O Rio Grande do Sul registrou 203,8 mil acordos dentro do Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda (BEm) em 2021. O Estado ocupa a quinta colocação no ranking de maior utilização do programa neste ano no país, atrás de São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Bahia. Levando em conta só a Região Sul, o Estado lidera.
O BEm foi reeditado pelo governo federal em abril via medida provisória e terminou no último dia 25. O programa permitiu a redução de jornada e salário ou a suspensão de contratos de trabalho durante a pandemia. Os trabalhadores têm direito à estabilidade por tempo equivalente. No país, foram registrados 3,2 milhões de acordos em 2021 (contabilizações tardias, após o encerramento do programa, podem alterar a quantidade final).
Analisando os dados por setores, a indústria lidera com praticamente a metade do total de acordos firmados dentro do programa no Estado em 2021. O setor concentra 100.674 acertos no ano, seguido por serviços e comércio (veja o gráfico abaixo).
O economista e professor da Escola de Negócios da PUCRS Ely José de Mattos avalia que esse protagonismo da indústria é normal diante da dinâmica de operação do setor. O especialista destaca que a indústria costuma ser mais resistente em relação a mudanças na força de trabalho em razão da necessidade de manter mão de obra especializada.
— A indústria tem essa característica de maior estabilidade e maior especialização. Então, tem resistência maior à rotatividade do que tem, por exemplo, o comércio. A indústria usa esses programas para manter o vínculo do funcionário, diminuir linhas de produção, acionar quando volta a ter atividade, fechar quando diminui — diz Mattos.
Dentro da indústria, o segmento de fabricação de calçados ocupa a maior parte do bolo, com 58.310 acordos. O presidente-executivo da Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados), Haroldo Ferreira, afirma que o programa foi essencial para o segmento, principalmente nos meses de maio, junho e julho. Esse período foi marcado pela recuperação após os efeitos dos fechamentos nas atividades no Estado entre fevereiro e abril diante do recrudescimento da pandemia.
— O BEm foi fundamental para preservar postos de trabalho para as indústrias. Na recuperação também é importante, porque, quando a indústria desemprega, até o ponto em que recontrata novamente, tem todo um atraso até que o novo trabalhador pegue o ritmo — salienta Ferreira.
A Calçados Bibi, com sede em Parobé, no Vale do Paranhana, é uma das empresas que utilizou o BEm. A presidente da empresa, Andrea Kohlrausch, afirma que o programa foi mais usado pela companhia em 2020 diante dos maiores picos de fechamento das atividades em meio à pandemia. Andrea destaca que a empresa sempre priorizou manter os funcionários e não demitir. Em 2021, o benefício foi utilizado uma vez e de maneira pontual na troca de coleções, segundo Andrea. No geral, a executiva afirma que a ferramenta foi importante para acompanhar ritmo na retomada.
— A gente sempre acreditou na retomada. Com o nosso quadro, com a manutenção dos talentos e tudo mais, é muito mais fácil. Não precisam estar empregando novamente ou buscando no mercado a cada retomada. Contamos com quem já conhece nossa cultura – explica Andrea.
Modelos
Dentro dos 203,8 mil acordos registrados no Estado em 2021, 32,27% são de suspensão de contrato e 23,63% de redução de 50% da jornada. Na sequência, figuram reduções de jornada de 25% e de 70%. O programa atingiu 147.284 trabalhadores e 33.798 empregadores no Estado.
Neste ano, o número de acordos foi menor tanto no país quanto no Estado na comparação com 2020. Isso porque o volume de verba destinada ao programa foi menor. Em 2021, o governo federal repassou R$ 5,5 bilhões em todo o país. No ano passado, foram 34,2 bilhões, segundo o Ministério da Economia. A pasta não informa os repasses por Estado.
Atualmente, o Congresso discute a aprovação de texto que renova o programa. A matéria inclui outras mudanças nas leis trabalhistas, como alteração nas regras de contratação de jovens e pessoas com mais de 50 anos. O texto foi aprovado na Câmara, mas ainda não passou pelos senadores.
Incerteza justificaria medida preventiva
Conversando com especialistas, dois pontos são praticamente unânimes com relação à relevância do benefício. O primeiro é o atraso para reeditar o programa neste ano. O governo federal relançou o benefício no fim de abril após o recrudescimento da pandemia e das restrições nas atividades econômicas. Há entendimento geral no sentido de que houve demora para oferecer o socorro novamente.
O segundo ponto trata da necessidade de ter carta na manga para ativar o programa nos mesmos moldes nos próximos meses no caso de piora na pandemia. A economista-chefe da Federação do Comércio de Bens e de Serviços do Estado (Fecomércio-RS), Patrícia Palermo, avalia como positivo criar um gatilho para a rápida implementação desse tipo programa. No entanto, destaca que essa ferramenta tem de ser para casos emergenciais e não permanente:
— Não é porque a gente vai andar numa estrada plana que a gente não vai ter um estepe. Então, é bom a gente ter estepe lá atrás para que, caso alguma coisa aconteça, não prejudique a nossa viagem. Se a gente tiver esse tipo de instrumento à disposição, melhor.
Mattos, da PUCRS, afirma que o efeito da variante Delta em outros países acende um alerta em relação a medidas preventivas contra uma nova onda da pandemia. Nesse sentido, também cita a necessidade de agilizar esse tipo de socorro aos setores da economia:
— Seria uma alternativa inteligente deixar isso engatilhado para não acontecer a mesma coisa que aconteceu no início do ano e atrasar a edição da medida.