O termômetro no canto superior direito da TVCom marcava 37ºC por volta das 16h de 3 fevereiro de 2010, uma quarta-feira, dia de rodada do Gauchão e uma sensação térmica próxima dos 44ºC em Porto Alegre. Na transmissão do pré-jogo ao vivo do Estádio Olímpico, o narrador Gustavo Manhago e Batista conversavam sobre a época em que o comentarista fora técnico do São Luiz, adversário do Grêmio naquela tarde, a partir das 17h. Instantes depois, quando Manhago trazia mais detalhes da partida que viria a acontecer, Batista teve uma queda de pressão, desmaiou e caiu no chão da cabine.
Tudo foi muito rápido. Logo em seguida as pessoas que estavam envolvidas na transmissão pararam tudo para auxiliar Batista, que em poucos segundos retomou a consciência. Ele se sentou, tirou a camisa e, diante de um ventilador, passou a se hidratar. A equipe médica que estava na ambulância, no gramado do Olímpico, subiu para a cabine e prestou o atendimento ao comentarista, que na sequência retomou seu espaço de opinião sobre o jogo.
Ele explica que em 30 segundos estava recuperado e não se importa com o fato de virado motivo de piada, porém afirma que suas filhas ainda sofrem com o episódio.
— Foi uma coisa repentina. Saí de casa atrasado, depois tive que atravessar o pátio do Olímpico com uma mochila nas costas e subi as escadas correndo. Na cabine não tinha ar-condicionado, com telhas de zinco que aqueciam muito. Entramos no ar e aconteceu o apagão. Quando acordei, só tentei lembrar o que eu estava fazendo no chão, mas não sou de me assustar fácil e segui a transmissão. As minhas filhas que até hoje não gostam de ver, a cena no vídeo é feia mesmo — explica Batista.
Em campo, Grêmio e São Luiz fizeram um jogo de baixa intensidade, com os visitantes saindo na frente e os tricolores buscando o 1 a 1. O tropeço em casa teve como justificativa por vários jogadores as condições climáticas. Nas arquibancadas, eram cinco mil gremistas — muitos deles sem camisa e acompanhando o jogo na sombra.
Alerta
O fato, que completou 14 anos na semana passada, serviu de alerta sobre os prejuízos para a realização de eventos com altas temperaturas. Além disso, o que mais chamou a atenção foi uma determinação (que já não existe mais) para não realização de partidas quando os termômetros marcassem mais de 35ºC — resultado de uma ação movida pelo Sindicato de Atletas contra a FGF.
— Era um calor fora do comum, como aparentemente está acontecendo de novo. Nas cabines do Olímpico não tinha ar-condicionado. Então a gente convivia com o calor. Na TV, ainda tínhamos luminárias quentes, que tornavam o ambiente ainda mais quente. Naquela entrada, eu realmente não percebi que ele estava passando mal. Quando houve o desmaio, tomei um baita susto e pensei no pior, em algo mais grave. Então quando ele caiu, me abaixei para ajudar. Depois chegaram os médicos e fizeram o atendimento — recorda o narrador Gustavo Manhago.
— Era muito quente, como está agora. Foi um dia muito difícil, bem complicado para jogar futebol e para os torcedores. Já no aquecimento estava horrível, principalmente dentro do vestiário. Lembro muito bem que saímos do jogo e o corpo não esfriava, mesmo após o banho era insuportável. Tanto que, depois daquele jogo, adotaram a questão do termômetro — lembra Xaro, lateral-esquerdo do São Luiz naquele jogo.
Consequências
De lá para cá, a escolha por horários mais adequados para a realização dos jogos não ganhou força. O que avançou foram as estruturas dos estádios, como é o caso da Arena do Grêmio, cuja cabine é climatizada, e os equipamentos de transmissão de TV não esquentam tanto quanto antes. Para os atletas, há evolução na nutrição com alternativas no processo de reposição de líquidos e sais.
— A perda é muito alta. Nestes casos, o setor de nutrição participa ativamente do processo oferecendo aos atletas água de coco, orientando a hidratação sem esperar a sede, já durante a semana da partida, tornando uma rotina. E no aquecimento não há aquele desafio de deixar o jogador com a temperatura corporal necessária para jogar, então apostamos muito no alongamento, em troca de passes, tentando evitar que o jogador tenha perdas calóricas — explica Paulo Paixão, atualmente preparador físico do Juventude e, em 2010, responsável pela coordenação física do Grêmio.
Neste sábado (10), às 16h30min, Grêmio e São Luiz voltam a se encontrar pelo Gauchão. Justamente em um final de semana que está prevista a quebra de recorde anual de temperatura. A máxima prevista para o momento do jogo é de 36ºC. Será um momento de atenção redobrada para garantir a segurança e o bem-estar de todos os envolvidos.