O segundo semestre escolar começa após as férias de julho já trazendo uma preocupação para alguns pais: o filho foi mal na primeira parte do ano. Como fazer para recuperar o prejuízo e evitar a reprovação? GaúchaZH conversou com especialistas, e a notícia é boa: ainda há tempo suficiente para salvar o ano letivo.
O primeiro passo que os pais devem dar é buscar entender os motivos que levaram os filhos a não alcançar os objetivos na escola durante o primeiro semestre. A abordagem deve ser feita de forma conciliadora e não em tom de cobrança, aconselha a psicopedagoga e conselheira da Associação Brasileira de Psicopedagogia Fabiani Portella:
— Os pais precisam identificar o motivo. A partir de quando a criança ou o adolescente passou a ter dificuldades? Isso aconteceu a partir de agora? Houve um fato novo? Há falta de estudo?
A especialista em orientação educacional Ceusa Ferrazzo destaca que os pais não devem procurar culpados nem se sentir responsáveis pelas dificuldades dos filhos. A confiança deles será importante para os alunos buscarem a recuperação nos estudos.
— A primeira coisa que digo é que os pais precisam acreditar que irão conseguir. Não devem se decepcionar nem achar que tudo está perdido. Normalmente se procura um culpado, se foi a escola ou o aluno. Muitas vezes, essa questão é múltipla, tem várias situações. O primeiro ponto é fazer com que a criança confie que vai conseguir melhorar — destaca.
Ceusa costuma dar um conselho: avaliar se essa criança ou esse adolescente tem consciência de por que falhou.
— Tem de deixá-lo pensar junto com a gente, dando espaço para que ele pense, que se expresse. Não pode o adulto dizer quais foram as causas — completa a especialista.
Pais não devem interferir demais nos temas de casa
A participação dos professores nesse momento é fundamental. Fabiani Portella ressalta que os pais não podem cometer um erro comum: o de interferir de forma profunda nos temas de casa. A cobrança para que eles sejam feitos deve existir, mas é importante deixar que os filhos produzam o material.
— Essa observação do erro ajuda o professor a ver que o aluno tem uma dificuldade. É um erro que a gente considera positivo porque mostra que tem algo a melhorar — aponta a psicopedagoga.
Os motivos para problemas de aprendizagem são vários. Vão desde desatenção à diminuição no interesse do estudo, mas podem ir além, sendo causados por dificuldades emocionais ou cognitivas.
— A primeira tentativa é resolver na própria família. Não acontecendo isso, tem de se buscar entender se essa criança tem histórico de aprendizagem ou se há uma mudança — cita Fabiani.
Ceusa Ferrazzo acrescenta:
— Se eles (os alunos) estão passando por problemas, seja afetivo ou de aceitação no grupo, isso pode afetar. É preciso ajuda dos pais. É preciso aprender a ouvir os filhos, não criticar, não apenas cobrar. Se os pais fizerem isso e a situação não se resolver, devem procurar uma ajuda psicológica.
A influência do celular e das redes sociais
O telefone celular virou um vilão de pais e professores na tentativa de fazer com que crianças e adolescentes se concentrem nos estudos. Nisso, as redes sociais têm papel decisivo e podem gerar problemas mais profundos na aprendizagem, apontam as especialistas.
O smartphone tem tirado muito a atenção do estudo. Muitas crianças ficam ali e, quando notam, passaram horas sem fazer as tarefas. Isso tem sido um grave prejuízo.”
FABIANI PORTELLA
Psicopedagoga
— O aparelho tem tirado muito a atenção do estudo. Muitas crianças ficam ali e, quando notam, passaram horas sem fazer as tarefas. Isso tem sido um grave prejuízo — afirma a psicopedagoga Fabiani Portella.
A pedagoga e especialista em psicopedagogia Lúcia Fonseca afirma que não é correto os pais apelarem para a simples proibição do uso do aparelho. É necessário uma interferência, mas não pode ser de forma radical.
— O caminho é conversa e flexibilização. Os pais têm de saber o que o filho está fazendo, somente assim haverá parceria. No caso do adolescente, é mais delicado. Não tem como proibir totalmente, é contraproducente, com tudo o que se vive atualmente — alerta.
No caso das crianças, o controle pode ser maior. De qualquer forma, a proibição total do uso segue não sendo recomendada.
— Proibição hoje não ajuda mais. Todo mundo usa celular, os pais usam. Por que vai proibir os filhos de usar algo que os pais também usam? Seria incoerente — argumenta Lúcia Fonseca.
A especialista em orientação educacional Ceusa Ferrazzo aconselha os pais a fazerem trocas com os filhos em relação ao smartphone:
Proibição hoje não ajuda mais. Todo mundo usa celular. Por que vai proibir os filhos de usar algo que os pais também usam? Seria incoerente. O caminho é conversa e flexibilização. somente assim haverá parceria.”
LÚCIA FONSECA
Psicopedagoga
– É uma negociação. O pai precisa mostrar para o filho que ele poderá mexer no celular após fazer o trabalho escolar. Não é uma proibição, mas uma orientação de como e quando deve ser usado.
