A Justiça do Trabalho está sendo menos acionada no Rio Grande do Sul após a entrada em vigor da Lei 13.467, a reforma trabalhista. Levantamento do Tribunal Superior do Trabalho (TST) permite comparar o número de ações entre janeiro e julho deste ano com igual período de 2017, antes das alterações na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Nos sete primeiros meses do ano passado, 106.936 novos processos ingressaram nas Varas do Trabalho gaúchas, área do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região. No mesmo período de 2018, o número foi de 66.530, uma queda de 37,79% no volume.
Significa, em média, 5,7 mil processos a menos por mês no Estado, que acompanha um fenômeno nacional. No mesmo período, em todo o Brasil, esse recuo foi de 37,44% (de 1.570.914 para 982.753 novas ações). Essa redução começou ainda no ano passado a atualização de mais de 100 itens da CLT entrou em vigor no dia 11 de novembro. Itens polêmicos desde a discussão da reforma, como a necessidade da parte perdedora pagar honorários periciais e advocatícios, podem estar represando demandas trabalhistas.
– Como essas e outras questões ainda não foram bem equacionadas, muitos advogados estão reduzindo os ajuizamentos e até retendo algumas ações no aguardo de uma sinalização dos tribunais. Não significa que não existem demandas justas, elas existem. Mas há um temor em litigar – avalia o advogado trabalhista e doutor em Direito do Trabalho pela USP Raimar Machado.
STF julgará as normas
Em junho deste ano, o TST aprovou uma instrução normativa (IN) esclarecendo essas regras (veja abaixo). O pagamento dos honorários do advogado da empresa, de acordo com a IN, deve valer apenas para trabalhadores que entraram na Justiça partir da entrada em vigor a lei. Acontece que a instrução não é obrigatória nas interpretações dos magistrados.
– Essa redução dos processos é uma tendência. A partir da reforma, o autor da ação passou a ter responsabilidades e riscos pecuniários. E é uma tendência, ao menos, até que todos estejam adaptados à reforma: reclamantes, reclamados e mesmo o judiciário ao uniformizar a aplicação da nova regra – pondera o professor e advogado especialista em Direito do Trabalho Flavio Ordoque.
Casos de aplicação das normas processuais já pipocam pelo país. Ainda em 2017, um juiz da 3ª Vara do Trabalho de Ilhéus (BA) condenou trabalhador a pagar R$ 8,5 mil ao patrão por má-fé no que estava pedindo. E em maio deste ano, com a reforma trabalhista embaixo do braço, outro magistrado determinou a prisão de duas testemunhas de uma empresa por supostamente mentirem em audiência na Região Metropolitana de Curitiba (PR). Mas um outro efeito poderia ajudar a explicar o recuo nos ajuizamentos. A advogada trabalhista Carolina Spina lembra que em 2017 pode ter havido uma distorção.
– O ano passado foi atípico. Havia já um temor do que viria com a reforma trabalhista, e por isso muitas ações foram propostas em uma tentativa de se fugir da nova CLT. Processos que seriam iniciados em 2018 foram antecipados, isso acentua a diferença para este ano – acredita a advogada.
Nesse caso, ela prevê que o número de ações pode retomar, gradualmente, a tendência de anos anteriores. Enquanto isso, as regras esperam por uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF). O Supremo analisa Ação Direita de Inconstitucionalidade da Procuradoria-Geral da República (PGR) que questiona pontos como o pagamento de custas por beneficiários da Justiça gratuita. Esse julgamento, entretanto, está suspenso desde maio e ainda não tem prazo para ser retomado.
Novos processos entre janeiro e julho
Brasil
2017: 1.570.914
2018: 982.753
Redução: 37,44%
Rio Grande do Sul
2017: 106.936
2018: 66.530
Redução: 37,79%
Regras que podem estar freando as ações
Justiça gratuita
Só tem direito a esse benefício quem recebe salário igual ou inferior a 40% do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social (R$ 2.258,32) e que comprovar insuficiência de recursos para as custas do processo.
Má-fé
Aquele que agir de má-fé durante o processo – alterar a verdade dos fatos, resistência injustificada ao andamento do processo, recurso para protelar o andamento da ação – pode ser multado entre 1% a 10% sobre o valor da causa.
Honorários de sucumbência
São valores pagos por quem perdeu a ação para a parte vencedora. Segundo norma do TST, para os processos a partir de 11/11/2017 o empregado terá de pagar esses valores. Para especialistas, é um ponto que tem segurado ações trabalhistas com valores mais altos.
Honorários periciais
São os valores pagos a peritos técnicos determinados em juízo. O empregado deverá pagar se perder a ação. O valor poderá ser parcelado.
Falso testemunho
Pela mesma norma do TST, para os processo a partir de 11/11/2017 está prevista multa entre 1% a 10% do valor da ação. A testemunha também poderá ser multada.
Para um processo mais seguro
Decisões anteriores
– Antes de ingressar com a ação, é aconselhável conferir como a Justiça do Trabalho tem julgado o mesmo tipo de situação.
– Com muitas decisões anteriores favoráveis, há condição de uma ação com mais expectativa de sucesso. Mas certeza nunca se terá.
– Se o pedido tem sido rejeitado pelos magistrados em diversas Varas do Trabalho, um sinal de alerta deve ser ligado.
– Não significa que o trabalhador não tem direito ao que reivindica. Mas será preciso considerar bem as consequências. A decisão de entrar com o processo terá assumir riscos calculados.
As provas do caso
– A parte que entra com a ação precisa, mais do que nunca, realizar uma verificação rigorosa da qualidade do que tem em mãos para provar que um direito foi atacado.
– Isso garante um grau a mais na convicção de que está tomando a melhor decisão. Mas nunca significará certeza de sucesso.
As testemunhas
– Pergunte-se se a testemunha que se tem vai, mesmo, à audiência.
– Questione se o que ela tem para contar ao juiz é relevante, se comprova a irregularidade que se quer demonstrar.
– Reflita se essa testemunha consegue se expressar de forma clara, ou se pode mais confundir o juiz e acabar sendo desconsiderada.
Provas documentais
– Confira bem se documentação que tem é suficiente para o caso em questão.
– É preciso ter em mãos, por exemplo, a rescisão do contrato, os contracheques, e-mails ou mensagens por aplicativos trocadas com o patrão que revelam a situação questionada. São provas que podem fazer a diferença em uma ação.
– Importante também reunir documentação que demonstre o custo de vida do trabalhador.
– Confira se documentos que deveriam estar assinados estão, mesmo, com a assinatura devida. Do contrário, o magistrado poderá não levá-los em conta.
Depoimento do trabalhado
– Isso será bem revisado com o advogado, mas é bom saber o que relatar ao juiz na audiência.
– Os fatos precisam estar claros na hora do depoimento, cronologicamente bem organizados.
– A memória do que aconteceu precisa estar viva, isso passa a convicção de que se está fazendo um pedido correto.
– O que se vai relatar precisa estar de acordo com todo os documentos e as testemunhas.
Fontes: advogados trabalhistas Carolina Spina e Raimar Machado