Nathaniel Luis Camargo dos Santos, 26 anos, viu o Humaitá ressurgir aos olhos de Porto Alegre por conta da Arena. Morador do bairro desde 2012, ano da inauguração, lembra de andar de bicicleta perto das obras. Agora, 12 anos depois, vive a expectativa de uma nova inauguração do estádio: a da pós-enchente. Neste domingo, às 11h, a Arena volta a receber torcedores depois de 134 dias — último jogo foi em 20 de abril, Grêmio 1x0 Cuiabá.
A partida contra o Atlético-MG, pela 25ª rodada do Brasileirão, marca o retorno do Tricolor à sua casa, invadida pelas águas do Guaíba, em maio. Devido a restrições no fornecimento de energia e reformas internas, a operação ainda será reduzida, com pouco mais de 12 mil pessoas e apenas o anel inferior aberto.
Nathaniel, assim como o Grêmio, precisou abandonar o lar na maior tragédia climática do RS. A casa onde o atendente de loja morava, na Rua Frederico Mentz, foi inundada e os móveis, perdidos. Hoje ele vive no Rubem Berta, com a namorada.
— Metade das pessoas que saíram daqui ainda não voltaram. Muitas ainda estão reformando as casas. Algumas vão voltar depois, e outras estão arrumando para vender e se mudar para outro lugar — afirma Nathaniel, que também possui familiares residindo no Humaitá.
No período em que viveu diariamente no bairro, Nathaniel teve na Arena um espaço para fortalecer a paixão pelo clube. Foi ali que viu, em dezembro de 2016, a final da Copa do Brasil, quando o time de Renato Portaluppi pôs fim ao jejum de 15 anos de títulos nacionais.
Para entrar, precisou trocar uma camisa do Grêmio autografada por um ingresso que um conhecido da mãe havia conseguido. O preço elevado e alta disputa havia lhe tirado as esperançar de assistir ao jogo in loco.
O gremista, que trabalha como atendente em uma loja de departamentos, espera que, mesmo aos poucos, a Arena devolva ao Humaitá a agitação que trouxe nos primeiros anos de existência.
— A Arena trouxe um brilho diferente para o Humaitá. Trouxe alegria. As pessoas passaram a emprego praticamente em casa, já que muitos passaram a trabalhar em função dos jogos. Antes, não tinha essa quantidade de bares que tem hoje. Eu mesmo já vendi bebida do lado de fora do estádio. Liberaram 12 mil pessoas para o jogo, mas estamos esperando muita movimentação do lado de fora. O churrasco de sempre não vai faltar — acrescenta, que, mesmo sem ingresso para a partida, pretende se juntar à festa do lado de fora.
Isso aqui, sem futebol, não é nada.
EDERALDO CAPALONGA
Responsável por um dos bares da Avenida Padre Leopoldo Brentano, no bairro Humaitá.
Impacto nas quatro linhas
Nathaniel prefere aguardar as próximas rodadas para analisar o impacto que a volta da Arena terá na campanha do Grêmio no Brasileirão.
— O Inter voltou a jogar no Beira-Rio antes, mas, dentro de campo, não mudou muito. Acho que o futuro do Grêmio ainda está em aberto — opina.
Já o comerciante Max da Silva, 47 anos, dono de uma lancheria perto do estádio e gremista, pensa diferente. Para ele, o retorno do Grêmio à Arena fará bem não só ao bairro, mas ao time dentro de campo.
— Noventa por cento da força do Grêmio está na Arena. Claro que o time está devendo também, mas bastante da culpa do mau resultado é a distância da Arena — garante.
A Arena trouxe um brilho diferente para o Humaitá. Trouxe alegria.
NATHANIEL LUIS CAMARGO DOS SANTOS
Gremista e morador do entorno da Arena
Comércio
Na tarde da última quinta-feira (28), Max varria a frente do estabelecimento e se preparava para a retomada definitiva. Nos dias de jogos, a cerveja puxa as vendas.
— Esse período sem jogos foi terrível. A gente é brasileiro, tive uns meses de carência no aluguel do prédio, peguei ajuda do governo. A gente dá o jeito que pode. No próximo domingo, às 7h, já vou estar aqui — comenta.
Os últimos dias foram uma ansiosa espera para os donos e trabalhadores dos bares das redondezas. É chegada a hora de começar a recuperar o prejuízo dos meses sem jogos que levaram embora a maior parte dos clientes.
— Isso aqui, sem futebol, não é nada. Até então, abrimos as portas para atender os poucos clientes que moram no bairro e as pessoas que estão trabalhando nas reformas das casas — conta Ederaldo Capalonga, 60 anos, responsável por um dos bares na Avenida Padre Leopoldo Brentano.
O estoque do bar de Capalonga já está cheio. São pilhas de engradados de cerveja à espera dos torcedores. Em dias de jogos grandes, ele conta que vende até 40 caixas por dia.
Os números relatados à Zero Hora pelos comerciantes variam, mas apontam para a importância que a reabertura terá para a economia do Humaitá. Há quem diga que vende até 300 caixas de cerveja em noites de Libertadores e de 500 a 1 mil sacos de gelo em dias quentes, não só nos estabelecimentos, mas utilizando também a mão de obra dos ambulantes.
Outro negócio informal que voltará a render nos próximos meses é de estacionamentos. Moradores contam que, ao disponibilizar um terreno para carros da torcida, o lucro pode chegar à R$ 1.500 em uma tarde ou noite.
Nos últimos meses, os gremistas mostraram que estão com o Grêmio onde o Grêmio estiver, como manda o hino tricolor. Contudo, se "onde o Grêmio estiver" for a Arena, o Humaitá agradece.