A greve dos caminhoneiros vem mexendo com uma necessidade básica dos trabalhadores: se deslocar de casa para o trabalho. Quem usava o carro precisou repensar a estratégia e fazer as contas com o que tinha no tanque, já que a gasolina sumiu dos postos e somente aos poucos começa a voltar. No caso do transporte coletivo, restrições nos horários das viagens foram necessárias para poupar diesel. Em Porto Alegre, por exemplo, não houve ônibus no domingo.
Por ser uma situação extraordinária, não existe regra trabalhista específica para o que o Brasil vive nos últimos dias. Mas o que há na legislação deve servir de parâmetro para empregados e empresas. A falta de transporte para ir ao emprego pode ser motivo suficiente para livrar o trabalhador de advertência e desconto do respectivo dia de trabalho.
– Faltas injustificadas são passíveis de desconto. Mas, se pelos meios usuais, o empregado não consegue chegar ao trabalho, essa ausência entra para o grupo das justificadas – explica o coordenador da pós-graduação em Direito e Processo do Trabalho do Complexo de Ensino Renato Saraiva (Cers), Rodolfo Pamplona.
Mas o especialista alerta que é preciso boa fé de ambas as partes. Alguém que vai a pé ao trabalho todo dia, por exemplo, não pode alegar falta de combustível para a ausência. E uma empresa não pode sugerir o uso de aplicativos de transporte – a não ser que faça o ressarcimento – a um empregado que sempre usa ônibus.
As dúvidas sobre a ida ao trabalho
Posso ter o dia descontado se eu não for ao trabalho?
Sim, pode. Você precisa analisar seu caso específico para saber isso. Se você sempre vai de ônibus e o transporte coletivo não foi afetado – pelo menos nos horários do seu turno, sua falta não poderá ser atribuída à atual crise. Será uma falta injustificada e passível de advertência e desconto. Se você vai de carro, está sem gasolina, mas há ônibus para o deslocamento, também não tem justificativa.
Em que casos a minha falta não provocará desconto?
Nos casos em que você tentar ir ao trabalho e não conseguir. Por exemplo, se você usava carro e está sem gasolina, então opta pelo transporte coletivo. Agora, se nem transporte coletivo há, trata-se de situação de força maior. A empresa que, nesse caso, insistir em descontar o empregado poderá ser alvo de uma ação judicial.
Como devo proceder para comprovar esse impedimento?
O especialista Rodolfo Pamplona sugere que o empregado mostre como tentou ir, e não ficou apenas em casa. Para isso, sugere fotos da parada de ônibus onde esperou por transporte, por exemplo. E manter contato em tempo real com o gestor imediato relatando a tentativa de chegar ao emprego. Simplesmente não ir, sem sequer avisar que tentou, enfraquece a justificativa.
A empresa pode sugerir que eu use aplicativos na falta de ônibus?
Sim, pode, desde que faça o ressarcimento desse valor. Não pode sugerir que o trabalhador pague do próprio bolso por esse transporte – ainda mais caro com a falta de combustível – se ele sempre usa ônibus. Para quem usa carro ou já costuma chamar transporte por aplicativos, é preciso bom senso de ambas as partes. Se a viagem custar muito mais do que a realizada em condições normais, o empregador deveria compartilhar esse gasto com o empregado.
A empresa é obrigada a providenciar o transporte se eu não puder ir?
Obrigada, não é. Mas, para manter seus processos e rotina, sendo a situação completamente atípica, a empresa poderá montar um esquema para buscar e levar para casa seus colaboradores. Do contrário, vale as situações anteriores.