Passados os prejuízos da estiagem e do desaquecimento provocado pela pandemia em 2020, a economia gaúcha deu sinais de recuperação. No entanto, após uma série de desempenhos no campo positivo, o Produto Interno Bruto (PIB) gaúcho interrompeu o ciclo e registrou queda de 3,5% no terceiro trimestre deste ano, na comparação com os três meses anteriores, superando a resultado nacional, de –0,1%, em igual intervalo.
Essa é a primeira baixa na margem (trimestre ante trimestre anterior) verificada desde o terceiro trimestre de 2020 no Rio Grande do Sul. Ainda assim, conforme os dados divulgados nesta quinta-feira (16) pelo Departamento de Economia e Estatística, vinculado à Secretaria de Planejamento, Governança e Gestão (DEE/SPGG), quando comparado com o mesmo período do ano passado, o PIB gaúcho apresentou alta de 4,2%, em linha com o desempenho nacional (4%).
Apesar da queda, a economia gaúcha continua acima do nível pré-pandemia, porém, agora, está abaixo do pico de produção registrado em 2013. A explicação, comenta a pesquisadora e coordenadora da DEE/SPGG, Vanessa Sulzbach, passa pelo agronegócio. Segundo ela, tradicionalmente, o setor impulsiona o desempenho no segundo trimestre, em razão do ingresso de importantes culturas, como é o caso da soja.
— Assim como a agropecuária elevou o PIB gaúcho no trimestre passado, a falta de expressividade desse setor no terceiro trimestre, o que já é uma característica sazonal. A própria base alta do período anterior também explica a queda de 3,5% — justifica.
Nesse contexto, o tombo, já esperado pelos analistas, foi de 10% na agropecuária. Por outro lado, indústria (+1,7%) e serviços (+1,5%) seguem em crescimento, o que é considerado um ponto positivo na avaliação dos especialistas. E, na soma dos desempenhos, no acumulado do ano, de janeiro a setembro, a alta no PIB do Estado chega a 12,2%, enquanto no Brasil o crescimento é de 5,7%.
Agropecuária
Economista-chefa da Federação da Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul (Farsul), Antônio da Luz afirma que o resultado não surpreende. Segundo ele, a queda é normal porque, depois da estiagem em 2020, neste ano a safra foi positiva.
— Se pegarmos o que aconteceu de janeiro até setembro e compararmos com este período anterior, a nossa economia ainda acumula crescimento de 12,2% e a nossa projeção para o fim do ano é de 9,49%. Ou seja, esperamos que no próximo PIB tenhamos um crescimento não tão forte como nos dois anteriores — projeta.
De acordo com o economista, diferentemente do país, o Rio Grande do Sul foi afetado por dois fatores: além da pandemia, a seca. E por essa razão o resultado do Estado confirma a conexão entre o agronegócio o desempenho da economia gaúcha
— Quando a safra vai bem a economia vai bem. Por isso, os resultados de safra precisam ter uma atenção maior, pois todos nós, ruralistas ou urbanos, nos beneficiamos com a agricultura — comenta.
Indústria
A base de comparação elevada também é um dos destaques do economista-chefe da CDL-Porto Alegre, Oscar Frank, para analisar os resultados gerais do PIB gaúcho. Ele percebe que, na medida em que os efeitos da safra 2021 se dissiparam, a ausência desse fator “reverberou” nos meses de julho a setembro.
Já quando o assunto é a indústria de transformação, a mais representativa do Rio Grande do Sul, a alta no Estado foi de 0,2%, contra -1% no Brasil na relação entre o terceiro e o segundo trimestres de 2021. Neste caso, o economista lembra que, entre abril e junho, a queda foi expressiva e o crescimento registrado no terceiro trimestre devolve uma parcela das perdas já consolidadas.
Por outro lado, Frank afirma que os dados demonstram que o segmento de manufatura ainda sofre os efeitos de uma conjuntura desfavorável no que se refere aos insumos e aos suprimentos.
Para o economista-chefe da Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Sul (Fiergs), André Nunes, o grande destaque vem da construção. Além de um dos motores de contratações no Estado e no país, trata-se, segundo ele, de um setor que gera impacto positivo sobre todos os demais segmentos industriais.
— Demanda máquinas e equipamentos, produtos eletrônicos, minerais, plásticos, químicos — acrescenta.
Serviços
Em alta, o setor de serviços experimentou entre os meses de julho e setembro os reflexos de uma maior circulação de pessoas. De acordo com Frank, o avanço na vacinação, a maior mobilidade e os ganhos sanitários “naturalmente” alavancaram o desempenho setorial.
— Isso auxiliou a obter os resultados no trimestre, praticamente devolvendo as perdas relacionadas com a pandemia — sustenta.
Por outro lado, Frank chama atenção para dois fatores relacionados às atividades: o juro e a escalada da inflação no período. No segundo aspecto, afirma que o desempenho teria sido mais consistente sem a aceleração inflacionária que acaba por retirar o poder de compra dos trabalhadores. E complementa:
— Também creio que neste trimestre passamos a observar uma materialização mais forte do aumento da taxa Selic sobre os custos de crédito.
Dentro do grupo dos serviços, as atividades do comércio no Estado e no país registraram quedas semelhantes (-0,3% no RS e -0,4% no país). Para o presidente da Fecomércio-RS, Luiz Carlos Bohn, não há dúvidas de que as maiores flexibilizações e o avanço da população imunizada permitiram a reação dos serviços que mais dependem da mobilidade e da segurança das famílias. Nesse cenário, com o redirecionamento do consumo de bens para serviços, o comércio perdeu força, como era esperado.
— Apesar de continuarmos avançando na reabertura das atividades, o cenário é desafiador, com inflação elevada comprimindo o poder de compra das famílias e crédito mais caro com juros em alta, limitando a expansão do consumo — comenta Bohn.