Em meio a uma crise no Ministério da Educação do presidente Jair Bolsonaro (PSL), estudantes do país todo relatam uma série de dificuldades para se matricular pelo Fies (programa de financiamento estudantil). Por causa das falhas, parte dos alunos está sendo impedida de frequentar as aulas, que já começaram há mais de um mês, e até de fazer as provas. Eles dizem chegar a fazer périplos diários há quase um mês por agências bancárias e instituições de ensino na tentativa de resolver a questão, sem sucesso.
O Ministério vive uma crise com exonerações em série, interrupções de programas e incerteza sobre ações em curso. A Folha ouviu 20 estudantes de 11 estados nessa situação. O problema ocorre principalmente na obtenção do Documento de Regularidade de Inscrição (DRI) ou de Regularidade de Matrícula (DRM), necessários para a contratação ou continuidade do financiamento. Por falha na transmissão de dados do governo federal, as instituições de ensino não estão conseguindo emitir o documento.
— Sempre aparece que o sistema do Fies está fora do ar ou que o documento está sem data ou chave de segurança — diz Sandy da Silva, 21, de Cabedelo (PB).
Paolla Alvim, 19, conta que entregou sua documentação à faculdade em Mogi das Cruzes (SP) ainda antes do Carnaval:
— Assim que acabou o feriado entrei em contato e me informaram que a DRI tinha vindo sem a chave de segurança e a data e que tinham feito uma demanda para o MEC arrumar. Achei que, no máximo, em uma semana ia estar tudo resolvido. Ontem (quinta (28)) fez um mês que eu entrei com a minha documentação, e a DRI ainda não foi arrumada.
Outros estudantes contam que conseguiram o documento com as informações corretas após seguidas tentativas, mas não conseguem completar a etapa seguinte — a emissão do contrato em uma agência bancária.
— Quando o gerente pesquisa (no sistema do Fies) aparece a mensagem aluno não encontrado — diz Thais Pereira, de Arujá (SP), em relato similar ao de outros alunos.
Isabela Ferreira, 22, conta que, com um bebê recém-nascido, tem passado por todos esses problemas para continuar a estudar.
— Minha primeira DRI veio sem data e código de segurança. Estava com um bebê de cinco dias, de resguardo, e mesmo assim fui. Me informaram que eu deveria ir ao banco. Fui e me informaram que eu não estava sendo encontrada no sistema. Liguei para o MEC e falaram para eu abrir uma demanda. Até agora não foi respondida — afirma. — Espero poder terminar o meu resguardo em paz sem precisar sair de casa o tempo todo para resolver o problema — completa.
Assim como ela, diversos alunos afirmam que procuraram o MEC e o FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação), mas só recebem respostas vagas. Parte das instituições tem permitido que os estudantes afetados pelas falhas assistam às aulas. Mas outras não liberam, e mesmo algumas das que o fazem não estão autorizando os estudantes a fazer provas.
— Estou com a vida estagnada. Recebi uma proposta de emprego e não pude aceitar porque bateria com o horário em que eu teria aula, mas não estou tendo — reclama.
— Estamos sendo prejudicados por um erro que não é nosso, afinal nossa parte fizemos: estudar, fazer o Enem, passar e entregar a documentação regularizada — diz Maria Edite Barbosa, 23, de Petrolina (PE).
Segundo o diretor-executivo da ABMES (Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior), Sólon Caldas, a orientação da entidade é que as instituições de ensino permitam que os estudantes nessa situação possam frequentar as aulas. Os sistemas de inscrições e matrícula do Fies já haviam apresentado problemas em anos anteriores, mas nada comparável ao que ocorre atualmente, afirma ele.
— Às vezes dava problema na contratação, mas eram casos pontuais. Agora deu pane geral — explica Caldas.
Procurado, o MEC afirmou que os problemas com o DRI deveriam ser esclarecidos pelo FNDE, que, por sua vez, é vinculado à pasta. O órgão não respondeu até a conclusão desta edição.