— Vizeu tá onde? Vizeu tá aí.
É com este bordão criado pelo funkeiro carioca Mc Cabelinho, ainda na época em que despontava no Flamengo, que o novo centroavante do Grêmio, Felipe Vizeu, viralizou nas redes sociais. O jogador de 21 anos, que veio por empréstimo da Udinese, da Itália, até dezembro, frequenta o CT Luiz Carvalho há duas semanas e já se sente em casa.
Neste período, já providenciou moradia na Capital, onde vive com a esposa Mariana e espera pelo nascimento de seu primeiro filho, Valentim, aguardado para a primeira quinzena de junho. Até lá, o novo camisa 47 tricolor pretende dar um salto em sua carreira sob o comando do técnico Renato Portaluppi.
Nesta entrevista, Vizeu conta sua trajetória desde a roça no interior do Rio, onde ajudava seu pai a ordenhar vacas, lembra a frustração no início da carreira no América-MG, fala da amizade com Lucas Paquetá e também explica como pretende se encaixar na equipe tricolor. Vizeu tá onde? Vizeu tá em GaúchaZH.
Como foi sua infância no interior do Rio?
Sou de Três Rios, cidade que fica perto de Juiz de Fora, quase na divisa com Minas. Morei na roça por um bom tempo, trabalhava com meu pai. A gente acordava às 4h30min para ordenhar vacas. Minha avó tinha comprado o um sitiozinho e meus tios, irmãos do meu pai, moravam lá também. Tinha uma casa para cada um. Quando o sítio foi comprado, valia R$ 18 mil. Naquela época, tinha só mato e uma casinha bem antiga. Aí a gente dividiu bem as partes e a família toda ficou ali. Depois, ficou valorizado e a gente vendeu. Mas ainda continuo tendo terras na região.
Então, você está acostumado a lidar com fazendas?
Gosto bastante. Sou bem reservado em relação a isso, mas acho muito legal. Até estou terminando a sede de uma fazenda que temos ali perto. É algo que me faz falta. Meu sogro é fazendeiro e, quando cheguei da Itália, no final do ano, a gente foi direto para lá. Aí o telefone não funcionava, até eu não poderia ficar ali por conta das ligações e tudo que estava acontecendo (negociação com o Grêmio). Acabou que fui para lá, fiquei três dias direto, depois começou a surgir tudo e tive de ir embora para resolver. Depois, meu sogro colocou internet e pude tocar as coisas de lá.
Como você trocou a roça pela bola? Seu início foi no América-MG, certo?
Sim, mas lá foi uma passagem rápida. Lá, tive muita dificuldade. Eu morava longe, era um garoto novo. Tive a perda da minha avó e do meu avô quando eu estava lá. Eu tinha 14 anos na época. Foi um momento difícil para mim. Lá, a gente tinha pouca estrutura. Fui assaltado uma vez por conta da displicência do clube. Eu tinha contrato de formação naquela época, que estava no final. Eles não pagavam, também. Acabou que eu dei entrada em uma ação para rescindir. Eles foram recorrendo e só depois de seis meses eu consegui me liberar.
Foi aí que apareceu o Flamengo.
Lá, o momento que mais te marcou foi o título da Copa São Paulo quando você atuava junto ao Lucas Paquetá?
Sou da mesma geração do Paquetá, fomos criados juntos. É um irmão que tenho no futebol. Por mais que hoje esteja na Itália (no Milan), temos bastante contato. Na ida dele para lá, falaram muito comigo para perguntar como era o país. Passei tudo do pouco tempo que fiquei lá. A Copa São Paulo foi o momento mais marcante na época da base do Flamengo. Eu vinha de competições que não tinham a mesma expressão. Na base, fui campeão carioca e vice da Copa do Brasil. Na Copinha, o Douglas Baggio, que hoje joga no Brasil-Pel, nasceu em 1995 e estourou a idade. Foi aí que eu joguei pela primeira vez o campeonato. Pude ser eleito o melhor jogador e também campeão. Logo depois, eu subi ao profissional.
Foi com o Muricy Ramalho que você teve sua primeira chance?
Sou muito grato a ele por tudo o que fez por mim no início. Me ajudou bastante.
Ele elogia sua capacidade de fazer gols. Como você aprimorou isso ao longo da carreira?
Fazer gols não é fácil. Fácil é errar. Na minha posição, você é cobrado por isso. É sempre importante a gente fazer gols. A gente tem de melhorar cada vez mais. É como bater falta e pênalti. Você pode ser um bom batedor, mas se deixar de fazer isso por algum tempo, seus acertos vão diminuir. A cada dia, muda a bola, muda a chuteira. Se você não aprimorar suas qualidades, isso pode atrapalhar. Mas, sem dúvida, é um dom também. Tento crescer a cada dia que passa.
O que você aprendeu com Paolo Guerrero e Leandro Damião, centroavantes que atuaram contigo no Flamengo?
Joguei bastante tempo com o Damião. Até o Zé Ricardo (técnico) chegou a escalar a gente junto. O Guerrero também me ajudou muito, é um cara que, quando eu subi, ele estava no time. É um jogador de seleção, com muita importância para o país dele. É um grande jogador, que me ensinou muito no momento que subi. Até hoje me manda mensagens, quer saber como estou. Quando fui para a Itália, ele me perguntava dos resultados. A gente tem este vínculo ainda, ele me ajudou muito no profissional.
