O Ministério Público Estadual (MP) ajuizou, por meio da Promotoria de Justiça Regional de Educação de Osório, uma ação civil pública contra o município de Capão da Canoa e o Estado do Rio Grande do Sul devido à falta de vagas em escolas. O objetivo é obter decisão judicial para garantir o direito de acesso à educação para crianças e adolescentes nas modalidades pré-escola (quatro e cinco anos) e Ensino Fundamental.
Segundo Cristiane Della Méa Corrales, promotora de Justiça da Promotoria Regional de Educação de Osório, o MP aguarda o prazo de cumprimento da liminar, deferida pelo Juiz da 3ª Vara Cível da Comarca de Capão da Canoa, que determinou que o Estado e o Município providenciem vagas em quantidade suficiente para a demanda da lista de espera. Na data do ajuizamento da ação, no dia 10 de março, existiam 230 crianças aguardando por vagas na pré-escola e 702 esperando para acessar ao Ensino Fundamental, do primeiro ao nono ano.
A promotora também informou que o MP acompanha e fiscaliza a falta de vagas na etapa creche (zero a três anos) em outros municípios do Litoral Norte , como Torres, Tramandaí, Santo Antônio da Patrulha e Cidreira.
Com relação a Torres, ainda estão sendo verificadas as ações possíveis de serem desenvolvidas, diante do planejamento que vem sendo apresentado pelo Executivo local para atender a demanda. Com Tramandaí e Santo Antônio da Patrulha, foram firmados Termos de Ajustamento de Conduta (TAC), em 2019, visando atender a demanda de crianças, progressivamente, sendo que os dois municípios, segundo a manifestação do MP, vêm demonstrando estarem cumprindo com as cláusulas dos TACs.
Já com relação a Cidreira, também tramita uma ação civil pública, postulando decisão judicial para o atendimento de crianças na etapa dos zero a três anos de idade, que não têm vaga garantida. No momento do ajuizamento da ação, existiam no município 285 crianças fora da escola, em razão da falta de vagas. Segundo o Ministério Público, o município não demonstrou o cumprimento da liminar que determinou a apresentação de projeto, no prazo de 20 dias. O órgão informou, ainda, que protocolou novo pedido, com intimação do município para comprovar o cumprimento da liminar e requerendo a aplicação de multa diária pelo descumprimento da decisão. A reportagem procurou a assessoria de comunicação do município, mas até a publicação desta reportagem não obteve resposta.
"Vamos tentar dar conta dessa demanda", diz secretária de Educação de Capão da Canoa
A Secretaria de Educação de Capão da Canoa, atribui o problema da falta de vagas ao aumento da população na cidade, especialmente por conta da pandemia. Sônia Bardini, chefe da pasta municipal, diz que mais pessoas estão chegando para fixar residência, o que exige maior infraestrutura.
— O número da população fixa cresceu muito, principalmente após a pandemia. Migrou muita gente para cá. Recebemos moradores da Serra, Alvorada, Gravataí, entre outros lugares, e essa demanda precisa de toda uma estrutura. Ampliações em escolas já não são suficiente. Precisamos construir novas — afirma a secretária.
De acordo com Sônia, no início do ano letivo faltavam 840 vagas na Educação Infantil da rede pública municipal de Capão da Canoa, número que caiu para 147 nesta terça-feira (28), quando foi feita a atualização mais recente. Para o Ensino Fundamental, faltavam 1.619 vagas — hoje são 525 crianças e adolescentes aguardando. Para conseguir espaço para alguns, a prefeitura fez ampliações em escolas e conseguiu vagas conveniadas em instituições particulares. O número atual de alunos na fila de espera da rede municipal, considerando Educação Infantil e Ensino Fundamental, é de 672.
Pai de duas crianças, um homem, que se mudou para Capão da Canoa no início deste ano e prefere não ser identificado, informou que os filhos estão em casa, sem estudar, pois a família foi avisada que não havia vagas nas escolas. Na tarde de segunda-feira (27), um grupo de mães realizou uma manifestação em frente à prefeitura da cidade e, segundo a secretária, foram devidamente ouvidas.
