Rubens Barrichello esteve, por 19 anos, na Fórmula-1, entre os melhores pilotos do mundo e com os carros mais rápidos que o automobilismo pode proporcionar. Mas é na Stock Car que o veterano, dono da marca de mais provas disputadas na principal categoria do esporte, vive seus melhores momentos, na sua própria avaliação.
Em seis temporadas de volta ao Brasil, Barrichello faturou um título, em 2014, e duas Corridas do Milhão — a última há duas semanas, em Goiânia, em prova marcada pela emoção da presença do filho Fernando no alto do carro 111 da Full Time Sports.
A prova o recolocou na disputa pelo título, com 115 pontos, em quinto, a 50 do líder Daniel Serra. A tarefa de buscar o bi será difícil. Motivação, no entanto, é um combustível extra para o piloto de 46 anos.
Depois de vencer a Corrida do Milhão, como você vê a situação do campeonato? Foi uma das poucas provas em que o pelotão conseguiu tirar distância para o Daniel Serra.
É um campeonato muito disputado, e o Daniel, até aqui, fez uma diferença muito grande, junto com a equipe dele. Quando não ganharam, disputaram a vitória e chegaram nos pódios. Cabe a nós mudar isso. Temos de usar o momento em alta da última corrida para aproveitar o prazer de estar aqui de volta em Campo Grande.
Nos últimos anos, desde o seu título em 2014, apenas pilotos que ainda não haviam sido campeões ficaram com a taça. Agora, os cinco primeiros colocados são experientes e vencedores. Isso dificulta a briga pelo campeonato?
A Stock Car é muito competitiva, e não apenas por um detalhe ou por outro. São milésimos que fazem a diferença em um treino de classificação, e aqui largar na frente é sempre fundamental. A competição é árdua por ter caras experientes na frente, mas não só pelos que estão na ponta. A Stock tem muita gente competitiva em todo o grid. Temos de olhar um pouquinho para todos, e não só para os cinco primeiros.
Como você avalia a vitória em Goiânia? Já dividiu o prêmio da prova (com a equipe e com o Instituto Família Barrichello)?
Tenho muita coisa para destinar. Grande parte vai para o instituto, que como todo mundo no Brasil passa por dificuldades. Temos o apoio de muita gente, mas não é fácil ajudar o pessoal. A prova foi maravilhosa. Eu contei um pouco já da história, de que no dia acordei me sentindo vencedor. O que eu mais queria, mesmo, era levar meu filho (Fernando, 13 anos) no teto do carro, e esse foi meu foco a corrida inteira. Quando o Mau Mau (Maurício Ferreira, chefe de equipe de Barrichello) disse que a gente precisaria arriscar para brigar pela vitória, respondi que "arriscar é meu nome do meio". E deu certo.
A vitória em Goiânia foi em uma pista de alta velocidade, e logo na sequência teremos, depois de Campo Grande, Cascavel, Velo Cittá e Tarumã, também pistas rápidas. Isso indica um bom momento para a sequência?
O carro tem se comportado muito bem neste ano. Fizemos duas poles, larguei em segundo em Goiânia. Estamos batendo na porta dos mais rápidos, a combinação está muito boa. Vou para as provas muito confiante. Estou num momento positivo e tenho de aproveitar.
Você está no seu sexto ano de Stock Car, e nas últimas temporadas a categoria tem sido elogiada e prestigiada por pilotos de nível mundial, como Felipe Massa e Antônio Felix da Costa, convidados no Milhão, e Lucas Di Grassi e Nelsinho Piquet, que disputam a temporada toda e estão na Fórmula-E. Muita gente credita à sua presença essa evolução da Stock. De que maneira você vê a categoria?
A busca da Stock Car é fazer com que o público tenha uma integração muito grande com pilotos, carros e com a própria Stock. Ela é maravilhosa para mim, não só por me permitir fazer aquilo que amo, guiando um carro em que me adaptei muito bem, mas pela hora da visitação. É quando consigo agradecer o meu público por todo o carinho dos 19 anos de Fórmula-1. A hora em que saio para o torcedor, é um calor humano muito grande, e essa integração tem sido essencial. A categoria, em si, trabalha nas modificações na tentativa de melhorar. Muda a pastilha de freio, a borboleta do motor, sempre na tentativa de perfeição. E vem em uma melhora. Fico muito feliz de ter ajudado. Não tenha dúvidas de que tem muita molecada vendo as possibilidades pela presença de nomes fortes. O essencial, porém, é que estou aqui porque amo correr.
Falando um pouco sobre Fórmula-1, por que você acha que o Brasil chegou à situação de não ter nenhum piloto na categoria neste ano?
Acho que o fato de não termos brasileiros na F-1 é porque temos aquele jeito de não levar a sério os perigos e vamos empurrando. Na Europa, o que mais tem é apoio da base, como a McLaren fez na carreira do Lewis Hamilton e o governo espanhol com o Fernando Alonso. Cabe a nós abrirmos os olhos, pois passamos por uma situação política e financeira muito difícil. Mas é preciso de apoio. Nomes não faltam: o que brasileiro mais sabe fazer é jogar bola e guiar carro de corrida. Talento não falta, no kart é possível achar pilotos e abraçar um projeto até a F-1. Mas precisamos fazer isso não de uma maneira individual, e sim coletiva. Se não tivermos cuidado, os reflexos serão péssimos.
E o Fernando Alonso? Por que você acredita que um piloto ainda considerado um dos melhores do grid decidiu deixar a Fórmula-1 no ano que vem?
É muito difícil fazer um comentário sobre o Alonso, porque a gente desconhece o que ele passa. Alonso é um dos melhores que se tem hoje em dia, indiscutivelmente. Mas sinto que o corpo físico está desgastado, e até a parte mental, por não estar vencendo corridas. Temos que ver o que comove ele. Quando eu estava na F-1, sabia que meu carro não tinha condições de estar na frente, mas andava sempre no limite dele. Trabalho com esse tipo de situação, para que isso me satisfaça. Os motivos do Alonso ainda são desconhecidos. Mas, com certeza, ele vai levar qualidade e mídia para a Indy.
*O repórter viajou a convite da Stock Car