Em uma casa no bairro Três Figueiras, em Porto Alegre, cheia de cores e mobiliada com os mais diversos itens geeks para garantir uma atmosfera criativa, crianças de sete a 14 anos se dedicam a dar os primeiros passos na programação. Apesar de ser motivo de preocupação dos pais devido à febre que impulsiona seu uso, o game Roblox é utilizado em estabelecimentos de ensino para auxiliar os jovens nessa caminhada, aproveitando o potencial positivo da plataforma de jogos.
— Aprendo a resolver muitas coisas que têm no dia a dia. Facilita a aprendizagem. Eu acho algo muito bom, que é um estudo completo — afirma Mateus Issa, 10 anos, um dos alunos de Roblox Studio na Código Kid Porto Alegre.
A escola oferece cursos de programação, robótica e desenvolvimento de games, com foco na criação. Para Eduardo Magalhães, gestor da Código Kid Porto Alegre, o Roblox se diferencia de outros jogos por ser uma plataforma de mundo aberto. Ele aponta duas características essenciais para o seu sucesso: a primeira é o fato de ser uma espaço social — um ambiente onde as crianças se encontram e interagem, ainda que seja uma interação social incompleta, já que é de natureza digital. O gestor cita a vantagem da troca entre diferentes culturas, com crianças de outras partes do mundo.
A segunda, que nem todos conhecem, é precisamente o Roblox Studio — o aplicativo da mesma empresa que permite criar mundos dentro do Roblox. No curso, os alunos aprendem a construir estruturas e jogos para a plataforma, utilizando montagem tridimensional e linguagem de programação.
— O aluno pode criar mundos já com as funcionalidades que tem no Roblox, com objetos prontos, personagens, assim como, de repente, ele quer algo mais, e pode programar no Roblox para conseguir esse algo mais — explica Magalhães.
Dado que uma parte central da plataforma é promover a produção de módulos independentes, os jogos, uma linguagem de modificação simplificada permite que isso seja possível, conforme Lucas Goulart, pós-doutorando em Comunicação pela Universidade Paulista (Unip) e especialista em games:
— Acho que usar Roblox como introdução a poder pensar a programação e a modificação de jogos é algo interessante, nesse sentido de que existe uma facilitação e uma quantidade bastante grande de pessoas que jogam e vão saber fazer, e outros vão procurar como fazer. Ele tem essa “questão comunitária”.
Potencial criativo
A aula de Roblox Studio é gamificada: o aluno percorre um desafio e recebe uma pontuação. Para aprender e executar os ensinamentos, os jovens mobilizam conhecimentos de matemática, física, inglês e interpretação de textos.
— É uma maneira do aluno fazer alguma coisa, usando características e ensinos dessas disciplinas que a gente vê na escola e que, às vezes, parece que estão desligadas entre si, distanciadas. Tem uma aplicação prática — destaca Magalhães.
O aluno participa de todas as etapas de construção de algo, enfrentando e resolvendo problemas, e recorrendo, caso necessário, à internet e a amigos e colegas. O trabalho também pode ser desenvolvido em equipe. Depois, pode-se publicar e jogar o game.
Na visão de Magalhães, a grande “sacada” é justamente ver o Roblox como uma possibilidade de criação, e não apenas de jogo.
— Esse é o estímulo que talvez os pais tenham que entender: como meu filho pode baixar esse programa, que é o Roblox Studio, é gratuito, assim como o Roblox, e permitir às crianças desfrutar da criação. Essa é a hora que a gente tem de aproveitar para fazer eles criarem essas interligações e fazerem aflorar esse potencial criativo — ressalta.
O gestor e o especialista em games também veem potencial para a criação de mundos educacionais no jogo — com museus e passeios, por exemplo —, algo ainda pouco explorado.
— Eu acho que as escolas têm como utilizar isso para começar a criar coisas, criar mundos interessantes. Claro que isso não pode ser mais uma carga em cima do professor — pondera Magalhães.
A plataforma também traz certa segurança por permitir que a criança cometa um erro sem que isso cause uma consequência ruim, como destaca:
— É um ambiente muito motivacional, dá segurança para as crianças criarem, não vai ter ninguém ficando brabo porque não deu certo e tudo o mais. A criança sai com autoestima, porque ela aprendeu o conceito do erro, da tentativa, de dar certo, e aprende com isso e acaba desenvolvendo o jogo.