O objetivo era atingir a meta em 2015, mas quatro anos se passaram e a porcentagem de brasileiros que não conseguem ler ou escrever nem um bilhete simples continua maior que o esperado. Em 2018 essa taxa foi de 6,8%, acima dos 6,5% imaginados para três anos antes pelo Plano Nacional de Educação (PNE).
O Brasil permanece com uma marca de 11 milhões de analfabetos, mesmo com 121 mil pessoas a menos nessa estatística se comparado com o ano anterior. Se seguir nesse ritmo, caindo 0,2 ponto percentual por ano, também ficará longe de outra meta: a de erradicar o analfabetismo até 2024.
Os dados fazem parte da Pnad Contínua da Educação 2018, pesquisa anual do IBGE em domicílios no país todo lançada nesta quarta (19), e considera pessoas com 15 anos ou mais. Comparações só são possíveis a partir de 2016, quando o instituto ampliou a área de cobertura do estudo.
São perfis como o do pernambucano Antônio Manoel de Barros, 62 anos, que continuam puxando essa porcentagem para cima. Antônio é homem, idoso, negro e nordestino, grupos com índices de analfabetismo que chegam ao dobro da média do país.
— Eu fui para a escola quando era bem pequeno mesmo. Nem me lembro direito. Nunca aprendi a ler e escrever, só meu nome. Trabalho desde criança para sobreviver e não pude estudar — conta ele, que ganha a vida debulhando feijão para feirantes no Recife.
O Nordeste tem uma taxa de analfabetismo quatro vezes maior (13,9%) que a do Sudeste (3,5%). Um equivale ao Irã, enquanto o outro se equipara à China, na região administrativa de Macau, segundo os dados mais recentes da Unesco, de 2016. No geral, o Brasil está melhor que a média mundial, que era de 13,8% naquele ano.
É importante lembrar, porém, que uma proporção bem maior de brasileiros ainda não consegue ler, por exemplo, esta reportagem. O país somava 29% de analfabetos funcionais em 2015, ou seja, pessoas que sabem encontrar informações explícitas em textos simples, mas não tirar conclusões. Isso segundo outro estudo, o Inaf 2018 (Indicador do Alfabetismo Funcional).
A desigualdade regional é o que mais chama a atenção da analista do IBGE Marina Águas, que participou da pesquisa divulgada agora.
— Quando você considera só as pessoas de 60 anos ou mais, a diferença fica ainda mais gritante: 37% dos idosos no Nordeste não sabem ler e escrever um bilhete, enquanto no Sudeste são 10%.
Para ela, "o estudo mostra como o país é heterogêneo e como as oportunidades educacionais não são iguais para todo mundo, seja nas regiões ou em determinados grupos" - apesar de a taxa de analfabetismo estar melhorando em todos os recortes nos últimos anos.
Além dos índices por região e idade, a analista se refere aos grupos de cor e sexo. Quase 10 em cada cem negros, por exemplo, não sabem ler nem escrever, enquanto o número entre brancos cai para quatro. Os pretos e pardos também passam dois anos a menos na escola (8,4 anos) do que os brancos (10,3 anos).
Considerando a média geral, os brasileiros estudam três anos a menos (9,3) do que a meta estipulada pelo Plano Nacional da Educação para 2024, que é de 12 anos. O documento, aprovado em 2014 pelo Congresso Nacional, estabeleceu diretrizes, metas e estratégias para a área em 10 anos.
Os homens também continuam com diversos índices educacionais inferiores aos das mulheres. A taxa de alfabetização deles é de 7%, enquanto a delas é de 6,6%, e ambas caíram no mesmo ritmo desde 2016. Metade das mulheres completou o ensino médio, sendo que o número é de 45% entre os homens.
Apesar de o nível de instrução dos brasileiros também estar melhorando, quase metade da população não chegou nem a terminar o ensino fundamental, assim como Antônio. O pernambucano diz ainda sentir efeitos disso hoje: "[Ser analfabeto] é feito cego. É sempre precisar de outras pessoas", afirma com o feijão nas mãos.