaga direta na Libertadores.
D'Alessandro tinha razão ao comentar, em abril, que o Palmeiras contava com muito mais alternativas. Se há carências no Beira-Rio, o Inter teve a vantagem do descanso e da recuperação física. Em 2018, o time de Odair Hellmann disputou 55 jogos. A equipe de Felipão teve 72 partidas. O Flamengo jogou 65 vezes. Isso significa que os colorados tiveram uma vantagem de pelo menos dois meses de repouso se comparado ao calendário do Palmeiras. São 17 jogos a menos na comparação com os paulistas.
Odair recebeu merecidos elogios pela campanha pós-Série B. Será eleito o treinador revelação da temporada, em seu primeiro ano como técnico profissional e efetivado em clube grande. Ao montar um time competitivo, surpreendeu o país, mas o Inter parece ter atingido o seu teto. E pouco ainda pode ser extraído.
Odair manteve as suas convicções, mesmo com o Inter perdendo força no returno. Jogadores como Iago e Patrick caíram de desempenho. William Pottker, jogador-chave no primeiro turno, se lesionou e, recuperado, não teve mais chances. A titularidade de D'Alessandro se impôs – e ele não saiu mais do time.
Ao contrário de Pottker, Patrick e Iago têm cadeira cativa na equipe. Odair manteve a formatação, mesmo com um sistema de jogo que desde a vitória no Gre-Nal já parecia manjado pelos adversários. Aliado a isso, não tinha plano B quando Rodrigo Dourado e Edenilson eram desfalque. Cada vez que um dos dois estava fora, a reposição com Gabriel Dias ou Charles foi desastrosa. Jogos contra Chapecoense, Vitória, Sport, São Paulo, Atlético-PR, Botafogo e Atlético-MG exigiram esforço extra, depois de um primeiro tempo ruim e de sair atrás no placar. Mas também houve confrontos em que o Inter largou na frente e não conseguiu administrar a vantagem, como nos empates com Corinthians, Santos e Vasco.
– Inter e São Paulo foram acometidos pelo "Mal da Liderança". Times que aproveitaram o mole dado por Palmeiras e Flamengo, as duas equipes em condições de mandar no Brasileirão, e acabaram em primeiro lugar. Mas, com elencos fracos e sem reposições, não conseguiram se manter – entende o comentarista dos canais SporTV Sérgio Xavier Filho.
Para Xavier, há um ponto essencial para a má campanha do Inter no returno: a titularidade de D'Alessandro:
– Ele é um superídolo, mas é uma âncora para o time. Permite que o Inter tenha bons momentos, mas, ao final, desequilibra a equipe. Fez um jogo espetacular contra o São Paulo, foi até volante, mas, na idade que tem (37 anos), é impossível manter essa intensidade. Além disso, ele impede que outras lideranças se criem. Nenhuma liderança aflorou sem o argentino em campo. Nico López era a liderança técnica do time. Ficou tímido com o retorno de D'Alessandro ao time e não repetiu mais as grandes atuações.
Após a primeira derrota do Brasileirão no Beira-Rio, Odair repetiu o discurso de que o Inter só está no topo graças ao empenho dos jogadores. Já o vice de futebol, Roberto Melo, avalia a temporada como positiva:
– Por tudo o que fizemos no campeonato, nosso objetivo era conquistar o título, e chegamos até a 36ª rodada com possibilidade. Não alcançá-lo é uma chateação, porque chegamos perto e deixamos escapar. Mas o sentimento é de ter feito uma grande campanha quando ninguém imaginava. A maioria das pessoas falava que tínhamos que nos preocupar em fazer os 45 pontos, nos livrarmos do rebaixamento. Quando fizemos os 45 pontos, ninguém lembrou. Estamos com 20 a mais. Olhando o campeonato como um todo, resgatamos a confiança do torcedor. Temos mais dois jogos para terminar o ano e manter essa confiança para ano que vem entrar mais forte, qualificar a equipe e começar no ano brigando por título.
Além de tropeçar nas próprias pernas para conseguir a vaga direta à fase de grupos da Libertadores, o Inter já sofreu um prejuízo imediato com a queda para a terceira colocação: premiação. A verba, que seria de R$ 11,3 milhões pelo vice-campeonato, vira agora R$ 7,7 milhões. E cairá mais, caso o Inter perca também o terceiro lugar.
Restam duas rodadas para fim do ano. O Inter precisa de pelo menos quatro pontos, contra Fluminense e o rebaixado Paraná, para garantir vaga na fase de grupos da Libertadores. Depois da primeira derrota do ano em casa no Brasileirão, porém, fica a dúvida de que Inter irá a campo no domingo diante dos cariocas. Ou volta ao patamar de time que se impõe e que ganha campeonatos, ou em 2019 as desculpas e justificativa ganharão novas versões.
Acertos
– Odair Hellmann montou um time desacreditado (até mesmo internamente), chegou a conduzi-lo à liderança do Brasileirão e à Libertadores.
– O modelo de jogo que levou o time a liderar o campeonato tinha enérgica marcação, desde o setor ofensivo, com William Pottker atuando de área à área.
– Patrick foi um dos mais eficientes jogadores de meio-campo no primeiro turno do Brasileirão.
– Além de Patrick, Rodrigo Dourado e Edenilson também tornaram-se peças-chave do time.
– O técnico recuperou Nico López.
– Com a chegada de Rodrigo Moledo, o sistema defensivo virou ponto forte da equipe.
– O goleiro Marcelo Lomba é um dos grandes nomes do clube no ano.
Erros
– Em má fase, Iago e Patrick jamais tiveram a titularidade ameaçada. Odair não fez menção de mudar a equipe.
– Pottker, recuperado de lesão muscular, foi esquecido no banco de reservas.
– Ainda que não consiga entregar ao time a mesma energia durante os 90 minutos, D'Alessandro passou a titular todos os jogos _ quando o Inter cresceu no Brasileirão, o camisa 10 ingressava no segundo tempo a fim de ajudar o time a manter o controle das partidas.
– Há falta de reposições de qualidade no grupo. Mesmo jogadores de maior grife, como Zeca e Wellington Silva, não conseguiram manter alto nível de atuações e acabaram no banco. Rodrigo Dourado e Edenilson, jogadores fundamentais para o time, não têm reservas em condições de manter sequer atuação próxima à dos titulares.
– Em 2018, o Inter jogou menos do que os principais rivais, e não fez disso um diferencial a seu favor.
Os "azares"
– Zeca foi a grande contratação do primeiro semestre no Brasil. Mas seu desempenho despencou no pós-Copa. Perdeu a posição para o brigador Fabiano.
– Paolo Guerrero, buscado para ser a "cereja do bolo" em um time que brigava pelo título, segue suspenso e treinando no Peru.
– O volante Rithely ainda não tem previsão de estreia.
– Damião e Pottker perderam muito tempo lesionados.