Dias depois de chegar do México como campeão do mundo, Everaldo foi imortalizado na memória do Grêmio. Em decisão aprovada pelo Conselho Deliberativo, a bandeira do clube ganhou uma estrela dourada para homenagear o lateral da Seleção Brasileira, campeão da Copa de 1970. Colorado na infância, conforme afirma a filha Denise, o jogador tentou a sorte no Inter, mas foi reprovado por ser franzino.
Festa que parou Porto Alegre e uniu a dupla Gre-Nal: o retorno de Everaldo, campeão do mundo em 1970
No Grêmio desde os 13 anos, estreou pelos profissionais quando tinha 18, em novembro de 1962, num jogo contra a Seleção Gaúcha. Teve uma passagem por empréstimo ao Juventude, em 1964 e 1965, onde chegou a atuar como volante e meia. Ao retornar ao clube, assumiu o posto que era de Ortunho, outro ícone da lateral esquerda tricolor.
— Quando ele entrou na equipe principal, eu já estava. Era um jogador clássico, marcava e saía jogando. Jogava simples, mas tinha muita categoria, tanto que antes de ser lateral foi centromédio (volante) — enfatiza por telefone desde a praia de Mariluz o ex-jogador João Severiano, o Joãozinho.
Os dois viraram grandes amigos, tinham filhos com idades aproximadas e frequentavam a casa um do outro. Everaldo era descrito como uma pessoa afável e educada.
— Uma pessoa boníssima — sintetiza o meia que fez sucesso no Tricolor nos anos 1960.
Loivo Johann, 75 anos, outro ex-colega de Grêmio, também destaca as virtudes defensivas do campeão do mundo, a quem classifica como um grande marcador. Por muitos anos, fizeram dobradinha pelo lado esquerdo. Um na lateral, o outro na ponta.
Em 1967, aos 23 anos, o gremista foi chamado pela primeira vez para defender a Seleção Brasileira. Conquistou a Copa Rio Branco, no Uruguai. Depois, participou das Eliminatórias para a Copa e assegurou vaga entre os relacionados para o Mundial do México.
— Quando foi convocado, ficamos muito felizes. Na Copa, tomou a posição do Marco Antônio e se sagrou campeão. Mas voltou do mesmo jeito, tranquilo e humilde — recorda Joãozinho.
— O sucesso não subiu para a cabeça — completa Loivo.
Dois anos após a glória no México, o time de Zagallo enfrentaria a Seleção do Rio Grande do Sul no amistoso que teve o maior público da história do Beira-Rio. O treinador não convocou Everaldo, o que inflamou a torcida gaúcha contra a equipe nacional. Anos depois, o meia Rivellino disse que o jogo parecia ser na Argentina, tamanha a animosidade enfrentada. A partida terminou 3 a 3, com o lateral representando seu Estado.
Ainda em 1972, Everaldo se envolveu em um lance que marcou negativamente sua carreira e praticamente encerrou sua trajetória no Grêmio. Ao perceber que o árbitro José Faville Neto marcaria um pênalti contra o time, o jogador desferiu-lhe um soco. Resultado: um ano de suspensão. A atitude surpreendeu a todos, já que o atleta não tinha histórico de conduta violenta e indisciplina.
No Tricolor, jogou nove temporadas e conquistou três títulos gaúchos (1966, 1967 e 1968). Conforme o pesquisador Laert Lopes, foram 374 jogos pelo clube, com 212 vitórias, 108 empates e 54 derrotas. Marcou dois gols, ambos diante do Esportivo, um em 1970 e outro em 1972. Também fez dois gols contra. Seu último jogo com a camisa gremista ocorreu em 8 de setembro de 1974, menos de dois meses antes de sua morte. Pela Seleção, disputou 29 partidas. Everaldo morreu aos 30 anos.
— A gente ama a quem nos dá carinho. Foi o Grêmio que deu oportunidade ao meu pai. E também, o maior presente, aquela estrela na bandeira. Só tenho a agradecer ao que o clube foi na vida dele. E ele vestiu a chuteira com profissionalismo, com coração — exclama a filha, Denise.
PELO GRÊMIO
374 jogos
212 vitórias
108 empates
54 derrotas
2 gols marcados
PELA SELEÇÃO
29 jogos
17 vitórias
10 empates
2 derrotas
Durante campanha eleitoral, o trágico acidente
Com o prestígio de um campeão do mundo, Everaldo era considerado forte candidato na eleição para deputado estadual em 1974. Aos 30 anos, concorrendo pela Arena (um dos partidos da época), o lateral percorria o Estado em eventos e jogos festivos. Na volta de uma dessas partidas, disputada no dia 27 de outubro, em Cachoeira do Sul, o jogador, a esposa dele, uma irmã e a filha mais nova morreram.
A filha mais velha do jogador, Denise, então com seis anos, foi uma das sobreviventes entre os passageiros do Dodge Dart guiado por Everaldo. Um tio do jogador, Jardelino, também escapou com vida.
— Pelo que me contaram, eu vinha no colo da minha tia e caí nos pés dela com a batida. Depois, acordei no hospital — diz a hoje cozinheira, moradora do bairro Restinga.
Do dia trágico, ela lembra das arquibancadas brancas do estádio onde o pai jogou pela última vez, defendendo os veteranos do Grêmio. E da parada em um posto de gasolina no retorno, quando o lateral conversou com o amigo Loivo, que também havia ido a Cachoeira do Sul e estava em outro carro.
— Paramos em Pântano Grande, o Everaldo quis jantar com a família. Na hora de sair, falou para mim: "Alemão, eu vou tocando". Uns 10 ou 15 quilômetros depois, ocorreu o acidente, eu vi de longe. Reconheci o carro, com a placa dourada. Ainda levei a filha dele que se salvou para o Pronto-Socorro — recorda Loivo.
A colisão entre o Dodge Dart e uma jamanta carregada com 20 toneladas de arroz aconteceu quando o caminhão saía de um posto nas proximidades da localidade que era conhecida como Minas do Butiá. Everaldo chegou a ser socorrido por um carro da reportagem do Jornal Hoje, vespertino que pertenceu ao Grupo RBS na década de 1970, mas não resistiu.
No hospital, sem saber da morte dos pais, como contou ZH na edição de 29 de outubro de 1974, Denise perguntou pela mãe e preocupou-se por ter de faltar ao colégio. O tio do jogador, Jardelino, também questionou sobre o estado do sobrinho. Para não prejudicar sua saúde, disseram que Everaldo estava bem.
A tragédia chocou o Estado, em especial os gremistas e colegas de Grêmio.
— Me marcou muito, pela convivência que tínhamos. Foi terrível, foram dias muito difíceis. A gente não esquece jamais — emociona-se Loivo.
O ex-meia João Severiano completa:
— O Everaldo era um cara brincalhão, amigo, solidário. Mereceu o título de campeão do mundo e teve um fim que não foi esperado.