Esclarecimento: o MEC informou, após a publicação deste texto, que a contratação de professores e funcionários de universidades e faculdades federais que aderirem ao Future-se também poderá ser feita "por meio de processo seletivo". O ministro da Educação, Abraham Weintraub, havia declarado que a contratação seria, "como norma", via CLT e "não mais via concurso público".
Universidades e faculdades federais que aderirem ao programa Future-se, do Ministério da Educação (MEC), terão que passar a contratar professores e servidores pelo regime CLT, com carteira de trabalho assinada, e não mais via concurso público, disse o ministro Abraham Weintraub ao jornal Estadão. Ele ressaltou que a contratação por esta modalidade será atitude obrigatória para as instituições de ensino interessadas em aderir ao programa.
O Future-se é um projeto do MEC que, entre outras coisas, propõe às universidades que elas busquem verba junto à iniciativa privada, a fim de desonerar o governo federal. No programa, que tem adesão facultativa, os contratos de professores e técnicos-administrativos serão administrados por Organizações Sociais (OSs), empresas privadas sem fins lucrativos que recebem dinheiro do governo federal para oferecer serviços públicos. Parte da comunidade acadêmica do Rio Grande do Sul critica a proposta por temer o fim da autonomia universitária.
Ao Estadão, Weintraub afirmou que os funcionários contratados via CLT teriam estabilidade.
— Não seriam priorizadas (as vagas via CLT), seriam a norma. As faculdades e universidades que aderirem ao Future-se vão ter de passar a contratar via CLT e não mais via concurso público — disse o ministro.
Contudo, decisão de 2018 do Supremo Tribunal Federal definiu que empregados de empresas públicas e sociedades de economia mista regidos pela CLT não fazem jus à estabilidade prevista na Constituição.
Para Flavio Sirangelo, ex-presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região, explica que universidades públicas, sejam elas autárquicas ou fundacionais, precisam realizar concurso público para admitir novos servidores e professores.
— A Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), por exemplo, é um órgão autárquico pertencente ao governo federal e, por isso, ela não pode contratar funcionários sem realizar concurso público. Mesmo no caso de instituições fundacionais, o regime estabelecido entre o servidor e a universidade pode ser regido pela CLT, mas a entrada deste funcionário na universidade precisa ser feita via concurso_ diz.
Claudia Abdul Ahad Securato , especialista em direito trabalhista, a lei 9637/98, que rege as OSs, prevê que elas podem contratar pessoas sem concurso público e sem seguir as leis de licitações, mas somente em casos específicos:
— Somente quando não há tempo hábil para a realização de um concurso e para a execução de serviços extraordinários. A questão é que o programa Future-se quer alterar a lei e permitir que vire regra o que ainda não está previsto. Contudo, para que essa mudança aconteça, o projeto precisa ainda ser votado no Congresso e no Senado.
Tanto Sirangelo, quanto Cláudia afirmam que servidores concursados têm sua estabilidade prevista na Constituição e que a medida não altera sua situação jurídica.
Reitores se posicionam
O reitor da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), Pedro Hallal, afirma que a instituição é contrária a admissão de servidores via CLT, porque isso implica instabilidade para o trabalhador e menos vínculo com a universidade.
— Do ponto de vista didático, perderíamos o compromisso com a pesquisa e a extensão, que são as maiores características das instituições públicas de ensino. Essa atitude significa a precarização das relações de trabalho. O objetivo por trás disso é o governo ter mais controle sobre os professores da universidade e flexibilidade para demiti-lo. Eles querem ter controle para não dialogarmos com nosso alunos livremente. O ministro (Abraham Weintraub) quer implantar um Estado policialesco — disse.
Paulo Burmann, reitor da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), endossa a afirmação de Hallal ao dizer que a sinalização feita pelo MEC "aponta para o desmonte da carreira e coloca em risco o modelo de ensino, pesquisa e extensão no país".
—Estamos vivendo um cenário de retrocesso e isso é reflexo de uma política de Estado minimo — pontua o reitor da UFSM.
A reitora da Universidade Federal do Rio Grande (FURG), Cleuza Dias, ressaltou que o Future-se ainda está em discussão, logo, "não há o que comentar". Porém, salientou que o programa não atende as características públicas e sociais das universidades:
— Continuamos na defesa da universidade pública, gratuita, de qualidade e socialmente referenciada. E na defesa da realização de concursos públicos e na gratuidade do ensino superior.
Para Lucia Pellanda, reitora da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA), as instituições de ensino já vêm colocando em prática diversas medidas para contenção de gastos e otimização de recursos. Ela ressalta, ainda, o fato de que os professores serem concursados é crucial para o desenvolvimento de pesquisas.
— Pesquisas levam anos para serem desenvolvidas. Temos aqui na UFCSPA diversos projetos de longo prazo que só são possíveis de serem realizados porque os docentes têm estabilidade, liberdade e autonomia para responder às demandas da sociedade — pontua Lucia.
A reportagem de GaúchaZH entrou em contato com a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), com a Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS) e com a Universidade Federal do Pampa (Unipampa), mas não obteve retorno até o fechamento da matéria.