Pauta central da campanha eleitoral de Eduardo Leite, a ampliação expressiva no número de escolas de tempo integral já esbarra em rejeições e desafios estruturais, antes mesmo de o ex-governador retornar ao Palácio Piratini. Os obstáculos de curto e médio prazo vão desde a necessidade de contratação de milhares de professores, passam pelas limitações de espaço físico e chegam à falta de cozinhas e refeitórios para viabilizar a alimentação de alunos e professores.
A promessa de Leite é passar ao modelo de tempo integral metade das escolas estaduais de Ensino Médio. Em números, significa saltar das atuais 18 para 550, em quatro anos.
— É possível chegar. Potencialmente, existe a chance — avalia, cautelosa, a secretária estadual da Educação, Raquel Teixeira, nomeada no fim da primeira gestão de Leite.
Nas últimas semanas, foi dada a largada, no governo do Estado, para cumprir a ousada meta. A primeira fase do plano de expansão da Secretaria Estadual da Educação (Seduc) detectou que 140 escolas cumprem os requisitos para, já em 2023, se transformarem em locais de ensino de tempo integral.
Após consulta às coordenadorias regionais de educação e às próprias escolas, o número caiu para 53. Somadas às 18 já existentes, o Estado projeta oferecer, em 2023, 71 unidades de tempo integral.
— A gente está fazendo um trabalho de convencimento com as demais escolas. As pessoas têm medo do tempo integral. Acham que o aluno não vai querer ficar porque vai ter que trabalhar, que o professor não vai gostar. Culturalmente, não é uma ideia completamente assimilada — aponta a secretária da Educação.
Para cumprir a sua promessa de campanha, a partir do segundo ano do novo governo de Leite, a Seduc precisará acelerar a implementação do modelo. Pelo atual cronograma, a cada ano o Estado vai abrir mais 161 escolas de tempo integral, entre 2024 e 2026.
Parte dos alunos do Ensino Médio na rede pública estuda pela manhã e, durante a tarde, trabalha — seja formal, seja informalmente. Esses jovens, por vezes, sinalizam às escolas que, caso a instituição migre para o formato de sete horas ao dia, precisarão encontrar outro colégio.
A solução deste impeditivo de expansão do tempo integral passa, conforme a secretária da Educação, pelo fortalecimento de um programa, com pagamento de bolsa, criado na gestão anterior de Eduardo Leite.
O programa Todo Jovem na Escola paga hoje R$ 150 às famílias de estudantes de baixa renda, para evitar a evasão escolar. A titular da Seduc diz que o programa deve ser ampliado e o valor reajustado para R$ 300.
— Por isso a gente já criou, desde o ano passado, uma bolsa de R$ 150. A gente está pensando em ampliar o valor e o número de bolsas. A gente já tem 70 mil alunos que recebem R$ 150 por mês. Se deixar por mim, eu coloco pelo menos R$ 300. Mas isso é uma decisão do governador (Eduardo Leite) — pontua Raquel.
Para uma escola ser considerada de tempo integral, ela precisa oferecer no mínimo sete horas de carga horária diária, de segunda a sexta-feira. O Rio Grande do Sul terá, inicialmente, a carga mínima para o formato integral (há Estados que oferecem até dez horas diárias aos alunos).
Até o horário de entrada e saída dos alunos dos colégios representa novos desafios para a gestão estadual. Com sete horas de atividades, parte dos alunos deverá encerrar a jornada escolar no meio da tarde, demandando transporte escolar específico.
A educação de tempo integral não é o mesmo que o antigo “contraturno” — no qual os alunos tinham as aulas tradicionais durante a manhã e atividades de esporte e lazer durante a tarde. O modelo atual prevê que a ampliação de carga horária deve mobilizar todas as disciplinas e dar espaço para atividades de criação dos estudantes.
— Educação em tempo integral expande tempo e oportunidades de aprendizagem. Não existe a ideia de contraturno. Existe um turno, do tamanho que for. O aluno vai ter tempo com os colegas para fazer um trabalho de iniciação científica, robótica, espaço e apoio do professor para atividades de aprofundamento do conhecimento. Essas horas a mais serão preenchidas com disciplinas eletivas, clubes juvenis — acrescenta a secretária da Educação.
Contratação de professores é obstáculo principal
Atualmente, o Estado conta com cerca de 60 mil docentes na rede estadual de ensino — e já convive com o desafio de encontrar professores para as atuais disciplinas. O aumento da carga horária no Ensino Médio vai tornar o cenário ainda mais difícil para o Estado, especialmente a partir de 2024, pelas projeções da Seduc.
Emergencialmente, em 2023, a Seduc vai utilizar os professores contratados no âmbito do programa Aprende Mais para dar conta da expansão do ensino de tempo integral. O programa, lançado no último ano, tem o objetivo de recuperar o aprendizado perdido de Português e Matemática durante a pandemia.
— Reduzimos uma hora cada nesse programa e, assim, temos um estoque de professor disponível. A minha grande preocupação em tudo na educação hoje é ter professor. A gente está vivendo um apagão de professores — ressalta a secretária.
Um dos programas gestados no governo do Estado para minimizar o problema passa pela oferta para estudantes de licenciaturas em universidades particulares gaúchas. O Estado planeja pagar a mensalidade dos cursos de graduação e mais um auxílio-permanência de R$ 800 por mês para cada aluno, conforme antecipado por GZH, na última semana.
Requisitos
A Seduc definiu seis requisitos mínimos para uma escola de tempo parcial passar a operar em jornada integral. Além de infraestrutura para preparar e servir refeições, a escola precisa ter os espaços livres para garantir que a adoção do modelo não implique em remanejamento de estudantes. Também, já deve oferecer o Ensino Médio durante o dia.
Veja:
- Escolas que já possuem Ensino Médio diurno
- Não ser a única oferta de Ensino Médio no município
- Não possuir especificidades de oferta (escolas indígenas, especiais, dentre outras)
- Não realizar remanejamento de estudantes
- Possuir refeitório/cantina e cozinha
- O Ensino Médio funcionar no prédio principal da escola