Distribuidora de energia elétrica em Goiás, a Celg-D foi vendida à italiana Enel na reta final de 2016. Secretária estadual da Fazenda à época, Ana Carla Abrão diz se orgulhar da privatização. Em conversa com GZH, lembra que a companhia goiana enfrentava dificuldades de caixa, em situação parecida com a da CEEE-D. Na visão da economista, processos de desestatização geram melhorias para os consumidores, mas os ganhos não ocorrem do dia para a noite. Veja os principais trechos da entrevista com Ana Carla, hoje sócia da consultoria Oliver Wyman.
Quais foram os maiores desafios no processo de privatização da Celg-D?
O principal desafio é de comunicação: mostrar para a população que a privatização não significa que a empresa vai embora. Lembro que, muitas vezes, as pessoas falavam: "Ah, Goiás vai perder a Celg, a Celg vai embora de Goiás". A Celg não vai para lugar nenhum. A Celg é privatizada para ter gestão mais eficiente e um dono com capacidade de investimento.
O primeiro desafio é de comunicação e esclarecimento para a sociedade. O movimento de privatização vem para resolver uma situação de baixo investimento, de baixa qualidade de prestação de serviço, de salários muitas vezes completamente fora dos padrões de mercado.
O que a senhora tem acompanhado sobre a CEEE-D?
Não estou acompanhando muito, mas me parece que é um processo muito semelhante ao da Celg. Ou seja, é uma empresa em um Estado com grande potencial. Vem sofrendo com falta de investimentos ao longo dos anos.
É uma empresa que, por sua situação financeira, acaba gerando problemas para o caixa do Estado, com dificuldades no repasse de ICMS. No caso de Goiás, a Celg representava cerca de 10% da arrecadação do imposto. Então, cada vez que a Celg atrasava o repasse, colocava em risco o pagamento da folha de pessoal.
Parece que a CEEE-D está nessa situação. É uma empresa muito endividada. A Celg também era assim. São situações muito semelhantes. Até por isso os desafios são parecidos, inclusive do ponto de vista de atração de investidores. Em Goiás, conseguimos vender a companhia com ágio significativo. Houve trabalho para mostrar que a deterioração da empresa foi resultado de má gestão, de uma gestão sem foco, e não de inviabilidade financeira.
O que pesou para despertar o interesse privado à época?
O fator determinante foi o potencial do mercado local. Goiás cresce mais do que a média nacional e, obviamente, vinha de processo de ajuste fiscal. Diria que os dois fatores principais foram esses. Vínhamos tratando a questão fiscal de forma muito responsável. O governador Eduardo Leite se destaca pela gestão fiscal responsável.
Para conseguir privatizar a CEEE-D, o governo estadual tem de abrir mão de parte do ICMS devido pela companhia.
É o que digo: há sempre críticas e interesses nesses processos e na manutenção de uma empresa ineficiente. Mais recentemente, o governador do Estado (Ronaldo Caiado) brigou com a Enel, que comprou a Celg. A empresa comprou uma companhia completamente sucateada, colocou R$ 5 bilhões de investimento no primeiro ano. Obviamente, o resultado demora a maturar.
As pessoas criticam, mas não consideram que a alternativa à venda, e isso vale para a CEEE-D, é a quebra da empresa. Não é uma questão de "Ah, comprou barato" ou "Ah, a empresa não melhorou o serviço no curto prazo". Se nada disso ocorrer, o que vai acontecer é a CEEE-D quebrar as contas do Estado, impactando, principalmente, o cidadão.
Em caso de confirmação da venda da CEEE-D, a melhora nos indicadores de qualidade do serviço tende a levar algum tempo? Não seria momentânea?
Não é do dia para a noite. Não podemos imaginar que o processo de deterioração, que levou décadas, vai ser revertido em dois ou três anos. É um processo lento. Estamos falando de infraestrutura. É um processo de troca de equipamentos, de investimento elevado. Mesmo com as críticas ao processo de privatização da Celg, os indicadores da empresa melhoraram.
É um processo difícil, gera resistência. Dos meus dois anos de gestão à frente da Secretaria da Fazenda de Goiás, se tem um processo do qual me orgulho, como um legado, é a privatização da Celg, feita com transparência.