O Supremo Tribunal Federal (STF) volta a julgar, na quarta-feira (30), a "revisão da vida toda" do Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS). O direito, se concedido, possibilita ao aposentado usar toda a sua vida contributiva para o cálculo do valor de benefício, e não apenas os salários após julho de 1994.
A sessão desta quarta-feira deveria ter ocorrido no dia 23, com a expectativa de que o Supremo apenas pronunciasse o resultado do julgamento, já que os 11 ministros da Corte já votaram.
A regra pode beneficiar pessoas que tinham média salarial maior antes dessa data. Segundo a União, o impacto da revisão seria bilionário. A tendência é de que a proposta seja aprovada, pois a maioria dos ministros já votou a favor no mês de março, quando a análise foi suspensa por pedido de vista do ministro Kassio Nunes Marques.
Na ocasião, o placar ficou em 6 a 5. O relator da ação era o ministro Marco Aurélio, que se aposentou após dar voto favorável. Ele foi substituído por André Mendonça, mas em junho a Corte decidiu que votos de ministros aposentados devem ser mantidos.
O marco temporal de julho de 1994 foi definido em 1999. Até então, o cálculo do benefício considerava a média das contribuições dos últimos três anos. Depois, foi aprovada lei que determinou que a média seria feita com salários da vida toda, mas a partir de julho de 1994 – momento de estabilização econômica com o real.
Segundo Diego Cherulli, vice-presidente do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP), essa regra de transição tinha o objetivo de não prejudicar quem já estava no sistema e beneficiar a maior parte dos segurados.
— O legislador já sabia que a maioria das pessoas, se aplicasse a regra geral, teria redução da renda — observa o especialista.
Por isso, especialistas apontam que a "revisão da vida toda" é uma regra de exceção.
— Ela não é necessariamente benéfica a todos os aposentados e pensionistas. É preciso simular o valor sem a trava do mês de julho de 1994 e comparar com o benefício já concedido — observa Kerlly Hubach, professor de Direito Tributário e Previdenciário da Fundação Getúlio Vargas (FGV).
A tese também não se aplica a todos os casos. O professor também destaca a decadência do direito à revisão, que ocorre 10 anos após o primeiro pagamento.
— Quem se filiou após novembro de 1999 não é elegível à tese, pois a ele não se aplica a regra impugnada no Judiciário. Por exemplo, quem se aposentou em maio de 2012 e não requereu a revisão terá perdido o direito em junho de 2022 — afirma Hubach.
Cherulli também ressalta que são raros os casos em que a revisão será benéfica. Um exemplo é a "vida laboral invertida", quando o trabalhador começa contribuindo com mais e, com o tempo, passa a contribuir com menos. Outro caso é o de pessoas que sempre receberam tetos salariais, uma minoria entre os contribuintes.
Impactos para a Previdência
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) já decidiu, em 2019, a favor da revisão da vida toda. O STF analisa agora a constitucionalidade da norma com foco no prejuízo aos cofres públicos que ela traria.
Dyna Hoffmann, advogada e CEO do SGMP Advogados, explica que o principal argumento da União contra a revisão da vida toda "é o aumento de um benefício sem a contrapartida devida, ofendendo o equilíbrio financeiro e atuarial do Regime Geral de Previdência Social".
Segundo a equipe econômica do governo, o impacto seria de R$ 46 bilhões ao longo de 10 anos. Mas especialistas ponderam que esse cálculo é superestimado porque o número de pessoas beneficiadas não seria tão alto.
— Fizeram apenas uma média do valor do aumento e valores retroativos, considerando todos os benefícios ativos — critica Cherulli.
Os ministros do STF que já votaram contra a revisão em julgamento anterior também apontaram a dificuldade na contabilidade dos novos benefícios.
— Entre os argumentos de ordem prática está o afastamento de períodos com altos índices de inflação, antes do Plano Real, além das dificuldades administrativas de recuperação de informações fidedignas nas bases de dados da previdência social. Imagine colher dados da década de 1970 — observa Hubach.