Uma fiscalização realizada pelos tribunais de contas de todo o Brasil, cujo objetivo era checar a infraestrutura das escolas públicas, detectou que 57% das salas de aula visitadas estão inadequadas. Foram encontradas situações como mofo, rachaduras, ausência de iluminação e ventilação, vidraças, móveis e ventiladores quebrados, lixo acumulado na parte externa e cozinhas sem licença da Vigilância Sanitária. Foram inspecionados pontos como o acesso à internet, estrutura de energia elétrica, coleta de esgoto, abastecimento de água potável, acessibilidade, estrutura de prevenção e combate a incêndio e espaços pedagógicos, esportivos e de recreação.
A iniciativa, batizada Operação Educação, promoveu visitas em 1.082 escolas públicas de todos os Estados brasileiros, distribuídas em 537 municípios. No total, 785 auditores dos 32 tribunais de contas do país foram a campo, munidos de tablets em que preenchiam um check list com 200 itens a respeito das condições dos locais. As escolas foram escolhidas pelos indicativos de situações críticas de infraestrutura que constam no Censo Escolar de 2022.
— Os dados são preocupantes. Mais da metade das salas visitadas apresentou problemas. Mais de 60% das escolas visitadas não têm biblioteca nem sala de leitura. Verificamos vários banheiros sem porta. Como fica a privacidade de um menino e, principalmente, de uma menina? A escola precisa ser segura e acolhedora. Não se quer luxo, mas o mínimo de condições para um ambiente que propicie convivência e aprendizagem — afirma Cezar Miola, presidente da Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil (Atricon).
A operação ocorreu ao longo de três dias, entre 24 e 26 de abril, e foi realizada a partir de parceria da Atricon e do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCE/SP).
Os auditores produziram fotos e vídeos durante as inspeções para documentar os problemas encontrados. Entre imagens de degradação, infiltrações, mofo e sujeira, chama atenção o registro feito em um ginásio esportivo na Escola Felix Araújo, em Campina Grande (PB), onde uma parede de grandes proporções desabou parcialmente e transformou o local de prática esportiva em um amontoado de entulho.
Para Miola, os problemas detectados são um “estímulo indireto à evasão escolar”. A avaliação é de que os locais degradados criam um ambiente de desengajamento e desinteresse, o que prejudica, no final das contas, a qualidade do ensino.
— Acaba se perdendo a sensação de pertencimento. Ninguém se responsabiliza e o ambiente se deteriora — diz Miola, originário do Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul (TCE-RS).
Com o uso dos tablets, as informações foram coletadas em tempo real e, depois, totalizadas. Foi produzido um relatório nacional e cada Estado recebeu um documento com o diagnóstico específico sobre as suas escolas.
Miola afirma que agora, com os dados em mãos, é necessário buscar soluções. A Atricon está sugerindo que os tribunais de contas incluam os problemas detectados nos processos de prestação de contas de gestores estaduais e municipais.
Nos casos mais urgentes, os tribunais podem emitir recomendações ou determinações, via medidas cautelares, para que seja resolvido um problema grave. Também é opção a assinatura de termos de ajustamento de gestão. São acordos em que o administrador público se compromete, perante as cortes de fiscalização, a solucionar uma situação de emergência.
— Um muro balançando, com risco de cair, é algo que não se pode esperar. Se faz um acordo para buscar a solução. Para situações estruturais, que demandam tempo, os termos de ajustamento de gestão podem dar prazos de resolução — diz Miola.
Situação no RS
No Rio Grande do Sul, foram fiscalizadas oito escolas: três em Porto Alegre, duas em Novo Hamburgo e uma em Santa Cruz do Sul, Vera Cruz e Rio Pardo. Diretor de Controle e Fiscalização do TCE-RS, Bruno Londero diz que a Corte já faz acompanhamento permanente das instituições de ensino gaúchas e destacou como ponto relevante da Operação Educação a oportunidade de conversar com as direções.
— Identificamos questões de depredação, falta de manutenção e segurança. Algumas escolas possuem câmeras de monitoramento, mas não contam com vigias. O controle é fragilizado — comenta Londero.
Ele relata ter percebido um ambiente de medo da violência e destacou problemas de acessibilidade e de estrutura para receber alunos com necessidades especiais.
