Em meio ao avanço nos valores de combustíveis e alimentos, o presidente Jair Bolsonaro pretende zerar tributos federais sobre o óleo diesel e o gás de cozinha. Se for cumprida, a promessa pode gerar baixa de cerca de R$ 0,35, em média, em cada litro de diesel no país. No caso do gás (GLP), a redução estimada ficaria na faixa de R$ 2,30 por botijão de 13 quilos. As projeções têm como base dados recentes de Petrobras e Agência Nacional do Petróleo (ANP).
A intenção de Bolsonaro foi anunciada na noite de quinta-feira (18). Pressionado pelos caminhoneiros, o presidente sinalizou que o corte sobre o diesel valeria por dois meses, a partir de 1º de março. A redução de impostos sobre o gás seria por tempo indeterminado. O que intriga analistas é como o governo compensaria a perda de arrecadação neste período de dificuldades para a economia e as contas públicas.
Segundo a Petrobras, tributos federais representam 9% do preço do diesel S10 no Brasil. Pesquisa da ANP apontou que, entre 7 e 13 de fevereiro, o litro do combustível custou R$ 3,875, em média, no país. Ou seja, o corte de impostos federais corresponderia a R$ 0,349.
No Rio Grande do Sul, o valor médio do diesel S10 foi de R$ 3,821 no mesmo período. A parcela de 9% equivaleria a R$ 0,344.
No gás de cozinha, o impacto de tributos federais é menor, de 3%. Entre 7 e 13 de fevereiro, o botijão de 13 kg custou, em média, R$ 78,55 no país e R$ 76,04 no Estado. Assim, a redução de impostos sobre o GLP pode diminuir o preço em R$ 2,35 no Brasil e em R$ 2,28 no Rio Grande do Sul.
O avanço de preços
O recente aumento de combustíveis espelha a recuperação do petróleo no mercado internacional. O valor da commodity, calculado em dólares, é considerado pela Petrobras na hora de definir o patamar de seus produtos nas refinarias. Logo, o real enfraquecido ante a moeda americana tende a elevar os custos para os consumidores no Brasil.
Sócio-fundador da consultoria MaxiQuim, João Luiz Zuñeda avalia que o país precisa discutir uma "nova fórmula" para os combustíveis. Ele reconhece as dificuldades trazidas pela intensa volatilidade dos preços para o consumidor. Mas pondera que a Petrobras não pode ser alvo de medidas intervencionistas, sob risco de piora nas finanças da companhia.
— A gente não pode mais fugir desse debate. É algo que envolve Petrobras, governo federal e Estados — afirma.
Em janeiro, o Sulpetro, representante dos postos gaúchos, manifestou apoio à política de paridade da estatal. Contudo, relatou que, no período de crise econômica, "reajustes em intervalos curtos podem ser prejudiciais ao consumidor".
Na visão do economista-chefe da consultoria ES Petro, Edson Silva, uma possível saída para o quadro passaria por ampla reforma tributária no país. A questão é que o tema envolve complexidades, diz o analista:
— A discussão sobre os preços de combustíveis passa por uma reforma tributária. Mas há quanto tempo se fala no projeto, que não vai para frente?
Além de tributos federais, os preços de combustíveis também são impactados pelo ICMS. Neste mês, o governo federal apresentou projeto que muda a cobrança do tributo sobre os produtos.
O projeto desperta resistência dos Estados, devido ao peso do impostos nos cofres de cada unidade da federação. O comitê que reúne secretários estaduais da Fazenda, o Comsefaz, entende que a política de preços dos combustíveis "deve ser discutida com reforma tributária ampla".
Reflexos na inflação
Enquanto isso, a elevação dos valores pressiona a inflação, que já vinha sendo impactada pela disparada de alimentos na pandemia. Na quinta-feira, a Petrobras anunciou novos reajustes nas refinarias sobre o diesel, de 15,2%, e a gasolina, de 10,2%.
— O impacto na inflação não é desprezível. O aumento do diesel afeta preços de fretes. O governo zerou tributos federais, mas é uma medida momentânea, para apagar o incêndio. A alta na gasolina tem efeito direto para o consumidor — frisa o economista André Braz, especialista em preços da Fundação Getulio Vargas (FGV).
Sócio-diretor da gestora de investimentos Galapagos WM, Arnaldo Curvello tem visão semelhante. O analista lembra que, no geral, a inflação não está em nível descontrolado no país, mas considera que o avanço dos combustíveis preocupa.
A situação, diz, deve forçar a alta na taxa básica de juro, a Selic. Diante desse cenário, Curvello entende que o país precisa ser mais "eficiente" em seus gastos para atrair mais investimentos externos e, assim, reduzir a pressão do dólar alto.