O Grêmio foi buscar na Europa um velho conhecido do torcedor, mas que volta ao Brasil bem diferente daquele jogador que despontou ainda nos tempos do Olímpico. Lucas Leiva, 35 anos, será reforço do clube até 2023 e terá mais uma vez a oportunidade de ajudar a equipe a conquistar o acesso da Série B para a Primeira Divisão.
Uma missão, aliás, que se repete 17 anos depois, e na qual o volante foi um dos personagens da Batalha dos Aflitos, jogo que garantiu em 2005 o retorno do clube à elite do futebol brasileiro. Desde a saída para o Liverpool, há 15 anos, Lucas Leiva se reinventou para se adaptar no mais alto nível de competição. De quase um meia-armador, retorna agora ao clube que o projetou como um dos principais ladrões de bola de todo o continente europeu.
A qualidade técnica o levou para a Europa, mas foi o profissionalismo que o fez voltar a Porto Alegre na condição de ídolo do torcedor do Liverpool e elogiado pelos italianos depois de cinco temporadas na Lazio. O jovem que se aventurou na Premier League era um jogador agressivo e habilidoso, que buscava o ataque sempre que tinha a bola nos pés, mas que também era capaz de executar as funções defensivas. Mas entre proteger o próprio gol ou partir em direção ao do adversário, preferia a segunda opção. Por isso, Lucas teve que passar por uma transformação na Inglaterra.
Ao chegar em Liverpool, dentro do esquema do técnico Rafa Benítez, a função do meio-campista "box to box", capaz de atuar de área a área, era de Steven Gerrard, um dos maiores ídolos da história recente do clube e protagonista da seleção inglesa. Sobrou a disputa pela vaga com tarefas mais defensivas. Na chegada, em 2007, brigava com Mascherano e Xabi Alonso.
Superada a timidez nos primeiros meses, terminou a temporada de 2007/2008 em alta. Garantiu o nome na história do clube ao ser o primeiro brasileiro a marcar um gol. Foi contra o Havant & Waterlooville, pela FA Cup, em um chute de fora da área.
O início de 2008 foi atrapalhado pela participação com a seleção olímpica. Apesar da temporada de bons resultados para o clube, Lucas teve dificuldades em ser titular. Seguiu como opção prioritária para a ausência de um dos outros jogadores do meio. A venda de Xabi Alonso para o Real Madrid em 2009 colocou o volante em evidência. Terminou a temporada como um dos que mais atuaram.
O ano de 2010 foi a virada de chave definitiva para o atleta nascido em Dourados (MS). A saída de Mascherano para o Barcelona abriu de vez o caminho para o protagonismo da equipe. O brasileiro teve o maior número de desarmes no ano na Premier League, com 172 em 33 jogos, e também foi eleito como o melhor jogador do clube pelos torcedores em 2011.
Assinou, então, uma renovação de contrato por mais quatro anos. Em seu melhor momento, veio o baque de uma sequência de graves lesões. Em dezembro de 2011, rompeu o ligamento cruzado anterior do joelho esquerdo. Ao retornar aos gramados em agosto de 2012, um novo problema físico: lesão muscular na coxa e mais três meses de ausências. A rotina de problemas físicos, e o alto nível da competição por um lugar na equipe, acabaram prejudicando a sequência que se projetava.
A troca de técnicos e o recuo de Gerrard para volante foram alguns dos motivos citados pela perda de espaço de Lucas Leiva. Com a chegada de Jürgen Klopp, em 2015, o brasileiro seguiu como opção de grupo. Por conta da solidez defensiva, chegou a ser utilizado como zagueiro pelo alemão. Mas sem espaço entre as primeiras alternativas, foi liberado para buscar outro clube em 2017.
O Grêmio até surgiu como interessado, mas a opção foi seguir na Europa. Antes do acerto com a Lazio, recebeu uma série de homenagens de jogadores, comissão técnica, direção e imprensa pela passagem por Liverpool. Em 10 temporadas na Inglaterra, partiu para a Itália como o segundo jogador com o maior número de desarmes nos 30 anos desde a criação da Premier League.
Lucas Leiva repetiu boa parte do roteiro na Lazio. Virou líder, referência para o torcedor e sinônimo de profissionalismo. Repetiu os bons índices de desarmes, mesmo em um clube de menor investimento em relação aos principais adversários.
Foi o terceiro maior ladrão de bolas em 2017, segundo em 2018 e terminou entre os 20 melhores no fundamento até este ano. Dividia minutos com outros volantes, mas deixou o histórico de lesões no passado. Conseguiu atuar com regularidade nos últimos cinco anos e deixou boa impressão na Itália.
— De maneira geral, é um jogador extremamente respeitado. Não deixou a Lazio com a mesma moral gigante que teve no Liverpool, mas não é tão distante. Muito elogiado pela entrega e o profissionalismo. Ele não jogava todos os minutos, mas é um jogador que conquistou o respeito da torcida. Quando você deixa um clube com este nível de respeito, é consequência de seu profissionalismo — comentou Gian Oddi, jornalista do grupo Disney.
Entre as opções para dar prosseguimento aos últimos anos da carreira, o Grêmio se apresentou novamente como alternativa. Após uma longa negociação, clube e jogadores se acertaram para o retorno do volante como reforço para a Série B. O volante assinará contrato até o final de 2023, com um gatilho de reajuste salarial em caso de retorno para a primeira divisão.
O Grêmio preparou uma série de atrações para o retorno de Lucas Leiva ao clube. O anúncio oficial será nesta segunda-feira (27), após a finalização dos exames médicos e a assinatura do contrato. O clube e o jogador também preparam uma "apresentação especial" para o torcedor. No intervalo da partida contra o Londrina, na noite de terça-feira (28), ele entrará em campo e realizará uma série de ações com a torcida que estiver presente no estádio.
Ainda não aconteceu uma conversa entre Lucas Leiva e Roger Machado sobre como o volante será encaixado na equipe titular. Mas o técnico já citou que essa adaptação não será problema. Ele enxerga que o meio-campista está apto a contribuir em qualquer uma das funções do time.
— Lucas é um jogador de 15 anos de Europa. Quando me perguntaram dele, disse que um jogador com o nível dele precisamos ter no grupo por vários motivos. Ele vai contribuir de todas as formas. O treinador tem o dever de achar um lugar para um jogador deste nível atuar. Ele pode jogar como primeiro volante, com o Bitello ou com o Villasanti. Pode jogar como segundo volante. Um jogador que emprestará toda sua experiência e sua capacidade — explicou Roger Machado.
O jogador e seus familiares vieram em definitivo para Porto Alegre apenas na última quinta-feira (23). Depois de tantos anos na Europa, Lucas Leiva volta para sua casa para recolocar o Grêmio novamente na Série A.