Neste domingo, Caxias do Sul (e não Novo Hamburgo) assistirá a uma pitoresca final do nosso querido e bem regulamentado Campeonato Gaúcho. Não que seja novidade. Retornemos a 1994, ano do Plano Real, do casal Raí e Babalu e do Gauchão de março a dezembro, com 23 times se enfrentando em turno e returno.
Dividindo atenções com Brasileiro, Copa do Brasil, Supercopa e Conmebol, faltou calendário para a o Grêmio cumprir a maratona. Dirigentes, então, tiveram uma ideia brilhante para "zerar" o campeonato. O Grêmio de Felipão tirou um domingo, em 11 de dezembro, para jogar em um só dias os três jogos que lhe faltavam às 14h, 16h e 18h. Afinal de contas, nenhum dos três valia nada. Nem para ele, nem para os adversários.
E lá foram, debaixo de um calor de 40ºC , 34 atletas do Grêmio a campo. Até Felipão tinha um reserva, o auxiliar Zeca Rodrigues. Alguns jogadores, como o meia Emerson, jogaram mais de 90 minutos – entrou durante o segundo jogo e lá ficou, até o final do terceiro. Só trocou de camisa porque, para não dar confusão, o Grêmio usou três uniformes diferentes. Ao final de mais de 270 minutos de bola rolando, o Grêmio empatou com o Aimoré em zero, venceu o Santa Cruz por 4 a 3 (jogão!) e bateu o Brasil-Pel por 1 a 0.
Podemos combinar que este episódio foi uma bizarrice? Pois resolvi consultar os arquivos da Zero Hora para ver como nós, da imprensa, tratamos o episódio à época. A resposta é: com espantosa naturalidade. O comentarista Lauro Quadros até lascou em ZH: "Este espeto corrido, em tarde de tempo bom, até poderá atrair bom público!" Errou, o Lauro: 758 torcedores foram ao Olímpico e 247 pagaram o ingresso a R$ 3 (R$ 1,50 para estudante).
Aonde quero chegar? Que a insanidade não parece tão insana no presente. No caso deste domingo, mais do que uma insanidade, uma irresponsabilidade. Graças a um regulamento sem sentido, o Inter será obrigado a optar entre um jogador de linha no gol ou um goleiro sem condições de jogo, colocando em risco a sua integridade física. Já o Novo Hamburgo, cuja média de público é de 1.236 pagantes mesmo liderando o campeonato de cabo a rabo, é obrigado a mandar seu jogo em um estádio em que caibam mais de oito vezes isso, mesmo que as chances de enchê-lo diminuam consideravelmente a 90 quilômetros de casa.
Legalistas dirão que regulamentos existem para ser cumpridos, e torcedores dirão que eu, como gremista, não tenho nada que opinar. Bem, isso também mudou pouco desde 1994. Nos vemos em 23 anos!
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