A determinação de tocar o Hino Nacional nas escolas brasileiras não é nova. Publicada em setembro de 2009 e assinada pelo então presidente em exercício José Alencar e por Fernando Haddad — respectivamente vice-presidente e ministro da Educação no segundo governo Lula —, a lei nº 12.031 diz claramente, em parágrafo único: "Nos estabelecimentos públicos e privados de Ensino Fundamental, é obrigatória a execução do Hino Nacional uma vez por semana".
Essa obrigatoriedade, na verdade, antecede em décadas a lei de 2009. O que ela fez foi alterar outra legislação, de 1971, quando o Brasil era governado pelo militar Emílio Garrastazu Médici, que já previa a execução do Hino Nacional na rede de ensino, passando a incluir uma periodicidade semanal.
A lei de 2009 tem autoria de Lincoln Portela (PR-MG), deputado que hoje preside a bancada evangélica na Câmara. Pelo Twitter, Portela comemorou, na terça-feira (26), a decisão do Ministério da Educação (MEC) que resultou em polêmica por pedir a escolas que seus alunos cantassem o Hino Nacional e fossem filmados, sendo os vídeos enviados ao governo:
"Cumprimento o Ministro da Educação @ricardovelez por observar a lei de minha autoria e orientar as escolas a executar o hino nacional", escreveu o deputado.
Portela apresentou a proposta pela primeira vez nove anos antes. O projeto de lei tramitou na Comissão de Constituição e Justiça da Casa em 2000. E teve como relator um conhecido capitão da reserva do Exército, então deputado federal e hoje presidente da República: Jair Bolsonaro. Agora, sob seu comando, o MEC enviou carta a colégios pedindo que alunos, professores e funcionários sejam colocados em fila para louvar, em frente à bandeira do Brasil, a "pátria amada, idolatrada".
Hino obrigatório, mas não com filmagens
Medidas prevendo a execução do Hino Nacional nas escolas brasileiras têm se repetido desde o governo de Getúlio Vargas. Conforme apuração do jornal Folha de S.Paulo, em 1936, 12 anos após a adoção do hino, seu governo determinou a obrigatoriedade de tocar a composição para alunos. Para aquelas instituições que deixassem de cumprir a lei, o risco era ter seu funcionamento "proibido pela autoridade competente", conforme apontava o texto.
Sem força de lei e ainda diferindo das demais iniciativas semelhantes por ter sido retificada logo depois do seu anúncio, a medida proposta pelo atual titular do MEC, Ricardo Vélez Rodríguez, previa algo que as demais não sugeriam: a gravação e o envio de provas materiais que mostrassem as crianças cantando a melodia dedicada ao Brasil. O pedido recebeu críticas, ainda, por incluir um slogan de propaganda do governo: "Brasil acima de tudo. Deus acima de todos".
Nas orientações, remetidas por e-mail, solicitava-se que os estudantes se perfilassem diante da bandeira brasileira, cantassem o Hino Nacional e escutassem a leitura da carta assinada por Vélez, que tinha como fecho o slogan de campanha de Jair Bolsonaro. O documento pedia ainda que os diretores providenciassem a filmagem das solenidades e enviassem as imagens ao ministério.
A iniciativa de Vélez desencadeou uma onda de críticas. Especialistas em educação, juristas e entidades apontaram vários pontos em que a atitude do ministro violaria leis e princípios constitucionais. Na manhã de terça-feira (26), Vélez reconheceu ter errado e modificou os textos. Em novo comunicado, a pasta garante que a gravação deve ser feita por "diretores que desejarem atender voluntariamente o pedido do ministro" e precisa ser "precedida de autorização legal da pessoa filmada ou de seu responsável".