Aprovado pelo Congresso no apagar das luzes de 2020, o projeto de lei que cria a terceira fase do Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Pronampe) corre risco de não sair do papel. O texto que prevê a liberação de R$ 10 bilhões ao Fundo de Garantia de Operações (FGO) como garantia a novos empréstimos foi aprovado pelo Senado em 11 de novembro e pela Câmara dos Deputados em 22 de dezembro.
Desde então, aguarda sanção do presidente Jair Bolsonaro, o que ainda não ocorreu. Segundo a Secretaria-Geral da Presidência, a matéria está "em análise na subchefia de assuntos jurídicos".
Os R$ 10 bilhões têm como origem sobras de outra linha criada pelo governo federal durante a pandemia, o Programa Emergencial de Suporte a Empregos (Pese). Como é fruto de crédito extraordinário, previsto dentro do "orçamento de guerra" válido até 31 de dezembro, o recurso precisaria ser gasto até o final do ano.
O próprio projeto de lei aprovado no Congresso destaca que as operações de crédito não poderão ser contratadas após o último dia útil deste ano. Depois desse prazo, não há previsão orçamentária para o Pronampe e a continuidade do programa é incerta.
- Provavelmente, o governo não vai liberar esse recurso extra porque o prazo é muito exíguo. A não ser que libere para dois dias de 2020 apenas - diz Lucas Schifino, gerente da assessoria parlamentar da Fecomércio-RS.
Nas duas etapas anteriores do Pronampe, os bancos repassaram R$ 3,26 bilhões em 62,2 mil operações no Rio Grande do Sul. Balanço do FGO de 21 de dezembro indica que o Estado foi o segundo que mais fechou acordos, atrás apenas de São Paulo, e o terceiro em volume de repasses, aquém de São Paulo e Minas Gerais. Em todo o país, foram travados 474 mil acordos, totalizando R$ 37,7 bilhões no programa nas duas primeiras fases.
Analista de soluções financeiras do Sebrae-RS, Augusto Martinenco nota que a renovação do programa é ansiada pelo empresariado gaúcho, que segue em busca de recursos para superar a queda no faturamento durante a crise do coronavírus. No entanto, Martinenco ressalta que o pouco tempo para operacionalizar a terceira fase do programa é um empecilho para que o dinheiro chegue às empresas.
- Sem sanção presidencial não é possível operacionalizar a terceira fase do Pronampe. E, mesmo se for sancionado, os bancos teriam pouco tempo para liberar esses R$ 10 bilhões. Por mais que haja demanda ainda, é uma situação muito complexa - avalia Martinenco.
Sendo assim, as sobras do Pese deverão ser utilizadas para abater a dívida pública. Desde a segunda quinzena de outubro não são registradas novas operações no Pronampe devido à falta de recursos. A baixa taxa de juro (a Selic, hoje em 2%, mais 1,25% ao ano) e as condições de pagamento (carência de até oito meses e parcelamento da dívida em até 36 meses) tornaram a linha a mais disputada pelos pequenos negócios durante a pandemia.
Expectativa
Como o tempo entre a eventual sanção de Bolsonaro e a liberação de recursos é curto, há instituições financeiras que já vem mantendo contato com empresários para atender à demanda, caso os recursos sejam garantidos pelo governo.
A reportagem apurou junto a entidades empresariais gaúchas que gerentes da Caixa vem sinalizando a empreendedores a possibilidade de novos empréstimos via Pronampe. Para isso, pedem que os interessados se manifestem até esta quarta-feira (30). Procurada, a instituição financeira informou, por meio da assessoria de imprensa, que não falaria sobre o tema.
Entre dirigentes de diversos setores há ainda a esperança de que a terceira fase seja implementada, mesmo com o prazo enxuto para liberação do dinheiro.
- Em geral, o faturamento das empresas está na metade do que era antes da pandemia. Ainda não se chegou a um ponto de equilíbrio. Seria um fôlego a mais (a terceira fase) - diz a presidente da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes no Rio Grande do Sul (Abrasel-RS), Fernanda Tartoni.
O presidente da Associação Gaúcha para o Desenvolvimento do Varejo (AGV), Sergio Galbinski, ressalta que, para muitos comerciantes, a obtenção de capital de giro ainda é fundamental para a sobrevivência dos negócios.
- Se as empresas fecham, o desemprego aumenta. Aí, depois, não adianta o governo fazer campanha de recuperação de empregos - aponta.
Na avaliação do dirigente, segmentos como vestuário e calçados seguem entre os mais afetados pela queda na demanda nos últimos meses. Neste contexto, a obtenção de capital de giro pelo Pronampe poderia ajudar essas empresas a atravessar a crise.
O programa
O que é
- Criado pela União para ajudar os pequenos negócios que tiveram o faturamento afetado pela pandemia de coronavírus, o Pronampe foi aprovado em abril, sancionado em maio e regulamentado em junho
- Os empréstimos começaram a ser liberados pelos bancos a partir de julho
- A linha de crédito tem aval do Fundo de Garantia de Operações (FGO), o que diminui o risco de crédito aos bancos que repassam os valores
Como funciona
- Podem recorrer à linha de crédito microempreendedores individuais (MEIs), micro e pequenas empresas com faturamento anual de até R$ 4,8 milhões e profissionais liberais
- A empresa pode tomar empréstimo equivalente a até 30% da receita bruta registrada em 2019
- O juro é a taxa Selic, hoje em 2% ao ano, mais 1,25% ao ano
- Há carência de até oito meses e o pagamento pode ser realizado em até 36 meses
Disponibilidade
- Desde outubro, os recursos da segunda fase do programa se esgotaram
- A terceira fase, que prevê aporte de R$ 10 bilhões ao FGO, foi aprovada pelo Congresso, mas aguarda sanção do presidente Jair Bolsonaro para que os bancos possam realizar os empréstimos até o final de 2020
Volume liberado
Na soma das duas fases, conforme balanço divulgado em 21 de dezembro, o RS é o segundo Estado com mais operações e o terceiro em volume de recursos liberados. Confira o total de contratos e valores dos empréstimos por Estados
- SP: 105.117 (R$ 8,04 bilhões)
- RS: 62.281 (R$ 3,26 bilhões)
- MG: 60.943 (R$ 4,37 bilhões)
- PR: 44.759 (R$ 2,99 bilhões)
- SC: 38.129 (R$ 2,25 bilhões)
- País: 474.076 (R$ 37,7 bilhões)