A classificação do Grêmio para a final da Copa do Brasil passou por um complexo trabalho da comissão técnica e da direção nos bastidores. Prevendo um São Paulo com mais qualidade ofensiva, o técnico Renato Portaluppi treinou na véspera do jogo uma nova tática, mais defensiva e pragmática. Já o presidente Romildo Bolzan Júnior agiu no extracampo e inspirou-se em estratégias dos anos 1990 para aumentar o clima de decisão.
Tanto Renato como Romildo ficaram preocupados com a apatia da equipe na eliminação nas quartas de final da Copa Libertadores para o Santos, com uma goleada acachapante de 4 a 1.
No dia seguinte à derrota da Vila Belmiro, o treinador e o dirigente iniciaram uma verdadeira operação visando à semifinal da Copa do Brasil, que consistia em três tarefas: uma mudança na estratégia de jogo, a remobilização do grupo e a criação de um clima de decisão "à moda anos 1990".
A reportagem de GZH conta como o clube agiu nos bastidores para garantir a classificação para a final da Copa do Brasil.
1) Mudança na estratégia de jogo
Contra o Santos, o Grêmio tentou jogar de forma ofensiva e acabou tomando um banho de bola. Com a vantagem de 1 a 0 no jogo de ida da semifinal contra o São Paulo, Renato Portaluppi decidiu preparar a equipe para competir e "jogar com o regulamento embaixo do braço".
No treino da manhã de terça (29) no CT Luiz Carvalho, o treinador trabalhou três formações. A primeira, com Alisson na ponta direita, acabou sendo utilizada no início do jogo. A segunda, com Thaciano naquele setor, foi adotada no segundo tempo. Em ambas, o técnico pediu que os jogadores atuassem de forma compacta para reduzir os espaços do São Paulo. Entre os zagueiros Rodrigues e Kannemann e o atacante Diego Souza, o espaço não poderia ser maior que 40 metros.
Na parte final do treino, Renato, trabalhou uma terceira ideia, um esquema com os três zagueiros Paulo Miranda, Rodrigues e Kannemann. Afinal, os estudos da comissão técnica mostraram que o São Paulo, caso não conseguisse marcar até os 30 minutos do segundo tempo, passaria a abusar das bolas alçadas na área. Por isso, a ideia era preencher a defesa com com bons cabeceadores e, se necessário, jogar feio para não sofrer o gol.
— Nós analisamos a equipe do São Paulo e fizemos alguns treinamentos especiais. O que tínhamos que fazer era anular as jogadas fortes do São Paulo, principalmente com o Daniel Alves. No primeiro tempo, as melhores oportunidades foram do Grêmio. No segundo tempo, da metade em diante, sabíamos que eles começariam a alçar a bola na área. Então, nós jogamos com o regulamento debaixo do braço na hora certa, no final do jogo. Nós treinamos isso, com três zagueiros cabeceadores, e soubemos sofrer o jogo. O nosso grupo está preparado para jogar com o regulamento ou sem o regulamento — explicou Renato.
2) Remobilização do grupo
Após a derrota para o Santos, o abatimento do grupo chamou atenção de Renato e Romildo. Por isso, uma das grandes prioridades antes das decisões contra o São Paulo foi motivar novamente os atletas, através de ações simples e também outras mais elaboradas.
Renato aumentou a quantidade de conversas reservadas e em grupo com os atletas e ponderou sobre a necessidade de o elenco se remobilizar. A partir daí, os próprios jogadores organizaram confraternizações entre eles, com a participação dos familiares, para aumentar o sentimento de união antes da semifinal.
No dia do jogo decisivo em São Paulo, o Grêmio viabilizou que a delegação recebesse algumas visitas que tradicionalmente deixam o ambiente dos jogadores mais leve. A principal delas é a do humorista gaúcho Paulinho Mixaria, que fez uma apresentação para o grupo na concentração, deixando o clima descontraído.
Além disso, houve a visita de um pastor evangélico, amigo de vários jogadores. Mesmo lesionado e vetado da partida, o zagueiro Pedro Geromel, um dos líderes do elenco, pediu para participar da concentração para ajudar na mobilização. A avaliação interna é que este conjunto de medidas aumentou a autoestima dos atletas.
— Após a desclassificação para o Santos, buscamos rapidamente a recomposição dos ambientes. Como se faz isso? Se confraterniza, se desanuvia, se cria um ambiente de recuperação da autoestima, se busca as famílias e se busca conversar e fazer autocrítica. Especialmente, se busca a convivência e a solidariedade dentro do grupo. Tudo isso foi feito — detalha Romildo.
Um dos principais objetivos na preparação para a partida contra o São Paulo foi evitar a apatia da derrota na Vila Belmiro.
— Nós deixamos a desejar contra o Santos e sabíamos que estávamos devendo. O presidente cobrou e eu cobrei. Tínhamos que dar uma resposta para o torcedor e precisávamos mudar o cenário contra o Sao Paulo. E mudamos — conta Renato.
3) Criação de um clima de decisão "à moda anos 1990"
Sem conseguir repetir aquele futebol vistoso e encantador apresentado entre 2016 e 2018, o Grêmio decidiu resgatar alguns elementos das principais conquistas dos anos 1990. A direção, com a ajuda dos jogadores, criou uma espécie de "ambiente de batalha", incutindo no grupo, na torcida e na opinião pública a ideia de que o adversário era superior e de que uma eventual classificação para a final só seria possível na base de uma superação heróica. "Contra tudo e contra todos".
Na véspera do jogo decisivo contra o São Paulo, o atacante Diego Souza declarou, em entrevista coletiva, que o time são-paulino gostava de apitar o jogo. Na chegada à capital paulista, Romildo Bolzan disse que o adversário era o favorito por estar mais descansado. E mais: manifestou a preocupação com a arbitragem, por conta dos episódios polêmicos do empate por 0 a 0 no Morumbi em 17 de outubro, classificados pelo mandatário como "um precedente perigoso".
O principal objetivo era deixar os jogadores com o sentimento de que a vitória nesta batalha só seria possível se entrassem em campo com "sangue nos olhos".
— Se considerarmos que a cultura dos anos 1990 era de competir acima de qualquer coisa, independentemente de jogar bem ou não, claro que sim (o espírito dos anos 1990 foi buscado). A competitividade é um dos pilares da estrutura de visão do clube. Estamos chegando por que competimos. Esse elenco provou que pode jogar bem, com posse de bola, e pode jogar competitivamente, de forma estratégica. Deu certo — declarou Romildo.