A frota de veículos tragada pela inundação nos últimos meses afeta o movimento nas oficinas mecânicas e de estética automotiva no Rio Grande do Sul. Com aumento na demanda por esses serviços e estabelecimentos fora de operação em razão da enchente, a fila para liberar veículos avariados do conserto anda com o freio de mão puxado.
O tempo médio para entregar um veículo que precisa de reparos aumentou de 15 dias para 60 dias, segundo levantamento do Sindicato da Indústria da Reparação de Veículos e Acessórios no Estado (Sindirepa-RS). Além disso, 2,6 mil empresas desse ramo foram afetadas pela tragédia climática no Estado. Desse total, 750 seguem sem funcionar, segundo a entidade.
O presidente do Sindirepa-RS, Paulo Paim, afirma que a maior parte desse tempo para entregar os veículos não se concentra no conserto propriamente dito. O afunilamento ocorre diante do grande número de carros avariados pelo aguaceiro, que lotam os pátios das oficinas:
— Hoje, o tempo maior é da espera no pátio. Não é na execução do serviço. É muita demanda.
Paim afirma que é necessário pensar em programas para ajudar oficinas que precisam de recursos para retomar as atividades.
Proprietário da oficina mecânica Auto Clovis Box 18, em Canoas, Glauco Dias, 51 anos, afirma que o local trabalhava com cerca de 180 carros por mês. Agora, essa média subiu para 250, segundo o empresário. Dias afirma que existem dois movimentos que influenciam esse aumento. A migração de clientes de oficinas que estão fechadas para negócios que seguem abertos é um desses fatores, segundo o profissional:
— Tem uma série de impactos no negócio. Uma busca pela oficina, pelo reparo, pela manutenção preventiva, corretiva, aquela coisa normal. E também tem esses carros inundados. Tem esse volume a mais.
O pátio da oficina de Dias contava com poucos locais para estacionar carros nesta quinta-feira (27). Entre os veículos recolhidos, pelo menos três carregavam as marcas da inundação com mais intensidade. Outros já higienizados aguardavam a chegada de peças eletrônicas para finalização do conserto.
Demanda alta em diversas áreas
A demanda é espraiada por diversos segmentos do ramo de reparo automotivo. Além de áreas como mecânica, elétrica e eletrônica, também pega a parte de funilaria, estética automotiva e higienização. Na maior parte dos casos, antes de passar pelos reparos no motor e no painel, o veículo passa por uma higienização completa. Nesse processo, o veículo tem toda a parte interna desmontada para limpeza e troca de revestimentos afetados. O trabalho é complexo e detalhista, levando entre 15 e 30 dias dependendo da condição climática e do tamanho do estrago.
A Prime Centro Automotivo, também em Canoas, é uma das empresas que oferecem esse tipo de serviço e observou o volume de trabalho aumentar nas últimas semanas. O número de carros estacionados no entorno da oficina, com marcas de barro, dão o tom desse avanço na procura pelo serviço de reparo.
Antes da enchente, o tempo médio para entregar um carro era de sete dias. Hoje, dependendo da complexidade do serviço, esse tempo pode chegar em até 30 dias na Prime Centro Automotivo. O proprietário da empresa, Celso Ricardo Damasceno, 52 anos, afirma que isso também impacta na fila de espera de novos clientes, que pode ficar em 40 dias. Diante desse avanço na demanda, Damasceno teve de aumentar a equipe. Na tarde desta quinta-feira (27), todas as áreas do estabelecimento estavam ocupadas por funcionários que atuavam em várias funções, desde limpeza até montagem de carros. Além de realocar 10 funcionários de outra unidade, afetada pela inundação, contratou mais oito pessoas:
— O serviço aumentou no total. Tive que aumentar minha equipe. Eu estava com 13 pessoas até abril aqui. Hoje, estamos com 31.
Além do aumento no quadro de colaboradores, o empresário estuda abrir uma nova unidade em Porto Alegre para atender o avanço na procura pelos serviços oferecidos pela oficina.
O empresário explica que também teve aumento na busca por serviços de funilaria. Muitos veículos que estavam submersos sofreram danos na lataria causados por barcos e motos aquáticas usadas em salvamentos. Além disso, alguns sofreram estragos na pintura.
Problemas no futuro
Com carros cada vez mais dotados de componentes eletrônicos, esse é uma das partes que demanda mais atenção e trabalho nas oficinas, segundo o presidente do Sindirepa-RS:
— Um veículo que teve a parte eletrônica atingida pela água pode voltar a funcionar na mesma hora. Tu liga o carro, ele volta a funcionar, mas a gente não sabe ao certo até quando ele vai funcionar. A gente está sugerindo que esses componentes eletrônicos sejam substituídos. Pode levar um, dois, 10 dias, um ano, mas pode dar problema.
Nesse sentido, Paim e os demais integrantes da área reforçam a importância de buscar serviço especializado na hora do reparo. Isso evita problemas no médio e longo prazo, além de dar mais segurança ao usuário.
O presidente do Sindirepa-RS estima que uma normalização dos atendimentos em oficinas deve ocorrer apenas a partir do próximo ano diante da alta demanda pelos serviços e número de empresas afetadas.
Como é feito o reparo de carros inundados
É indicado que o serviço seja realizado em oficinas especializadas para evitar maiores danos ao veículo, aumento de custos e acidentes. A orientação para donos de veículos inundados é não tentar ligar o carro e buscar ajuda profissional imediatamente.
Higienização
O serviço depende do nível que a água atingiu o veículo. O carro passa por uma limpeza mais detalhada, com desmontagem de partes internas, faróis, para-choque, forro de porta e teto, painel de instrumentos, dutos de ar-condicionado, carpete e demais componentes plásticos. Além de retirar as marcas de lama e água, esse serviço busca retirar odores do veículo.
Mecânica
Todos os fluidos, como óleos, líquido de freio e arrefecimento são drenados. Componentes como filtros de óleo e ar são trocados. Parte de admissão, suspensão, freio e demais componentes também passam por essa revisão.
Elétrica
Componentes elétricos, como faróis, lanternas, sensores, alternador e motor de arranque passam por avaliação e eventual reparo ou troca.
Eletrônica
Essa parte do reparo ataca itens como módulos responsáveis por diversos serviços do veículo, como motor, airbag, sistema multimídia, controle de dispositivos, etc.