O ano letivo seria encerrado nesta quinta-feira (19) no Estado. Deveria. Há 30 dias, a greve do magistério mantém paralisadas por completo ou parcialmente as atividades em 1.535 das 2.500 escolas estaduais, segundo o Cpers-Sindicato. Destas, 247 são em Porto Alegre.
A solução para o fim do impasse parece longe de se definir. O pacote de medidas proposto pelo governo de Eduardo Leite, que motivou a paralisação por propor alterações no plano de carreira da categoria, começou a ser votado nesta quarta-feira (18). A proposta do novo Estatuto do Magistério, porém, só deve ser apreciada pela Assembleia no fim de janeiro.
Até lá, a categoria promete manter-se mobilizada. De um lado, professores lutam por seus direitos. Do outro, porém, estudantes esperam pelo encerramento da paralisação para concluírem o atual ano letivo.
Mesmo com a formatura marcada para o próximo dia 21 e aguardando a nota no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), o estudante do 3º ano no Ensino Médio do Colégio Estadual Protásio Alves Thiago Ferraz Severo, 18 anos, ainda não sabe as notas do último trimestre em filosofia, sociologia e geografia. As três disciplinas estão pendentes porque os docentes aderiram à greve. Na lista dos aprovados e reprovados, afixada numa das paredes da instituição, o asterisco indica "resultado parcial — falta (sic) filosofia, geografia e sociologia".
Morador do bairro Alto Petrópolis, Thiago depende da liberação do boletim para dar encaminhamento à inscrição na universidade, caso venha a obter uma vaga no próximo ano. A única certeza é de que fará parte da formatura mesmo não sabendo se foi aprovado em todas as disciplinas.
— Apoio a luta dos professores. Porém, ao mesmo tempo, vivo dias de ansiedade por conta da questão burocrática. Acho importante a paralisação, porque eles têm direitos, mas penso também no prejuízo que isso tudo poderá acarretar se o governo não se movimentar. Até agora, não sei como será finalizado o meu Ensino Médio — desabafa o jovem.
O movimento de greve teve início em 18 de novembro, como resposta à intenção do Piratini de alterar o plano de carreira da categoria. De acordo com o levantamento mais recente do Cpers-Sindicato, feito em 16 de dezembro, o número de escolas com as atividades totalmente paralisadas chegava a 744, enquanto 791 estariam afetadas parcialmente. Já a Secretaria Estadual da Educação (Seduc) rebate, afirmando serem cerca de 350 escolas com as portas fechadas, enquanto outras 650 estariam funcionando parcialmente.
A Seduc tem informado às Coordenadorias Regionais de Educação que se deve garantir o cumprimento dos 200 dias letivos e das 800 horas/aula para o Ensino Fundamental e 1 mil horas para o Ensino Médio. Nas instituições que aderiram à mobilização, os sábados poderão ser utilizados como letivos para a reposição dos dias não cumpridos.
A Secretaria alerta que cada Coordenadoria Regional de Educação deve ter o controle de reposição das escolas sob a sua abrangência e também orienta que as instituições de ensino liberem atestados aos formandos que ingressarão nas universidades. Mas os alunos que precisarem de atestado devem procurar diretamente as escolas para a emissão do documento. No caso de a escola estar fechada, a indicação é que procure a respectiva coordenadoria.
Em entrevista à Rádio Gaúcha, na quinta-feira passada (12), o titular da Educação estadual, Faisal Karam, destacou que as aulas irão até janeiro, podendo se estender até fevereiro. Ele ressaltou que, em casos extremos, as aulas poderão recomeçar até em abril de 2020, pois os professores entram em férias depois do último dia de aula. Ainda assim, o secretário destaca que as escolas sem adesão à greve encerrarão as atividades em 19 de dezembro, reiniciando os trabalhos em 19 de fevereiro.
Rotina familiar alterada
Desde o início da paralisação, Anthonny da Silva, oito anos, perguntava à mãe, a cuidadora de idosos Patrícia Macedo da Silva, 35 anos, quando voltaria à aula na turma do 1º ano da Escola Estadual de Ensino Fundamental Carmen Alice Laviaguerre, no bairro Cohab, em Guaíba. Apaixonado pela instituição, o menino ainda engatinhava na leitura das primeiras palavras quando as aulas pararam. Esta é a maior preocupação da mãe, que tentou manter uma rotina de estudos para que Anthonny não esquecesse o que já havia aprendido em sala de aula. Nesta quarta-feira, a criança voltou à escola. No lugar do turno integral, porém, Anthonny não terá atividade entre meio-dia e 13h, e a família precisa buscá-lo neste horário.