Você enfrentou dificuldades de adaptação ao futebol italiano?
Eu consegui me adaptar até rapidamente. Havia muitos sul-americanos quando cheguei para a pré-temporada. Há sete anos o capitão do time era um brasileiro, o Danilo Larangeira, que jogou no Palmeiras, Athletico-PR. Isso me ajudou bastante. Tem Samir. Nícolas, um goleiro. Lucas Evangelista, Evandro. Havia também muitos brasileiros. Em língua, foi muito rápido para mim, porque hoje já falo italiano fluente. Em três meses já estava falando bem, fiz poucas aulas. Em futebol, sem dúvidas que tem diferença na questão tática da linha defensiva. Para nós, que somos atacantes, é um pouco mais difícil. O clube em que eu jogava ficava mais na retranca, time joga com mais defensores. Era um pouco mais difícil por isso. O time jogava mais no contra-ataque. Alimentação me ajudou muito. Quanto a treinamento, é igual. Aqui também se treina muito. Alguns trabalhos eu já tinha feito no Brasil.
Qual a importância de Renato em sua vinda para o Grêmio?
É um gênio. Um ídolo. Eu não vi jogar ao vivo, mas já vi muitos vídeos, tudo o que ele fazia, os gols. Era um cara que realmente gostava de fazer gol. E eu sou assim. Gosto de estar perto da área. Tenho esse cheiro, essa gana de fazer gol, mas não sendo fominha. Se tem um companheiro melhor colocado, vou passar. Ele era assim também. Quando fala comigo, fala que precisamos ter gana de fazer o gol. É só assim que você vai respeitar seu adversário, fazendo gol, não dando caneta ou chapéu, tentando ser o mais objetivo em prol do clube. Ver os vídeos dele, sabendo da pessoa, da personalidade, isso influenciou para eu aprender ainda mais. Isso iria pesar para qualquer jogador. Também pesou a vontade de eu querer voltar, minha esposa grávida, o apoio do Grêmio, dele (Renato).
Você disse que ficou muito impressionado com a recepção já na chegada. E agora, como está sendo o dia a dia? Como encara a concorrência com Jael, André e Thonny Anderson?
Quando cheguei, já foi um carinho muito grande da torcida que foi me receber. Isso foi muito gratificante para mim, isso dá muita confiança. E o grupo, eu bato na tecla todos os dias, é excepcional. Eu não imaginava que fosse assim. Não tem vaidade. Apesar da qualidade de todos os jogadores, não tem aquele estrelismo, é fechado. O comando do Renato ajuda muito para perder essa vaidade. Viralizou um vídeo de todos os atletas quando eu cheguei, todos desejando boa sorte. Luan tem conversado muito comigo, Everton. Jael, sem dúvidas, é uma grande pessoa. André eu já conhecia há bastante tempo, porque morei em Cabo Frio e ele é natural de lá. Thonny estou conhecendo agora, tem muita qualidade, um potencial grande.
Você acredita que irá se adaptar a este modelo de jogo do Grêmio, que privilegia o toque de bola e, por vezes, não joga muito em função do centroavante?
Sem dúvida. É o que eu falo. Precisamos ter muito entendimento do jogo. Se chegar uma bola e a gente fizer o gol e ganhar o jogo, está excelente. O grupo tem essa qualidade de tocar muito a bola, mas é de forma objetiva. A bola chega muito. Centroavante tem de estar ligado.
Você está ansioso por fazer o primeiro gol pelo Grêmio?
Sem dúvidas. Mas estou tranquilo, porque sei que (o gol) vai sair. Não posso ter essa ansiedade. Se Deus quiser, poderei fazer essa homenagem ao meu filho, minha esposa, minha família. E aos meus companheiros, que têm me ajudado muito.
A preferência é mesmo por usar a camisa 47?
Sim. É um número que me identifico bem. Fui campeão da 47ª Copa São Paulo. Tive destaque muito grande, por ser o melhor jogador, por ser vice-artilheiro.
Vai pedir para ser esse seu número a partir de agora?
Claro que na Libertadores tem um limite até 30. Mas há outros números que também gosto.
Quais são os outros números?
Tem o 25 também. Fui artilheiro da Sul-Americana com esse número. Já usei a camisa 9 na seleção de base. Me dei muito bem também. Sei que Jael hoje usa, tenho que respeitar meu companheiro. O mais importante é vestir a camisa e poder sempre ajudar o Grêmio.
Como surgiu o bordão "Vizeu tá aí"?
Surgiu através de meu amigo Mc Cabelinho. Numa entrevista, eu e Lucas Paquetá dissemos que era nosso cantor favorito. E ele usa esse bordão também. Aí, por conta de eu falar muito nos jogos, viralizou, não teve jeito (Nessa parte da entrevista, Marcelo Oliveira e Bruno Cortez entram na sala e perguntam: "Vizeu tá onde?". Eles mesmo respondem: "Vizeu tá aí"). Depois do jogo (contra o São Luiz), torcedores pediram para fazer vídeo comigo perguntando "Vizeu tá onde?" Pegou, é minha marca, é a meu favor.