Os proprietários de pequenos negócios que estavam à espera de alternativas após o veto ao refinanciamento de dívidas de micro e pequenas empresas afetadas pela pandemia, o chamado "Refis do Simples", terão novas opções para regularizar a situação. Nesta terça-feira (11), duas medidas foram publicadas em edição extraordinária do Diário Oficial da União como alternativas aos empresários com tributos em atraso.
A primeira é o Programa de Regularização do Simples Nacional, que vai permitir regularizar as dívidas com entrada de 1% do valor total do débito, dividido em até oito meses. O restante poderá ser parcelado em até 137 meses, com desconto de até 100% de juros, das multas e dos encargos legais.
A outra alternativa será aderir ao edital da Transação do Contencioso de Pequeno Valor do Simples Nacional. Nessa modalidade, os empresários poderão escolher entre as opções disponíveis de pagamento da dívida, com parcelamento e desconto.
Ambas as medidas podem ser aderidas de forma online, no portal Regularize.
Na avaliação do especialista em direito tributário e professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV) Gabriel Quintanilha, as medidas, por ora, resolvem o impasse até então gerado pelo veto.
— São opções interessantes. Mas o contribuinte precisa correr atrás para conseguir o mais rápido possível para não perder o prazo de adesão ao Simples — avalia Quintanilha.
A data final para inscrição no Simples é 31 de janeiro. Antes das medidas anunciadas, havia possibilidade de o prazo ser estendido até o fim de março. O governo não sinalizou se a primeira data permanece, agora, com as novas alternativas de regularização.
Impacto do veto
Na semana passada, o presidente Jair Bolsonaro vetou a prorrogação do Refis do Simples após orientação da equipe econômica do governo.
O projeto vetado pelo presidente iria permitir a renegociação de até R$ 50 bilhões em dívidas de empresas que tiveram perdas de faturamento como consequência da crise sanitária. O programa aprovado em dezembro previa que pequenos empresários e microempreendedores individuais que pagam tributos no regime Simples Nacional pudessem refinanciar as dívidas em até 180 meses e ter descontos sobre multas e juros.
Ao vetar o projeto, o presidente justificou seguir orientação do Ministério da Economia, com o argumento de que a medida desrespeita a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) ao abrir mão de recursos que seriam arrecadados pelos cofres do governo. O impacto estimado sem o veto era de R$ 1,2 bilhão. Mas a medida teve repercussão negativa no setor.
Comerciante no ramo de vestuário masculino, o empresário Mohamad Ahamed, de Alegrete, na Fronteira Oeste, recebeu com apreensão o veto e a possibilidade de não haver opção de refinanciamento das dívidas, tendo em vista a dificuldade financeira que já se arrasta desde o início da pandemia. Sem o Refis, ele estima que teria de desembolsar cerca de R$ 24 mil.
— Como que tu vais sobreviver nesses meses pela frente? Em dezembro houve uma reação boa, mas nós temos ainda que comprar o inverno. E, para isso, precisa de capital de giro, de crédito. Se estiver negativado, como vai acontecer com muita gente que não conseguir pagar, não vai conseguir — diz Ahamed.
O empresário estima que o prejuízo adquirido com a pandemia no seu negócio gire em torno de R$ 300 mil. Sem negociação com fornecedores ou programas de auxílio ao setor, o cenário poderia ser ainda pior. Um empréstimo via linha de crédito do Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Pronampe) foi uma ajuda que permitiu seguir com as portas abertas.
Para o especialista em direito tributário e professor da FGV Gabriel Quintanilha, a impossibilidade do Refis atrasa ainda mais a recuperação das empresas.
— Como os empresários vão se organizar se têm um cenário que há dois anos vem negativo, com perda de vendas, de arrecadação, e, agora, com uma variante relevante em que se discute inclusive novas restrições? — questiona Quintanilha.
Outra solução para o impasse gerado, segundo o próprio presidente Bolsonaro, seria o Congresso derrubar o veto. A análise, porém, só poderia ser feita na volta do recesso parlamentar, a partir de fevereiro. Antes das novas medidas anunciadas nesta terça, chegou a se cogitar que o Refis para as pequenas empresas pudesse sair por medida provisória (MP), mas a alternativa também foi descartada.
Conforme a colunista Marta Sfredo, o parcelamento para pequenas e microempresas cria mais dúvidas do que segurança. Isso porque, ao que tudo indica, o Programa de Regularização do Simples Nacional vale apenas para as pendências inscritas em dívida ativa, o que significa que o devedor já não está no Simples.
Impacto
Sem o refinanciamento, cerca de 350 mil pequenas empresas no país podem acabar sendo excluídas do Simples Nacional por estarem inadimplentes com o pagamento de impostos. Os débitos do Simples inscritos na dívida ativa da União somam R$ 137 bilhões. Para o pesquisador da FGV, a exclusão do programa pode significar o fechamento de muitos negócios.
— A partir do momento em que a empresa está em débito com a União ou outros entes, ela não poderá entrar no Simples. Nessa condição, muitas vão fechar, tantas outras vão demitir. Aquelas que conseguirem se manter, pode ser que não tenham uma vida tão longa — diz Quintanilha.
Ainda segundo o especialista, não há renúncia fiscal no caso do Refis, como foi alegado pela equipe do governo.
— Vai ter um parcelamento, uma prorrogação. Efetivamente, não é perdoar a dívida — defende.
— É importantíssimo que saia o Refis porque, sem ele, com certeza muitas empresas vão quebrar. Ninguém está se negando a pagar, mas a pandemia deixou sem condições — completa o comerciante Mohamad Ahamed.