Para manter as mães informadas sobre o andamento da greve, a professora da turma de Anthonny criou um grupo no WhatsApp. Por insistência do filho, Patrícia é quem mais perguntou sobre o fim da paralisação. Outro problema enfrentado por ela é com as horas vagas do menino. Como ele estudava em turno integral, das 8h até 17h, a mãe tinha disponibilidade para trabalhar. Com o menino em casa, Patrícia precisou reduzir as horas de trabalho para não deixar Anthonny sozinho. Os outros três filhos mais velhos estão em aula com horário reduzido em outra escola estadual do bairro.
Mobilização continua
Na terça-feira passada (17), milhares de professores e funcionários de escolas de praticamente todo o Estado realizaram três marchas pela Capital, rumo à Praça da Matriz. No local, o Cpers-Sindicato reiterou a rejeição à nova proposta do governo do Estado de alteração do plano de carreira, garantindo a continuidade da paralisação.
Conforme a entidade, o principal problema identificado pela categoria não foi corrigido: os futuros reajustes serão descontados da parcela autônoma, formada por valores já destinados aos professores. Uma nova assembleia está marcada para esta sexta-feira (20), às 13h30min, no Ginásio Municipal Celso Morbach, em São Leopoldo, para definir os rumos da greve.
A proposta inicial de tabela salarial para os professores indicava que um docente com doutorado poderia ganhar R$ 3,8 mil como valor final, no próximo ano. Pela nova proposta, o valor chega a R$ 4,7 mil em 2020, e R$ 5,3 mil em 2022. Ela também aumenta os salários de todos os níveis, garantindo reajustes até 2022, mas amplia as contribuições previdenciárias dos servidores e acaba com as vantagens temporais e avanços de carreira, como triênios e quinquênios. Se o plano do governo for aprovado, em janeiro, os valores referentes a esses benefícios serão transformados em uma parcela autônoma, desvinculada dos salários. Desta forma, o governo argumenta que poderá pagar o piso da categoria e conceder reajustes que tenham maior impacto sobre os ativos do que sobre os inativos.
Indefinição em todas as disciplinas
Em Canoas, a estudante do 3º ano do Ensino Médio na E.E.E.M Érico Veríssimo, Milena Valli, 17 anos, ainda não sabe quando serão realizadas as provas finais das 14 disciplinas. Ela fez Enem e pretende cursar uma faculdade na área da saúde. Desistiu de se tornar professora por conta do que considera desvalorização da profissão.
Milena fez questão de escrever nas redes sociais que apoia a greve atual. Em post no Facebook com dezenas de compartilhamentos, a jovem ressaltou que mais do que a greve, a falta de infraestrutura nas instituições estaduais é o que prejudica o estudo.
— A greve não prejudica os alunos. Ela mostra que, apesar de tudo, os professores têm força pra lutar, ainda acreditam na profissão deles e na educação. Admiro muito todos os professores da minha escola e apoio, principalmente, a luta de todos para terem os direitos que merecem. Eles eu posso chamar de guerreiros, com orgulho. Entro as minhas férias estudando, mas sabendo que o salário do meu professor será depositado em dia — destaca.
Saiba mais
- As Coordenadorias Regionais de Educação deverão garantir o cumprimento dos 200 dias letivos e das 800 horas/aula para o Ensino Fundamental e mil horas para o Ensino Médio.
- Nas instituições que aderiram à mobilização, os sábados poderão ser utilizados como letivos para a reposição dos dias não cumpridos.
- As instituições de ensino deverão liberar atestados aos formandos que ingressarão nas universidades.
- Alunos que precisarem de atestado devem procurar diretamente as escolas para a emissão do documento. No caso de a escola estar fechada, a indicação é que procure a respectiva Coordenadoria Regional de Educação.
- Conforme o secretário estadual de Educação, as aulas irão até janeiro, podendo se estender até fevereiro.
- Em casos extremos, poderão recomeçar até abril, já que os professores precisam, obrigatoriamente, tirar férias após o fim do ano letivo.
Fonte: Secretaria Estadual de Educação