O estudo, por sua vez, não deve ser tratado como punição, nem o lazer pode ser colocado como algo oposto à escola. A palavra-chave é conciliação: estudo e diversão devem conviver em harmonia.
– Estudar é um dever do aluno, como é dos pais trabalharem para sustentar a família.
A responsabilidade do aluno é estudar, é fazer os trabalhos — completa Ceusa Ferrazzo.
O efeito colateral do “tribunal virtual”
Outro ponto a que os pais devem estar atentos no uso dos celulares é em relação à exposição nas redes sociais. Isso afeta crianças, mas, principalmente, os adolescentes. Um efeito colateral, segundo Fabiani Portella, é que, por medo de parecer não entender alguma questão abordada para os colegas, por exemplo, alunos deixam de tirar dúvidas em sala de aula. Seria a consequência do status de tribunal social que redes como Facebook e Instagram têm.
— O aluno fica com temor de que os colegas pensem que ele não é inteligente o suficiente para entender. É uma geração de crianças e adolescentes que têm pouca tolerância à dificuldade — comenta.
Prova dos nove: passos para ajudar seu filho
- Procurar compreender as causas (normalmente não há uma causa única).
- Reconhecer as emoções envolvidas (frustração, raiva, tristeza...).
- Reforçar o diálogo com a escola, buscando estratégias conjuntas.
- Rever e reorganizar estratégias de estudo. É importante ensinar o aluno a estudar.
- Evitar a culpabilização, tanto do filho, quanto da família ou da escola.
- Dialogar com o filho, expondo seus sentimentos, permitindo que ele também exponha o que sente.
- Ressaltar os pontos positivos.
- Valorizar os pequenos avanços.
- Verificar se há necessidade de buscar ajuda externa (aula particular ou psicopedagogia).
Quando buscar ajuda externa
Se as abordagens dos pais e o trabalho dos professores na escola não são suficientes, a recomendação é buscar aulas particulares ou mesmo acompanhamento psicopedagógico para identificar o que está causando a dificuldade de aprendizagem.
— Acredito que um professor particular é pontual, quando o aluno está tendo problemas em uma matéria específica. Quando é uma questão global, várias matérias, é além. Um aluno que tem problema para fixar atenção e identificar a informação é caso para um psicopedagogo. Esse trabalho vai além do conteúdo que o professor dá em sala de aula — diz a especialista Lúcia Fonseca.
Procurar ajuda para a filha, Rafaella, 11 anos, foi o que fez o casal Luciano Zingano, analista de sistemas, e Luciane Zingano, dona de casa. Aluna do sexto ano no Colégio Farroupilha, a menina iniciou 2019 tendo problemas em diferentes disciplinas, o que ligou o alerta nos pais e nos professores.
— Ela tinha tido algumas dificuldades antes, mas sempre resolvendo com a própria escola. A escola dava reforços, laboratórios e ela sempre conseguiu se recuperar com isso, mas agora a coisa estava mais grave. Recebemos a indicação de orientação externa e foi o que procuramos — diz Luciane, mãe de outros dois filhos, Isabella, 19 anos, e Enzo, oito.
Com problemas em matemática e nas questões de linguagem (como ortografia e produção de textos), Rafaella deu início a um tratamento – que deu boa esperança, segundo Luciane:
— Algumas notas vieram melhores no segundo trimestre. Ela não teve resultados em todas as matérias, mas alguns começaram a vir.
Os fatores Enem e vestibular
Para os alunos que estão no último ano do Ensino Médio, o mau desempenho na escola gera uma dor de cabeça em relação ao vestibular e ao Enem. Nesse momento, a pressão pela chegada dos testes é um fator que influencia no rendimento escolar.
O adolescente tem um outro complicador, que é o cérebro dele. A partir dos 12, 13 anos, o cérebro do adolescente não para. Está sempre inquieto, quer algo em um momento, depois quer outra coisa totalmente diferente. Os professores podem julgar desinteresse em algum momento, mas não é.
CEUSA FERRAZZO
Especialista em orientação educacional
— Há estudantes que, frente a uma prova, vão se organizar melhor. Para outros, será um fator de estresse, algo que vai atrapalhar. Também é importante o adolescente diminuir as dúvidas sobre o caminho que vai querer seguir profissionalmente — afirma a especialista em psicopedagogia Lúcia Fonseca.
Os pais devem estar atentos ainda às mudanças que os filhos sofrem durante a adolescência, tanto nas questões hormonais quanto emocionais. O reflexo disso pode ser uma queda no desempenho escolar.
— O adolescente tem um outro complicador, que é o cérebro dele. A partir dos 12, 13 anos, o cérebro do adolescente não para. Ele está sempre inquieto, quer algo em um momento, depois quer outra coisa totalmente diferente. Os professores podem julgar desinteresse em algum momento, mas não é. É preciso ter cuidado. Esse tipo de entendimento (por pais e professores) faz com que ele se sinta injustiçado — pondera a especialista em orientação educacional Ceusa Ferrazzo. — É preciso observar também a questão afetiva, saber se eles estão passando por problemas, seja afetivo ou de aceitação no grupo. Isso pode afetar.