O português Paulo Bento não precisou de muito tempo para saber como funciona a máquina de moer treinadores do futebol brasileiro. Como a derrota de quarta-feira para o Flamengo colocou o Cruzeiro na zona de rebaixamento, ele apresentou-se para a entrevista coletiva de sexta consciente de que o tema demissão poderia ser levantado pelos jornalistas.
– Treinador tem que estar com a mala sempre pronta. A minha, no caso, é maior, porque vim de Portugal – brincou, desfazendo o clima tenso.
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Com salário de R$ 450 mil, o que inclui sua comissão técnica, formada por quatro profissionais, e o prestígio de ter treinado a seleção portuguesa na última Copa do Mundo, Paulo Bento só não está mais a perigo por ter derrotado o Atlético-MG no clássico local.
O jornalista Nuno Miguel Martins, da rádio TSF, de Lisboa, diz que o treinador é defensivista. Paulo Bento costuma montar seus times a partir de um rígido sistema defensivo para só então pensar em atacar. Diferencia-se muito de outro técnico português, André Vilas-Boas, atualmente no Zenit São Petersburgo, que aprecia o jogo mais vistoso. Não que Bento abdique de buscar a vitória. Mas, conforme Nuno, é o tipo de treinador que vibra com 1 a 0.
– Esse foi um dos problemas dele na seleção portuguesa. Na Copa do Mundo, Cristiano Ronaldo reclamava que a bola ficava pouco lá na frente – diz o jornalista.
Em 2002, Paulo Bento e Cristiano Ronaldo jogaram juntos no Sporting. Enquanto a estrela do Real Madrid recém despontava, o atual técnico do Cruzeiro já preparava o encerramento da carreira. Ficaram amigos, mas o relacionamento terminou depois da Copa. Tudo por conta do defensivismo do técnico, criticado em público por Cristiano.
Os primeiros dias de Cruzeiro desmentiram um pouco a fama de defensivista. Estatísticas apontaram o time mineiro como um dos que mais chutavam a gol no Brasileirão. O aproveitamento, contudo, era muito ruim.
– Dá para dizer que, com Mano Menezes, o time jogava mais fechadinho – afirma Paulo Galvão, do site mineiro Superesportes.
Em 2004, Tinga atuou como jogador ao lado de Paulo Bento no Sporting. Diz ter conhecido um profissional sério, de estilo discreto, apesar da forte personalidade.
– Como jogador, ela já tinha muita visão, organização e liderança. É um estudioso do futebol. Isso já é um princípio – diz o ex-volante.
Os dois reencontraram-se na semana passada, quando Tinga, bicampeão brasileiro pelo Cruzeiro, visitou a Toca da Raposa. Apesar da demorada conversa, o ex-jogador garante que Bento não pediu dicas sobre como deve se relacionar com os atletas brasileiros.
– Ele está bem feliz. Não havia lugar melhor do que o Cruzeiro para ele trabalhar no Brasil – entende Tinga, apontando o clube mineiro como um dos mais receptivos a profissionais que alterem a rotina do clube.
No caso de Paulo Bento, a mudança mais forte foi fechar todos os treinamentos. Apenas a primeira parte é liberada para que fotógrafos e cinegrafistas colham suas imagens. Foi como ele se habituou a trabalhar em Portugal.
Titulares na seleção portuguesa que disputa a atual Eurocopa, Nani e João Moutinho são o cartão de apresentação do treinador do Cruzeiro. Ambos foram lançados por ele em 2005, quando, penduradas as chuteiras, virou técnico do Sporting.
– Ele não tem nenhuma dificuldade em lançar jovens. Se derem tempo, poderá fazer um bom trabalho no Cruzeiro – aposta Nuno Miguel Martins.
*ZHESPORTES