Seis personagens protagonizam o enredo que culminou no furto de R$ 400 mil do apartamento do ex-jogador do Grêmio Maxi Rodríguez, em um prédio de classe média-alta no bairro Menino Deus, em Porto Alegre. A trama, ainda pendente de novos esclarecimentos, foi apimentada pela burocracia do futebol, relações de trabalho e amizades supostamente traídas.
A história começa com três uruguaios: o próprio Maxi, um atleta da categoria de base do Grêmio e um torcedor do Peñarol de 26 anos que estava residindo e trabalhando na Capital gaúcha. O imóvel de onde a quantia teria sido surrupiada na noite de 21 de dezembro, quando estava vazio e recebeu a visita de uma mulher misteriosa que trajava turbante e portava as chaves, é de propriedade de Maxi. Ele passou o segundo semestre do ano na Argentina, defendendo o San Martín, de San Juan, e abriu as portas do apartamento para abrigar o compatriota que joga na base gremista. Um dos empresários de ambos é o mesmo, e ele também se vale eventualmente da moradia para hospedar atletas.
Ingressa na narrativa, agora, um "hincha" fanático pelo Peñarol. Ele conheceu o jovem da base gremista — que começou a carreira neste tradicional clube uruguaio — em um torneio de futebol em Porto Alegre. Inicialmente, se identificaram em assuntos relacionados ao carbonero de Montevidéu, uma das camisas mais consagradas do futebol da América do Sul. Mantiveram contato pelas redes sociais e se tornaram amigos.
Novato na Capital gaúcha, o jovem, certa vez, comentou que estava precisando de uma empregada doméstica para limpezas eventuais no apartamento do Menino Deus. O hincha resolveu o problema no ato: indicou a sogra, que passou a frequentar o imóvel. Sempre que asseava o lugar, recebia um controle para abrir duas portas de entrada do prédio e a chave do apartamento. A vida seguiu até o dia 21 de dezembro de 2017, data em que Maxi esteve em Porto Alegre para, segundo informação prestada por ele à Polícia Civil, receber o dinheiro como parte de um acordo com o Grêmio.
Fontes conhecedoras do caso indicam que os R$ 400 mil pagos pelo clube gaúcho a Maxi se referem a uma pendência da época em que o uruguaio atuou no Vasco, em 2014. O Tricolor teria optado por acertar os valores com o profissional. Há uma ação judicial acerca do caso. O ex-gremista teria sacado o dinheiro em um banco. Entram em cena, agora, outros dois personagens: o empresário que acompanhou os trâmites burocráticos e um doleiro com quem Maxi teria feito o câmbio de parte do valor, obtendo US$ 80 mil.
Pelo menos quatro pessoas sabiam que o atleta uruguaio havia recebido "uma bolada": o jogador da base, o empresário, o doleiro e o próprio Máxi, que deixou o dinheiro em sacos, em um guarda-roupa do apartamento. Investigadores liderados pelo delegado Cesar Carrion, titular da 2ª Delegadia de Polícia, procuram confirmar quem teria vazado a informação do pagamento, o que teria ocorrido, segundo a hipótese mais provável, por ingenuidade.
Na tarde que antecedeu o furto, o hincha conversou com o jovem aspirante a atleta profissional. Perguntou o que ele iria fazer nas horas que estavam por vir. A resposta: sair para um jogo de futebol, à noite, com Maxi. Eles voltaram a se falar por aplicativo de mensagens já sob a luz da lua. Em meio ao papo, o atleta gremista disse que estava na partida, como havia informado mais cedo. O torcedor do Peñarol pediu que ele enviasse uma foto no local, o que foi feito. Agora, havia um indicativo evidente de que o apartamento do Menino Deus estaria vazio.
Antes de o diálogo ser encerrado, o hincha informou que estava na Cidade Baixa com a namorada, a sexta e última personagem da história. Ela é filha da empregada doméstica que fazia limpezas no imóvel.
Às 21h35min de 21 de dezembro, a companheira do torcedor do Peñarol, de 44 anos, chegou ao prédio com o turbante rosa. Ela tinha o controle para ultrapassar as duas portas do acesso ao térreo, mas um vídeo da câmera de segurança mostra que o porteiro deixou a sua cabine para interpelar a mulher, chegando a dar alguns passos atrás dela. Estranhando a situação, ele perguntou onde ela iria. Embora seja brasileira, ela respondeu em espanhol, citando o imóvel de Maxi.
Dez minutos depois, a mulher, que chegou de mãos vazias, saiu carregando uma sacola de papel pardo em que, supostamente, estavam os R$ 400 mil.
Depois de retornar ao apartamento e se dar conta do sumiço do dinheiro, Maxi registrou ocorrência na 2ª DP às 5h22min da madrugada de 22 de dezembro, sexta-feira.
A investigação da equipe do delegado Carrion já ouviu o jogador uruguaio, o atleta da base do Grêmio, o empresário e a mulher, que negou qualquer envolvimento. O hincha, depois de receber telefonema de policiais, informou que precisava de meia hora para chegar à 2ª DP para prestar depoimento, mas tomou sumiço desde então.
Entre as principais perguntas que ainda persistem, estão o paradeiro do dinheiro, o vazamento da informação sobre o recebimento dos R$ 400 mil, ainda que tenha ocorrido de forma acidental, o planejamento e a autoria do suposto furto e o motivo de Maxi ter decidido carregar tamanha quantia em espécie, sendo parte em dólares.
A Polícia Civil trata o suposto crime, por enquanto, como furto qualificado, mas apura a possibilidade de participação de uma quadrilha organizada.