A Polícia Federal (PF) diz que o ex-presidente da Americanas Miguel Gomes Pereira Sarmiento Gutierrez, a ex-diretora Anna Christina Ramos Saicali e outros ex-executivos da rede varejista venderam R$ 287 milhões em ações pouco antes do anúncio, em janeiro do ano passado, da existência de um rombo de R$ 25,3 bilhões no balanço da empresa em razão de "inconsistências contábeis".
A descoberta levou ao enquadramento dos ex-executivos por crime de uso de informações privilegiadas, além de outros delitos investigados na Operação Disclosure, que foi desencadeada na quinta-feira.
Segundo a investigação que resultou na ação, Gutierrez e Anna Saicali teriam vendido mais de R$ 230 milhões - R$ 171,7 milhões e R$ 59,6 milhões, respectivamente - em ações da Americanas antes de as fraudes contábeis na empresa se tornarem públicas.
Em janeiro de 2023 a Americanas entrou com pedido de recuperação judicial em caráter de urgência, com uma divida de cerca de R$ 43 bilhões e com 16,3 mil credores. Em novembro, a empresa alegou ser “vítima” de fraude de R$ 25 bilhões e prejuízo de R$ 12,6 bi. Em fevereiro deste ano, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) homologou o plano de recuperação judicial do grupo.
Em maio de 2023, uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) foi instaurada na Câmara dos Deputados. O relatório final, do deputado Carlos Chiodini (MDB-SC), foi aprovado em setembro. Apesar de o "conjunto probatório, de fato, converger para o possível envolvimento de pessoas que integravam o corpo diretivo da companhia", ninguém foi indiciado.
— Contudo, os elementos até então carreados não se mostraram suficientes para a formação de um juízo de valor seguro o bastante para atribuir a autoria e para fundamentar eventual indiciamento. — afirmou Chiodini.
O auge das transações ocorreu entre julho e outubro de 2022, afirmam a PF e o Ministério Público Federal (MPF). Os autos da operação apontam que as vendas de ações ocorreram nos seis meses anteriores à divulgação do fato relevante sobre o rombo da Americanas "responsável por impactar significativamente" o preço das ações da varejista.
As operações atípicas chegaram a ser comunicadas à Comissão de Valores Mobiliários (CVM).
A PF indica que a "iminente descoberta pelo mercado do rombo nas finanças da empresa", com a troca do CEO da Americanas, em agosto de 2022, levou alguns investigados a fazerem "vendas milionárias de ações, antecipando-se ao fato relevante que geraria o derretimento do preço das ações em janeiro de 2023".
Em nota, a defesa de Gutierrez afirmou que "jamais participou de fraudes". A defesa de Anna não se pronunciou.
O MPF afirmou que, quando saiu a notícia de que Gutierrez seria substituído na chefia da Americanas, os investigados ficaram preocupados com a impossibilidade de esconder as fraudes do novo CEO. Assim, de acordo com a investigação, o grupo tentou "diminuir as consequências" das fraudes "discutindo estratégias que pudessem amenizar os danos que deveriam ser comunicados ao novo CEO".