— Vamos tentar dar conta dessa demanda. Precisamos dar um jeito de colocar essas crianças em escolas até o final do mês de março. Vamos tentar desativar um laboratório em uma escola e colocar uma turma de 3º do Fundamental, e assim conseguiremos encaixar 25 alunos. Há outra escola onde vamos abrir uma turma de 1º ano do Fundamental e colocar outros 25 anos. Essa é a logística que estamos fazendo hoje para tentar baixar o número da fila de espera até o dia 31 de março. Outro problema é que estamos chamando professores e muitos estão recusando. São entraves que acontecem — diz Sônia.
No caso de não existir vagas para todos dentro do prazo estimado, a secretária diz que novas turmas serão abertas posteriormente.
— Vai acontecer o que acontece todos os anos. As crianças, às vezes, entram tardiamente e o ano letivo para a turma começa e acaba mais tarde. Mas o município está fazendo o possível — reforça.
O Conselho Tutelar de Capão da Canoa informou que desde o ano passado está ciente do problema de escassez de vagas em escolas do município e que chegou a fazer um mutirão para colher informações e dados de famílias. Segundo o órgão, quando há falta de vagas, os conselheiros fazem requisições das matrículas e direcionam à Secretaria Municipal de Educação. Como a pasta informa que não há vagas, o Conselho entende que a solicitação está sendo descumprida. Assim, foi feito representação judicial ao Ministério Público. Paralelo a isso, também existe um encaminhamento à Defensoria Pública, que ingressa com ação judicial para oferta das vagas.
"A falta de vaga em escola é considerada violência institucional. A Secretaria de Educação pontua que estão trabalhando no sentido de zerar a lista de espera. Nós, conselheiros, estamos requisitando o direito à educação", diz o Conselho Tutelar de Capão da Canoa em nota.
Tramandaí e Torres
Em Tramandaí, aproximadamente 120 crianças esperavam por vagas no início do ano letivo, principalmente para o Ensino Fundamental, de acordo com a secretária de Educação, Alvanira Gamba. Foram abertas turmas em algumas escolas que tinham logística para esse atendimento. Nesta terça-feira (28), a fila tinha diminuído para 33.
Na avaliação de Alvanira, o problema da falta de vagas não é somente resultado do aumento populacional no Litoral Norte, mas também de certa falta de organização das famílias.
— Isso se deve ao aumento populacional e à falta de planejamento das famílias que vieram para Tramandaí e deixaram para procurar vagas no início do ano letivo, sendo que em novembro planejamos e organizamos as vagas para o ano seguinte. Além de tudo, os pais não atendem o telefone, o que dificulta ainda mais — diz.
Além do mais, diz a secretária, muitas famílias querem vaga para uma escola específica, e não aceitam as opções disponíveis.
— Os pais têm que matricular onde tem vaga — orienta.
Em Torres, a situação é um pouco diferente. A falta de vagas está concentrada na faixa etária dos zero aos três anos e não há problemas no Ensino Fundamental. Segundo a prefeitura, atualmente, há 248 crianças na lista de espera para a Educação Infantil, mais precisamente para a faixa etária entre zero e três anos. "A partir dos quatro anos (Pré 1) e cinco anos (Pré 2), mais o Ensino Fundamental, não há lista de espera." Para resolver a situação, o município disse que "estão sendo monitoradas as vagas e, assim que possível, realocadas quando abrem oportunidades".
Na comparação entre o Censo Demográfico de 2010 e a prévia do de 2022, muitos municípios do Litoral Norte ficaram entre os 15 com maior aumento populacional no Estado. Imbé teve o segundo maior ganho, atrás apenas de Araricá, e passou de 17,6 mil para 27 mil habitantes. Capão da Canoa ficou em quarto lugar, pulando de 42 mil para 62 mil. Em seguida vem Arroio do Sal, que saltou de 7,7 mil para 10,1 mil. Também constam na lista as cidades de Balneário Pinhal, Cidreira e Xangri-lá.
O que diz a Seduc
A Secretaria Estadual da Educação (Seduc) confirma que o problema da falta de vagas se deve ao aumento populacional na região, e emitiu uma nota informando que, por meio da 11ª Coordenadoria Regional de Educação (CRE), está trabalhando de forma conjunta com as redes municipais do Litoral para atender às solicitações do Ensino Fundamental e do Ensino Médio.
Também informou que desde 2021 tem aumentado o número de vagas, ampliando as ofertas em 22% até 2022. "A Seduc reitera que todos os alunos serão devidamente atendidos e matriculados conforme a disponibilidade das redes municipais e estadual", diz a pasta.