Nesta semana, voltou a ser discutido em Porto Alegre um tema que divide pais, professores e especialistas – o projeto de lei (PL) Escola sem Partido, aprovado nesta quarta-feira (11) pela Câmara de Vereadores. A proposta ainda depende do parecer do prefeito Sebastião Melo, que pode sancionar, vetar ou silenciar sobre o projeto.
O texto estabelece orientações sobre o comportamento de gestores, funcionários e corpo docente a respeito de questões sociopolíticas, "preconizando a abstenção da emissão de opiniões de cunho pessoal que possam induzir ou angariar simpatia a determinada corrente político-partidária-ideológica".
O PL ainda prevê a proibição de “toda e qualquer doutrinação política ou ideológica” nas escolas da rede municipal de Porto Alegre, bem como "responsabilização do professor, administrador ou representante de estabelecimentos de ensino público municipal" que "desrespeite os princípios estabelecidos no projeto".
A autoria da iniciativa é do então vereador Valter Nagelstein, em 2016. A matéria chegou a ser aprovada pelo plenário em 2019, mas uma decisão judicial impediu a continuidade da tramitação do projeto. Em julho deste ano, a proposta foi desarquivada a pedido da vereadora Fernanda Barth (PL) e voltou a ser discutida, dividindo opiniões, sobretudo por conta do caráter moral do debate.
O que pode mudar
Caso seja sancionado, o que ainda não tem previsão para acontecer, o Escola Sem Partido deve “tranquilizar pais e mães", dando a garantia de que não haverá conteúdo que não seja pedagógico dentro de sala de aula, segundo a vereadora Comandante Nádia (PL), que apoia o projeto:
— Diferentemente do que a oposição está dizendo, quando falamos do projeto, não é deixar de falar sobre racismo, por exemplo. Não tem nada a ver com racismo, porque isso não é política partidária, isso é política de todas as pessoas que querem o bem, que não aceitam o preconceito — diz.
Segundo ela, o professor deve ser um guia, e não um “impositor de sua opinião”. Na prática, os docentes e funcionários deixariam de levar nomes de figuras políticas para atividades em sala de aula, por exemplo. No entanto, o projeto não traz detalhes sobre como isso será fiscalizado.
Conforme a vereadora, os próprios pais devem ficar atentos ao que está sendo abordado na escola, a partir de diálogo com os filhos e observando o material didático. “A responsabilização (...) será atribuída mediante processo legal, civil e administrativo, quando for o caso, impondo-se penas disciplinares de advertência, suspensão e multa”, consta no PL.
Risco a professores e ao ensino
Um dos riscos elencados por quem se opõe ao projeto é que os professores sejam ameaçados e atacados, tanto por alunos quanto por familiares dos estudantes, tendo em vista que a violência moral e física contra professores é cada vez mais frequente.
Para o professor e integrante da Rede de Pesquisa em Juventude no Brasil (Redejuve) Ricardo Severo, do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande (Furg), trata-se de um retrocesso na educação.
— Essa pauta é reacionária. Na verdade, o projeto busca vilanizar professores e desconstruir a escola como um espaço de saber legítimo, e isso é feito a partir de estratégias como o pânico moral — afirma o pesquisador.
Conforme Severo, isso atrapalha o avanço da educação, porque as pessoas acabam desconfiando do conteúdo abordado nas escolas. Severo defende que não há maneira de fiscalizar as regras que o projeto busca estabelecer, porque são questões arbitrárias:
— Questões como a obrigatoriedade das vacinas, a proteção contra covid-19, as mudanças climáticas e questões de gênero são impossíveis de serem colocadas como elementos objetivos. Como a gestão da escola vai dizer o que é ideológico ou não? Quem vai definir isso é a arbitrariedade.
A proposta defende que é necessário “respeitar a neutralidade das opiniões, desprovendo de partidarismo suas manifestações”, ao tratar sobre questões “das ideologias políticas”.