Ainda há polêmicas, ainda há dúvidas, ainda há muitas críticas. Mas o árbitro de vídeo, o nosso agora famoso VAR, veio para ficar. Anunciado pela Fifa em 2016, o sistema que prometia revolucionar as arbitragens faz sua estreia em escala global nesta Copa do Mundo. O veredito, após os 48 jogos da primeira fase, é de que ajuda, bastante, os homens do apito. Só que o sistema está longe de pronto. E deve passar por mudanças após o final do Mundial.
A avaliação da Fifa sobre a grande vedete da Copa é positiva. Na sexta-feira, os ex-árbitros Pierluigi Collina e Massimo Busacca, atualmente chefes de arbitragem da entidade que comanda o futebol, participaram de uma entrevista coletiva sobre o novo recurso. Em uma hora e meia de conversa com os jornalistas, Collina e Busacca trataram de mostrar que, para a Fifa, o VAR é um acerto e algo que ficará de legado para o futuro do esporte, mesmo que nem todos concordem com as decisões tomadas pelos juízes em campo após a consulta aos vídeos.
– Durante uma competição, não é possível que tudo corra 100% perfeito. Algumas coisas precisam de ajustes mínimos, baseado no que ocorreu nos primeiros jogos. Tivemos 95% das decisões tomadas pelos árbitros, sem o VAR, corretas, e esse percentual sobe para 99,3% com a intervenção do vídeo – afirmou o italiano Collina, que apitou a final da Copa do Mundo de 2002, entre Brasil e Alemanha. – Isso foi algo que nós sempre dissemos: o VAR não significa a perfeição. Mas vocês podem ver que 99,3% é algo muito, muito próximo a isso.
Collina não esclareceu como foi feita essa avaliação dos lances corretos – e nem quais foram os momentos que correspondem ao 0,7% de erros dos juízes. O que mereceu destaque foram os números gerais do uso da ferramenta: no total, foram 335 incidentes avaliados pelo VAR nos 48 jogos, uma média de 6,9 por partida. Todos os gols passaram pelo crivo da equipe de vídeo. Houve 17 lances em que foi necessário revisar a decisão de campo, e em 14 desses casos o árbitro mudou sua marcação após a análise, seja no monitor ao lado do campo, seja apenas pela avaliação do time assistente. Um resultado que agradou a Fifa.
– De forma geral, estamos muito felizes com as performances (da arbitragem). O VAR ajudou muito – completou o suíço Busacca.
Analistas de arbitragem festejam o VAR, mas seus elogios não são tão eloquentes, principalmente pela falta de clareza do protocolo de utilização do recurso. Ex-juiz do quadro da Fifa, o gaúcho Leonardo Gaciba, que trabalha como comentarista para a Rede Globo, cita como exemplo o lance em que o atacante sérvio Mitrovic foi segurado por dois jogadores da Suíça, na derrota de sua seleção por 2 a 1. O árbitro de campo não pediu ajuda ao de vídeo, e aparentemente, a equipe do VAR também não chamou atenção para a jogada.
O duro teste dos mata-matas
Ex-árbitro com carreira internacional, Salvio Spinola prevê dificuldades para os 16 jogos que restam na Copa – justamente as partidas mais importantes do Mundial.
– Eu sou totalmente favorável ao uso do VAR. Mas uma coisa é ser a favor, apoiar, e outra é a forma como foi utilizado. Acho que falta mais clareza em relação ao protocolo, e a Fifa paga um preço porque nunca abriu um debate amplo com o mundo dos jogadores e técnicos. Há muitas dúvidas com relação a isso. A utilização do VAR é positiva. Não vamos encontrar erro muito grande. Equívocos vão acontecer sempre. Agora, o grande impasse do VAR está para chegar. Todas as experiências em mata-mata foram frustrantes. Como na final da Libertadores entre o Grêmio e o Lanús, no ano passado, quando houve um pênalti não marcado e nem mesmo analisado. São jogos diferentes daqueles de fases de grupos – disse Spinola, atualmente comentarista da ESPN Brasil.
Gaciba pensa parecido:
– Vejo como um processo em evolução. São várias coisas a ser ajustadas. O VAR se mostrou perfeito em alguns casos, sem gol impedido ou mal anulado na primeira fase. Está se fazendo justiça, e isso é bom. Mas temos de melhorar a justiça parcial, os critérios. Isso precisa ser melhorado. Por enquanto, é uma novidade.
Um ponto comemorado pela Fifa e pelos comentaristas é que o uso do VAR evitou lances violentos até aqui na Copa. Algo que se vê nos números: se a quantidade de cartões amarelos – 162, ou 3,4 por jogo – está no nível dos principais campeonatos europeus, os vermelhos diminuíram drasticamente, com apenas três expulsões, e todas em lances de jogo.
– O VAR coibiu o jogador de lances violentos. Os jogadores sabem que têm de jogar de maneira diferente. Antes, sem o vídeo, eles admitiam que poderiam entrar com a sola alta se o árbitro fosse fraco. Agora, não mais. Não teremos mais, também, casos como a mordida do Suárez no Chiellini, como em 2014 – lembrou Spinola.
O uso do VAR:
- O VAR é utilizado em apenas quatro situações: para a revisão de gols, pênaltis, cartões vermelhos direto e erro na identificação de jogadores na aplicação de cartões.
- O árbitro de campo fica em contato direto com um chefe de vídeo e três assistentes, que acompanham o jogo na íntegra. Ele pode pedir auxílio se estiver em dúvida sobre um lance.
- O árbitro de vídeo também pode chamar o juiz de campo e sugere a consulta ao monitor que fica ao lado do gramado, ou avisar, por ponto eletrônico, que a marcação foi errada. O monitor de campo é operado pela equipe do VAR, que passa as imagens ao árbitro para que ele tome a decisão final sobre a jogada.