Imagine montar uma seleção a partir de uma população equivalente à encontrada em cidades gaúchas como Pelotas ou Canoas. Pense que esta seleção consegue se classificar para uma Copa do Mundo e, logo na estreia, arrancar um empate diante da Argentina de Lionel Messi. Aos poucos, a incrível história da Islândia começa a virar um conto de fadas no Mundial da Rússia.
O pequeno país nórdico, situado em uma ilha ao norte do Reino Unido e a oeste de Noruega, Suécia e Finlândia, tem apenas 334 mil habitantes. Isso significa que um a cada 14,5 mil pessoas nascidas no país está no elenco da seleção para a Copa — para efeito de comparação, no Brasil esta relação é de um a cada 9,03 milhões.
Como a população é tão pequena, a seleção islandesa tem um ambiente quase familiar. O técnico Heimir Hallgrímsson, por exemplo, também trabalha como dentista. O homem de 51 anos também tem uma tradição que seria absurda em qualquer outro dos 31 países que jogam o Mundial. Ele vai a um bar antes dos jogos e debate com torcedores sobre a escalação e suas estratégias. O encontro inicialmente reunia cerca de 20 pessoas. O sucesso recente da seleção aumentou o quórum para 1 mil.
— Todos os islandeses fazem mais de uma coisa, têm dois ou três ofícios ao mesmo tempo ou vão mudando durante a vida. Pode até ter um dentista que também é treinador de futebol (risos) — brincou Heimir Hallgrímsson, em uma entrevista recente ao site argentino Infobae.
Para o elenco, há um padrão de sucesso na carreira que é seguido por vários dos jogadores. Eles começam a jogar na própria Islândia, mas vão logo cedo para os vizinhos nórdicos Noruega, Dinamarca e Suécia. Os melhores chegam à elite do futebol europeu, como Inglaterra, Itália, Alemanha e Espanha.
Enquanto alguns são de famílias de esportistas, como Aron Gunnarsson (o irmão é da seleção de handebol) e Bjorn Sigurdarson (tem três meio-irmãos que já defenderam a seleção de futebol), outros têm eles mesmos atividades paralelas ao futebol. O goleiro Hannes Halldorsson, por exemplo, também é diretor de cinema nas horas vagas e chegou a produzir o comercial da Copa no seu país.
Como era de se esperar em um país de tão baixa densidade demográfica, a Islândia sempre teve pouco sucesso no futebol. Mas esta geração é revolucionária. Conseguiu pela primeira vez, em 2016, a classificação para jogar a Euro e foi até as quartas de final. Na Rússia, tem a chance de jogar a Copa do Mundo pela primeira vez. Se o ambiente islandês é quase de parentesco, a família nunca deu tanto orgulho ao seu clã.
Os 11 titulares
Hannes Halldorsson
Além de ser goleiro desde 2002, também é diretor de cinema no tempo livre. Desde 2016, ele defende o Randers, da Dinamarca, mas, aos 34 anos, também tem no currículo produções que disputaram prêmios no cenário europeu, clipes de bandas locais. Também dirigiu o comercial da Coca-Cola para a Copa na Islândia e um documentário sobre jogadores de futebol do país. Depois de ser semiprofissional durante boa parte da carreira, ele virou profissional de fato em 2014, quando foi jogar na Noruega.
Birkir Már Saevarsson
O lateral-direito jogou na Islândia de 2003 a 2008 e, depois de passagens por Noruega e Suécia, voltou ao seu país natal para jogar no Valur em 2018. Ele joga pela seleção nacional desde 2007.
Kári Árnason
O zagueiro de 35 anos é um dos mais experientes do grupo. Entre 2002 e 2004, jogou no futebol universitário dos Estados Unidos, pelas universidades de Gonzaga e Adelphi. Como profissional, rodou os países nórdicos. Voltou para a Islândia este ano para defender o Vikingur.
Ragnar Sigurdsson
O zagueiro de 32 anos começou a jogar na Islândia, mas logo foi para a Suécia. Depois, foi para a Dinamarca, Rússia e Inglaterra. Voltou ao futebol russo em 2017 e neste ano se transferiu para o Rostov. Defende a seleção nacional principal desde 2007.
Horour Magnússon
Uma das grandes promessas do futebol islandês, o lateral-esquerdo chegou a defender a Juventus, da Itália. Desde 2016, joga pelo Bristol City, da Inglaterra. Com 25 anos, joga pela seleção principal desde 2014.
Jóhann Gudmundsson
Assim como a maioria dos islandeses, o meio-campista começou jogando em seu país e logo foi para um vizinho nórdico. Jogou na Dinamarca por cinco anos antes de ter a chance no futebol inglês. Atualmente joga no Burnley e está na seleção principal desde 2008.
Aron Gunnarsson
O jogador do Cardiff City, do País de Gales — e que compete nos torneios ingleses —, é de uma família esportista. Além dele, o seu irmão mais velho, Arnór, joga na seleção nacional de handebol.
Gylfi Sigurdsson
O talentoso meio-campista foi para o futebol inglês ainda nas categorias de base para defender o Reading. Tornou-se profissional pelo clube britânico em 2008. Atualmente, joga no Everton. Está na seleção desde 2010.
Emil Hallfredsson
O jogador de 33 anos também foi cedo para um grande centro do futebol. Em 2005, aos 21 anos, foi contratado pelo Tottenham. Está desde 2010 no futebol italiano e, atualmente, joga pela Udinese. É um dos mais longevos na seleção, que defende desde 2005.
Birkir Bjarnason
O meia iniciou a carreira no Viking, da Islândia. Depois, passou por Noruega, Itália, Bélgica, Suíça e, desde 2017, joga pelo Aston Villa.
Alfred Finnbogason
Jogador mais avançado no esquema 4-5-1, o atacante de 29 anos fez um caminho recorrente para os islandeses. Começou em seu país natal, rodou países do segundo escalação europeu, como Bélgica e Suécia, até chegar a Holanda e Espanha, onde defendeu o Real Sociedad. Teve uma passagem na Grécia e, desde 2016, joga no Augsburg, da Alemanha. Tem mais de 40 partidas pela seleção nacional, que defende desde 2010.
Mais algumas peças curiosas
Frederik Schram
O goleiro reserva tem 23 anos e nasceu em Dragor, na Dinamarca. Filho de pai dinamarquês e mãe islandesa, joga na terra do pai, mas optou desde cedo por defender o país da mãe. Depois de atuar nas seleções de base, teve a primeira oportunidade na seleção principal no ano passado e já foi chamado para a Copa.
Rúnar Alex Rúnarsson
O destaque do terceiro goleiro é o seu pai. Rúnar é filho de Rúnar Kristinsson, o único jogador a ter mais de 100 jogos pela seleção islandesa na história.
Rúrik Gíslason
O meia de 30 anos não se preocupa apenas com o futebol. Atualmente jogador do Sandhausen, da Alemanha, o atleta é filiado ao Partido da Independência, de centro-direita, e concorreu ao parlamento islandês em 2016 e 2017.
Albert Gudmundsson
O meia-atacante de 21 anos joga numa espécie de time B do PSV. O destaque vem pela família do jogador, que é toda ligada ao futebol. Seu pai e seu avô materno foram atletas. O seu bisavô, Albert Gudmundsson, atuou por Milan e Arsenal e foi o primeiro islandês a ser jogador profissional na história.
Bjorn Sigurdarson
O atacante tem três meio-irmãos que também foram jogadores e defederam a seleção em outros momentos: Bjarni, Dorour e Alfred.