— Internamente, as escolas têm acesso à água potável e energia elétrica. O básico existe, mas os materiais de consumo e serviços de manutenção são itens que se acostumou a não ter — detalha Londero.
Na Capital, uma das escolas fiscalizadas foi o tradicional Instituto de Educação General Flores da Cunha, que está em obras de restauro.
— O que notamos é que, recentemente, foi prevista uma dotação orçamentária mais robusta pelo Estado. É um prédio histórico. Esperamos que as obras sejam concluídas o quanto antes — afirma o diretor do TCE-RS.
A reforma do instituto foi iniciada em agosto de 2016, com os seus 1,5 mil alunos transferidos para outras escolas de Porto Alegre. Um ano depois, o Estado rompeu o contrato com a empresa responsável por conta de atraso nos trabalhos. Outra prestadora de serviço foi contratada em outubro de 2018, mas as atividades foram paralisadas um ano depois por falta de pagamentos. Em janeiro de 2022, houve novo anúncio de retomada das obras. A previsão de entrega da restauração é de 15 meses.
Procurada, a assessoria de imprensa da Secretaria Estadual de Educação (Seduc) afirmou que o "governo do Estado tem trabalhado no sentido de transformar a realidade dos ambientes educacionais, tratando o tema da educação pública como prioridade absoluta. Para tanto, promoveu uma profunda reestruturação na Secretaria de Obras Públicas, com a criação de uma subsecretaria focada nas obras escolares, bem como a reestruturação da Secretaria da Educação, no intuito de garantir ambientes escolares adequados". (leia, abaixo, a nota na íntegra)
Confira alguns dados do levantamento nacional da Operação Educação
- 31% das escolas visitadas não têm coleta de esgoto
- 85% não têm hidrantes
- 43% não têm extintores
- Dentre as que têm cozinha, 82% não dispõem de alvará de funcionamento da vigilância sanitária
- 62% não têm biblioteca
- 63% não têm sala de leitura
- 88% não têm laboratório ou sala de informática
- 80% não disponibilizam equipamentos de informática para os alunos
- 57% não tem câmera de segurança
- 85% não têm botão de pânico ou equipamento equivalente
Confira a lista de escolas fiscalizadas no RS
- Escola Estadual de Ensino Médio José do Patrocínio, em Porto Alegre
- Instituto de Educação General Flores da Cunha, em Porto Alegre
- Escola Estadual de Ensino Médio Baltazar de Oliveira Garcia, em Porto Alegre
- Escola Estadual de Ensino Fundamental Pedro Adams Filho, em Novo Hamburgo
- Escola Estadual de Ensino Fundamental Maria das Neves Petry, em Novo Hamburgo
- Escola Estadual de Ensino Fundamental Felippe Jacobs, em Santa Cruz do Sul
- Escola Estadual de Ensino Médio Fortaleza, em Rio Pardo
- Escola Municipal de Ensino Fundamental Professor Henrique Candido Pritsch, em Vera Cruz
Leia na íntegra a nota da Seduc
O Governo do Estado tem trabalhado no sentido de transformar a realidade dos ambientes educacionais, tratando o tema da educação pública como prioridade absoluta. Para tanto, promoveu uma profunda reestruturação na Secretaria de Obras Públicas, com a criação de uma subsecretaria focada nas obras escolares, bem como a reestruturação da Secretaria da Educação, no intuito de garantir ambientes escolares adequados.
Em fevereiro de 2023, o governo apresentou detalhado diagnóstico da infraestrutura escolar, e um plano para qualificação desses espaços. Também instalou a Sala de Gerenciamento Intensivo (SGI), que reúne em um mesmo local na SOP técnicos das duas secretarias para otimizar a troca de informações e o trabalho integrado.
Alem disso, foram repassados R$ 30 milhões via programa Agiliza, distribuídos entre as 2.341 instituições de ensino do Estado, e R$ 3 milhões especificamente para as 176 escolas classificadas em situação de urgência no plano, para a realização de reparos e aquisições diretamente pela equipe diretiva das escolas, como reformas nas rede elétrica e hidráulica, em banheiros, refeitórios, cozinhas e na sala de professores, além de pintura de ambientes e aquisição de grades e portões. Entre 2021 e 2022, já haviam sido repassados R$ 228 milhões como reforço de Autonomia Financeira das instituições de ensino, com o mesmo objetivo.