A abertura de novos cursos de Medicina foi alvo de uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) na semana passada. A corte entendeu que são constitucionais os editais publicados pelo Ministério da Educação (MEC) que determinam que a abertura das graduações siga regras previstas no Programa Mais Médicos, priorizando regiões onde há déficit destes profissionais.
A decisão judicial ocorre após o fim, em 2023, de moratória de cinco anos decretada durante o governo Michel Temer proibindo a abertura de novos cursos de Medicina. Em maio do ano passado, logo após o encerramento da proibição, havia 15 pedidos de instituições gaúchas para criar essa graduação, sendo a maioria na Região Metropolitana e na Serra.
Em busca de organizar a rede de ensino de Medicina no Brasil, o MEC publicou em outubro um edital com regras para a abertura de novos cursos. A pasta previa a abertura de 5,7 mil vagas em todo o país, sendo 240 delas no Rio Grande do Sul. Das 450 regiões de saúde existentes no Brasil, foram escolhidas 116 nas quais seriam aceitas propostas de criação de turmas. Entre os critérios, estava a baixa presença de médicos na região e a existência de infraestrutura para que os alunos tenham experiências práticas.
Em abril de 2024, a Secretaria de Regulação e Supervisão da Educação Superior divulgou lista de 41 regiões, entre as 116 pré-selecionadas, que apresentam processos de autorização ou aumento de vagas relativos a cursos de Medicina em tramitação no MEC e que podem vir a receber as graduações.
No RS, passaram por esse novo filtro duas regiões: a 9 e a 13. Na 9, estão 20 municípios localizados entre as regiões Sul e Carbonífera, como Arambaré, Barra do Ribeiro, Charqueadas e São Jerônimo, este último alvo, antes da publicação do edital, de pedido de abertura por parte da Universidade Luterana do Brasil (Ulbra). Na 13, estão outras 20 cidades do noroeste gaúcho, como Ajuricaba, Ijuí e Panambi.
Em maio deste ano, um novo edital atrelado às regras do Mais Médicos foi publicado pelo MEC, este destinado exclusivamente a faculdades ligadas a hospitais. Cada instituição de ensino poderá concorrer entre 80 e 100 vagas de Medicina, a depender da estrutura de equipamentos e programas disponíveis na unidade hospitalar e na rede SUS do município de oferta do curso. Um dos estabelecimentos que já constava na lista dos 15 pedidos do RS antes da publicação dos editais e afirmou cogitar se candidatar é o Hospital Moinhos de Vento.
Apesar de muitas das instituições de ensino que protocolaram pedidos de abertura de curso antes da publicação desse edital não se encaixarem nos critérios estabelecidos no documento, uma vez que previam a oferta da graduação em locais já bem servidos de médicos, o STF entendeu que, dependendo da fase de implementação, esses processos poderão continuar. Por oito votos a três, os ministros da corte entenderam que faculdades que já tinham passado da fase inicial da documentação deveriam continuar com o processo em tramitação.
Procurado, o MEC não informou quantas candidaturas recebidas do Rio Grande do Sul já foram registradas no chamamento até agora.
Em nota, a Associação Nacional de Universidades Particulares (Anup), que movia a ação junto ao STF e pedia o reconhecimento da constitucionalidade do edital, reiterou que a regulamentação do setor “deve ser urgentemente respeitada”, e que os critérios estabelecidos pela lei “são essenciais para mitigar os desafios da qualificação das escolas médicas no país e garantir segurança para a sociedade, principalmente se o ingresso de novos profissionais for acompanhado pela política pública, conforme definido nos editais de chamamento do governo federal”.
Já em relação à decisão de incluir as análises de pedidos judicializados, a entidade reconhece que é necessário proteger as expectativas de instituições com cursos de Medicina já em operação, a fim de assegurar o interesse de estudantes já matriculados. A entidade defende a aplicação integral da política pública, reconhecida pelo STF, para evitar lacunas na qualidade da educação médica e, consequentemente, nos serviços de saúde do país.
Tema controverso
Ao se posicionar no âmbito da ação do STF, a Advocacia-Geral da União (AGU) manifestou a preocupação quanto a decisões de primeira e de segunda instância da Justiça mesmo após liminar do ministro Gilmar Mendes, em agosto de 2023, determinar a validade da regra do Mais Médicos para novos cursos.
A abertura de graduações de Medicina tem motivado controvérsia há mais de uma década. Desde 2013, a regra era de que novas vagas priorizassem o critério do programa Mais Médicos. A medida é uma tentativa de distribuir melhor a formação dos profissionais pelo país.
Depois, em 2018, o governo Michel Temer (MDB) decretou moratória, proibindo por cinco anos a abertura de vagas. Com isso, diversos grupos educacionais entraram na Justiça para obter autorização para abrirem seus cursos.
O tema chegou ao Supremo por meio de uma ação movida pela Anup, que pedia o reconhecimento da constitucionalidade do uso do critério do programa Mais Médicos. A posição, no entanto, não é unânime entre as entidades educacionais. Há grupos que se posicionam contrariamente ao critério do Mais Médicos. É o caso do Conselho de das Universidades Brasileiras, que pediu ao Supremo que declarasse o critério inconstitucional.