Uma série de novas práticas e estratégias de avaliação educacional está sendo incorporada em escolas gaúchas, com projetos de implantação do conceito Data Wise. Criada por pesquisadores da Escola de Educação da Universidade de Harvard (EUA), essa metodologia prega a educação baseada em evidências.
O Data Wise estabelece um passo a passo para redes de ensino e educadores desenvolverem pesquisas colaborativas, aprendizagem ativa e diversas fontes de dados para aperfeiçoar o ensino e os resultados dos alunos em sala de aula. O projeto foi criado em 1996 para ajudar instituições de ensino a usarem os dados de forma mais inteligente e com equidade.
Em Encantado, no Vale do Taquari, cinco escolas públicas passaram por um processo de formação para implementar a metodologia. Coordenadores e professores participaram das atividades, realizadas nas escolas de Ensino Fundamental (Emef) Mundo Encantado, Centro Municipal de Educação Encantado, Porto Quinze, Erico Verissimo e Batista Castoldi.
Foram quase dois anos de trabalho nas escolas. A formação buscou mostrar aos educadores as ferramentas do Data Wise, demonstrar o enfoque em evidências ao analisar fontes de dados e construir um plano de ação para a integração do processo nas práticas cotidianas das escolas.
Como resultado, Encantado ficou em terceiro lugar entre os municípios com mais de 20 mil habitantes nas provas do provas do Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar do Rio Grande do Sul (Saers) referente a 2022.
— No Brasil, temos muitas avaliações externas nas escolas, como Saers, Enem, Saeb (Sistema de Avaliação da Educação Básica). Com isso, são gerados milhares de relatórios, e esses dados caem no colo de professores e coordenadores para que eles resolvam os problemas que aparecem ali. Muitas vezes, esses relatórios nem são lidos, ou são usados somente para apresentações internas — explica Rafael Korman, coordenador pedagógico-administrativo do Colégio Israelita Brasileiro.
Metodologia baseada em evidências
Para o especialista, que é o primeiro educador certificado na América Latina no projeto Data Wise, o problema é que esse grande volume de dados acaba sendo mais utilizado para apontar problemas e culpados do que para criar soluções. A proposta da metodologia criada nos EUA é justamente resolver isso, fomentando uma cultura colaborativa de avaliação que realmente possa transformar as práticas nas escolas e alavancar o ensino.
Na prática, o Data Wise consiste na condução de um projeto dividido em oito etapas:
- organizar-se para o trabalho colaborativo
- construir letramento em avaliação
- criar um panorama de dados
- mergulhar nos dados dos estudantes
- examinar o ensino
- desenvolver um plano de ação
- planejar a avaliação do progresso
- agir e avaliar
A metodologia também busca introduzir nas escolas a mentalidade Ação, Colaboração e Evidências (ACE) em cada processo. Em outras palavras, trata-se de uma mudança de cultura que envolve o comprometimento coletivo para garantir avanços no processo de aprendizagem.
Segundo Korman, o problema não são as avaliações escolares que temos, mas sim a forma como os educadores lidam com elas.
— Na nossa realidade brasileira, geralmente, o professor dá aula e vai embora. As redes de ensino estão estruturadas de forma que a carga horária do professor fica concentrada nisso, e coletar dados e analisá-los pode soar como um trabalho extra, algo à parte — completa.
Ou seja, normalmente, não existe a possibilidade de se formar equipes voltadas para pensar em dados e soluções, uma vez que os professores já ficam sobrecarregados com as demais atividades.
Iniciativa chega a Porto Alegre
Nesta segunda-feira, 18, o tema foi abordado em uma palestra no Instituto Caldeira, em Porto Alegre. A norte-americana Kathryn Parker Boudett foi convidada para falar sobre o assunto. Ela é professora sênior e fundadora do Data Wise Project na Escola de Educação da Universidade de Harvard (EUA).
A pesquisadora também é autora do livro Data Wise: Guia para o Uso de Evidências na Educação (2005). Na ocasião, ela explicou sobre o conceito para empreendedores e estudantes, ao lado de Rafael Korman, que conduz o projeto junto aos especialistas de Harvard.
— Nos Estados Unidos, é comum que os professores nem queiram olhar as provas após a avaliação. É importante formar um time de educadores voltados para a gestão dessas informações. Não adianta ter um grande volume de dados organizados em planilhas e tecnologias avançadas, se não houver ninguém interessado em gerir esses dados. Eles vão ficar lá abandonados — argumenta Kathryn.
Também foi realizada uma oficina com 80 professores de escolas de Porto Alegre. O workshop aconteceu na segunda-feira, no Campus DC, com o objetivo de trazer o conceito para a rede pública da Capital. As atividades foram parte da Semana Caldeira, que está promovendo uma série de debates sobre educação, governo, inovação, inteligência artificial e dados.
Em Porto Alegre, o projeto foi tema, em fevereiro deste ano, de oficina com especialistas na Jornada Pedagógica para professores da rede municipal, que alcançou cerca de 3,1 mil participantes.
Projeto em São Paulo
Na capital paulista, Rafael Korman liderou um projeto de implementação da metodologia em 20 escolas técnicas (ETECs). O programa foi fruto de uma parceria entre o Me Salva! e Centro Paula Souza (CPS), de São Paulo (SP). Foram seis meses de formação, com um total de 70 participantes, entre coordenadores e professores.