Na boca do túnel que leva os jogadores para o gramado, Jael pegou no colo a pequena Laurinha e entrou em campo. Depois do protocolo que se repete antes de a bola rolar, o centroavante do Grêmio devolveu a filha de quatro meses para Bruna, sua mulher há cinco anos. Cumprimentou as duas e voltou para entrar na história do Gre-Nal.
O clássico de número 414 teve a marca decisiva do centroavante. Principalmente no segundo tempo, quando foi exatamente aquilo que se espera de um centroavante: goleador, garçom e pivô.
No primeiro tempo, Jael ficou encravado entre Rodrigo Moledo e Victor Cuesta. Travou aqueles duelos de ombro a ombro clássicos entre um camisa 9 e uma dupla de zaga em um jogo tão pegado. Mas pouco contribuiu. O Grêmio como um todo, a rigor, foi contido por 47 minutos. Até o gol de Everton.
Aquele lance, no último momento antes do intervalo, ruiu o Inter. O time entrou em parafuso, a defesa deixou espaços generosos, o ataque encolheu e o Grêmio fez valer a diferença entre os dois times. E ninguém soube aproveitar melhor essa oscilação do que Jael.
O camisa 9 achou seu espaço na defesa colorada. Fugiu da marcação, abriu caminho, tocou na bola. Tudo caminhava para o Grêmio ampliar o resultado. Faltava fazer gol.
E fazer gol é missão de centroavante. Mesmo que o tal centroavante tenha ficado conhecido pela falta de gols. Em todo o 2017, Jael não colocou a bola na rede. Verdade que teve uma lesão grave, rompeu ligamentos, perdeu quase meio ano em recuperação. Mas nas chances que teve, ficou, na melhor das hipóteses, no quase.
Voltemos ao Gre-Nal. Aos 17 minutos do segundo tempo, a partida teve uma falta a mais ou menos 30 metros do gol, praticamente frontal, levemente virada para a esquerda. O Grêmio fazia substituição, colocava Arthur, tirava Maicon. A torcida prendeu a respiração. Entre os três jogadores preparados para a cobrança, Jael. Confiante, correu para a bola. Depois da batida, olhou a trajetória e teve certeza: golaço.
— Jael vem treinando muito bem. Tem aproveitamento de 80%. Quando deu a falta, falei: "Pode bater". Não foi sorte. Até brinquei: "Po, finalmente aos domingos, era só em treino" — elogiou Renato Portaluppi.
Não satisfeito em marcar o gol que nocauteou o Inter, Jael esbanjou. Deu um passe de ombro, quase com nojo, para Arthur liquidar o placar. Era a coroação de uma partida histórica. Da entrada em campo ao apito final, se consagrou. E nada de Cruel. A fama de bad boy acabou.
— A Laurinha é uma bênção para nós. Jael mudou muito. Todo o tempo que ficou sem fazer gol, esteve tranquilo. Ele que me acalmava, dizia que isso aconteceria naturalmente. Ele está mudado. As pessoas até comentam isso, que ele é outra pessoa. Foi a mão de Deus — comentou sua companheira Bruna, evangélica como o marido, que o acompanha desde quando Jael ainda jogava na Coreia do Sul e passava férias na Bahia.
Cercado pelos repórteres na zona mista, Jael colheu os louros da vitória. Repetiu a frase de Renato, sobre os treinos, recuperou gols de falta antigos, marcados por outros times, lamentando que ainda não tinha sido pelo Grêmio. Pois, como havia dito a Bruna, tudo aconteceria na hora certa. Depois, o centroavante valorizou o grupo, a vitória, não criticou quem o criticava e agradeceu:
— Minha família é muito importante, minha filha, minha esposa. Acima de tudo, Deus é muito importante. Sou abençoado.
Jael, o Cruel, agora é Jael, o Fiel.