A Secretaria Municipal da Educação (Smed) pretende finalizar até 15 de outubro um plano para a reformulação dos currículos escolares do Ensino Fundamental da rede municipal de Porto Alegre. A intenção da prefeitura, ventilada desde julho, é excluir a disciplina de Filosofia dos currículos e aumentar a carga-horária de Português e Matemática do primeiro ao nono ano. Além disso, a alteração curricular estabelece oferta obrigatória de Ensino Religioso e segundo professores que analisaram a proposta, diminui os períodos de História e Geografia.
O tema tem sido alvo de resistência dos docentes da rede. Os professores criticam não somente a proposta da secretaria, mas o formato da discussão. O plano original foi apresentado em 23 de julho, mas a prefeitura corre contra o tempo para expor as modificações curriculares e aplicar um formulário entre os dias 4 e 15 de outubro, onde os docentes de todas as 98 escolas municipais deverão votar em qual cenário será mais adequado.
As mudanças da grade curricular, que valerão a partir de 2022, estão sendo apresentadas a professores e escolas em encontros regionais e segundo a Smed, contam com a avaliação dos docentes. As alterações, porém, estão gerando discordâncias entre entidades de professores, tal como a Associação dos Trabalhadores em Educação no Município (Atempa) Professores de Porto Alegre e o Sindicato dos Municipários de Porto Alegre (Simpa).
– A proposta da Secretaria da Educação é não incluir mais a disciplina de Filosofia. O que interessa nessa gestão é que os alunos aprendam a escrever e fazer continha, não a pensar — diz a professor e diretora de comunicação do Simpa, Cindi Regina Sandri.
Conforme o plano da Secretaria da Educação, o Ensino Religioso passa a constituir como uma área de conhecimento, segundo a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), tornando-se obrigatória. Atualmente, as escolas são obrigadas a oferecer a disciplina, mas os alunos podem ou não cursá-la, já essa é uma garantia constitucional no Rio Grande do Sul. A Smed nega que haveria uma redução da carga-horária de História e Geografia.
A pasta da Educação apresentou dois cenários que trazem pequenas mudanças entre si em termos de oferta de disciplinas e carga-horária, mas ambos excluem a Filosofia. A disciplina é ministrada desde os anos 1990 na Capital e a Base Nacional Comum Curricular não determina que ela deva ser excluída dos currículos escolares. Ao contrário, as trajetórias escolares das redes municipais devem ser mantidas, o que é confirmado em resolução do Conselho Municipal de Educação de Porto Alegre, editada em 2018.
Conforme a legislação municipal, após a votação dessas mudanças curriculares, o Conselho Municipal de Educação da Capital deverá apreciar as modificações.
— No entanto, já poderíamos ter sido chamados para realizar essa discussão. Além disso, essa votação deveria ser feita através de um congresso municipal de educação, e não por um formulário, tal como a Smed propõe — ressalta a presidente do Conselho Municipal de Educação, Fabiane Pavani.
Já a secretária da Educação, Janaína Audino, acredita que os currículos precisam ser modernizados e adequados não somente à Base Nacional Curricular, mas também a uma perspectiva de buscar a melhoria do rendimento dos alunos em leitura, escrita e realização de operações matemáticas.
— Hoje temos somente 27 professores de Filosofia e nem todos estão em sala de aula. Então, é uma discussão muito mais ideológica do que de fato uma intenção de garantir a Filosofia em sala de aula. E como pretendemos trabalhar com projetos, vamos poder trabalhar a criatividade dos alunos, a resolução de problemas num espaço filosófico que vai além do componente curricular — ressalta Audino.
A prefeitura garante que a retirada da disciplina da grade curricular será suprida por projetos. No entanto, os professores alegam que não há garantia de que haverá docentes e infraestrutura para a realização de projetos em diversas áreas do conhecimento, tal como música, dança, hortas comunitárias, robótica ou outras áreas da tecnologia. Além disso, estima-se que a proposição abre espaço para a iniciativa privada realizar esses projetos nas escolas, fragilizando a autonomia das escolas e dos professores. A prefeitura nega a possibilidade.
Professor da Escola Municipal Nossa Senhora do Carmo, André Pares defende que as mudanças podem ocorrer, mas os processos de discussão são fundamentais.
— Ninguém é contrário à realização de mudanças, inclusive a lei municipal indica a realização de congresso para debater as mudanças. Agora, o que achamos muito estranho é: por que o processo está tramitando dessa maneira, sem a devida discussão? Dessa forma, é claro que levanta suspeitas sobre as intenções da prefeitura. Além disso, é fundamental dizer que as pessoas que decidem viver e se dedicar ao esclarecimento e à criação de condições de autonomia enfrentam esse olhar de alguns grupos: são vistas como perigosas.
Mudanças no Ensino Médio
A gestão municipal também vai colocar em operação um calendário para acabar com a oferta de vagas no Ensino Médio até 2023. Ao todo, são 6 mil alunos, incluindo os estudantes do Ensino de Jovens e Adultos (EJA). A Secretaria da Educação alega que é obrigação do Estado, e não do município, prover esses estudantes.
Os estudantes que estão matriculados na rede municipal terão garantida a oferta de matrícula, segundo cronograma que vai até 2023.
Já para os estudantes que estão matriculados, frequentando os cursos técnicos e que desejam seguir seus estudos nas escolas da rede municipal de ensino, será garantida a oferta de matrícula, segundo um cronograma que termina em 2022.
O ingresso de alunos novos, visando ao primeiro ano do Ensino Médio, contudo, ficará limitado apenas a vagas para o Curso de Magistério (Formação de Professores). Todos os demais deverão procurar a rede estadual.