Depois de liderar o Grupo B, o Caxias chega à final do primeiro turno do Gauchão com a vantagem de decidir o título dentro de casa, no Estádio Centenário. Apesar de ter do outro lado o atual bicampeão estadual, o Grêmio, o clube da Serra sonha em repetir o feito conquistado pela geração comandada por Tite, em 2000.
Exemplos de superação não faltam. Neste ano mesmo, na primeira rodada, a equipe já venceu o Grêmio por 2 a 0 em plena Arena. Mas, independentemente do resultado deste sábado (22), a torcida grená pode se considerar vitoriosa.
Há cinco anos, o cenário era completamente diferente. Afundado em dívidas, o clube amargou seu primeiro rebaixamento em âmbito estadual no dia 5 de abril de 2015. Para piorar, em setembro, o clube ainda caiu também para a Série D do Brasileirão.
Deste então, um grupo de abnegados assumiu a gestão e, ano após ano, tem se intercalado para reconstruir o Caxias dentro e fora de campo.
2016: retorno à elite
Ainda em novembro de 2015, o arquiteto Maurício Grezzana, então com 39 anos, foi eleito presidente para o biênio que viria pela frente. Além disso, foi feita uma mudança estatutária, criando um Conselho de Gestão, formado por oito pessoas, que seria responsável por adequar o clube às exigências do Profut.
— Eu era patrocinador na época, e o pessoal veio me chamar para anunciar que provavelmente o clube iria fechar. Ali, reunimos algumas pessoas e começamos a fazer um diagnóstico para saber de que forma cada um poderia contribuir. O endividamento era muito grande, chegava a R$ 43 milhões. Mas criamos estratégias de arrecadação, vendemos parte de um terreno, começamos a pagar as contas e minimizamos essa dívida. Continuamos com dificuldades até hoje, porque é difícil manter um clube do Interior, mas nunca mais atrasamos um mês sequer de salário — revela Grezzana.
A organização se refletiu no campo. Treinado por Beto Campos (que foi campeão estadual no ano seguinte com o Novo Hamburgo), o Caxias liderou todas as etapas da Divisão de Acesso e, com uma rodada de antecedência, garantiu a única vaga que o levaria de volta à elite do futebol gaúcho. O capitão da equipe era Lacerda, atual treinador do time.
Na Série D, porém, o time caiu na segunda fase para o Inter de Lages-SC. Nada estragasse aquela temporada. Em novembro, já sob o comando de Luís Carlos Winck, a equipe conquistou a Copa FGF ao bater o Ypiranga na final.
2017: quase finalista do Gauchão
Em seu retorno à primeira divisão do Gauchão, o Caxias manteve Winck no cargo. Com a segunda melhor campanha na primeira fase (à frente até mesmo da dupla Gre-Nal), a equipe não chegou à decisão do campeonato por muito pouco. Só foi cair nas semifinais para o Inter, de Antônio Carlos Zago, nos pênaltis.
Por conta do título conquistado pelo Novo Hamburgo, o Caxias foi considerado o campeão do Interior daquele ano e, com isso, se garantiu de volta na Série D do ano seguinte.
— Os resultados aparecem se tu consegues criar um grupo coeso, com gestão séria e equilibrada. Hoje, ainda participo da gestão, na parte de marketing e social. Nós somos transparentes, não escondemos nada do torcedor, e isso dá resultado — completa Grezzana.
2018: Série C bate na trave
O ano de 2018 começou a ser planejado ainda em setembro de 2017, quando Roberto Dellazer assumiu a presidência e, ao lado do técnico Winck, começou a montagem do elenco. No Gauchão, o clube repetiu o segundo lugar na fase classificatória (atrás apenas do Brasil-Pel, de Clemer, que seria o finalista daquela edição). Porém, no mata-mata, foi surpreendido pelo Avenida já nas quartas de final.
No segundo semestre, o clube apostou todas as fichas na Série D. Depois de liderar o seu grupo, o time parecia engrenar rumo ao acesso à Série C, mas acabou perdendo para o Treze-PB por 3 a 1, de virada, em casa, e decepcionando sua torcida. O jogo ficou marcado por uma confusão generalizada, que terminou com uma briga à porta do vestiário no Estádio Centenário. Era a primeira grande frustração do clube desde seu ressurgimento.
— Tem coisas no futebol que a gente quer compreender, mas não consegue. Não dá para fazer uma conjuntura de toda uma gestão em um jogo. Fomos pagando dívidas e, graças a Deus, todos esses anos o Caxias montou times muito bons. Há méritos de todas as pessoas envolvidas desde 2015. Fica uma frustração muito pessoal minha, porque tu queres dar alegria ao torcedor, que não quer saber quanto tinha de dívida. Ele quer saber por que não passou. Então, ficou essa angústia — comenta Dellazer, que aposta no acesso em 2020. — Esse ano é fundamental para que o Caxias conquiste o acesso para a Série C, para dar um novo gás, trazer novos torcedores e resgatar pessoas que se afastaram da direção. Será um ano fatídico — sentencia ele.
2019: bicampeão do Interior
Para 2019, mudanças nos gabinetes e no vestiário. Vitacir Pellin, que era o vice-presidente, assumiu o comando do clube.
— As pessoas me perguntam porque foi criado este grupo de gestão. Se me provarem que não é com continuidade que se trabalha, eu faltei à aula deste dia — atesta Pellin.
Já o time foi entregue ao ex-volante Pingo. Com o novo treinador, a equipe passou a apresentar um futebol ofensivo, chegando novamente à semifinal do Gauchão. Acabou eliminada pelo Inter, na estreia de Paolo Guerrero, mas a campanha rendeu o título de campeão do Interior.
Na Série D, o clube foi bem novamente. Mesmo surpreendendo ao trocar de treinador em meio ao campeonato (Paulo Henrique Marques substituiu Pingo), o time chegou às quartas de final pelo segundo ano consecutivo. Desta vez, o algoz foi o Manaus-AM, que sepultou o sonho grená de chegar à terceira divisão com uma vitória por 3 a 0. Assim, tendo apenas a Copa FGF no horizonte, a direção enxugou a folha salarial e apostou no técnico Rafael Lacerda (ex-zagueiro do clube), que foi mantido como treinador para esta temporada.
— Modéstia à parte, embora eu não tenha o perfil de aparecer, tenho trabalhado nos bastidores do futebol profissional e amador. Precisávamos remontar nosso elenco, não tínhamos dinheiro e sentamos para conversar com quatro treinadores para saber o que eles pensavam sobre futebol e gestão de vestiário. Percebi que o Lacerda não devia nada aos outros anteriores e ainda se identificava com o clube. Era jovem e tinha a gana de fazer acontecer. Então, eu digo que não é uma aposta, é uma convicção — sentencia o ex-presidente, que em novembro passou o bastão para o atual mandatário, Paulo César Santos.