O pedido de proteção contra falência feito pelo Grupo Latam Airlines nos Estados Unidos nesta terça-feira (26) mostra que governos precisam agir rapidamente para socorrer companhias aéreas, sob risco de prejudicarem sua recuperação econômica quando a pandemia de coronavírus for controlada, afirmaram executivos da Associação Internacional de Transporte Aéreo (Iata).
O pedido da Latam inclui suas afiliadas no Chile, Peru, Colômbia, Equador e Estados Unidos; as da Argentina, do Brasil doe Paraguai não foram incluídas no documento.
— A aviação é um instrumento importante tanto na exportação de commodities quanto na reativação do turismo, e os países em desenvolvimento podem ter mais problemas na retomada se descuidarem do setor — afirmou o economista-chefe da entidade, Brian Pearce.
Para o diretor-geral da Iata, Alexandre de Juniac, os governos devem entender que é preciso agir para que uma emergência temporária não se torne crise permanente. Juniac ressaltou no entanto que o recurso ao chamado Capítulo 11 (lei americana que concede prazo às empresas para se reorganizarem financeiramente) dá a proteção necessária para reorganizar as dívidas e retomar as atividades em bases apropriadas.
— Se as aéreas puderem usar esse instrumento, é uma boa notícia. O problema é que nem todas terão esse acesso — afirmou o diretor-geral.
Pearce disse que não há como saber o número de empresas que podem seguir o mesmo caminho da Latam, mas dados do ano passado mostravam que só 30 entre mais de 120 empresas concentravam desempenhos favoráveis.
— Pedir recuperação judicial, no entanto, não significa desaparecer. Até o momento, menos de dez companhias chegaram a impasse financeiro, e parte delas está reestruturando seus modelos de negócios — disse o economistas-chefe.
Nas contas da Iata, as companhias do setor devem perder US$ 61 bilhões (cerca de R$ 335 bilhões) no segundo trimestre deste ano; na média, elas têm caixa para mais dois meses, mas a situação é bastante desigual — algumas aéreas asiáticas e do Oriente Médio podem suportar ao menos mais nove meses, enquanto latino-americanas chegam a no máximo cinco.
No total, governos já destinaram US$ 123 bilhões (cerca de R$ 677 bilhões) ao setor, a maior parte deles (US$ 50,4 bi) em empréstimos e no subsídio a salários (US$ 34,8 bilhões). O socorro porém tem distribuição desigual.
Enquanto nos EUA ele é de 32,7% das receitas com passagens das companhias em 2019, no Brasil ele é praticamente inexistente — na média, o apoio de governos latino-americanos é de 0,3% das receitas, mas os principais pacotes são na Colômbia e Chile.
Pearce alerta, porém, que "o tratamento pode estar colocando o paciente em perigo", porque mais da metade dos recursos colocados à disposição das empresas é na forma de dívidas: além do empréstimos, há US$ 11,5 bilhões em garantias e cerca de US$ 5 bilhões em tributos cujo pagamento foi postergado.
Nas contas da Iata, isso significa que as companhias entrarão em sua fase de retomada altamente endividadas, chegando ao final de 2020 com um passivo de US$ 550 bilhões, um problema para um setor que terá alta nos custos por causa das medidas para prevenir contágio pelo coronavírus e, em geral, vem encontrando dificuldades para se financiar no mercado de capitais.
Setor aéreo
Devido à pandemia de coronavírus, as empresas aéreas tiveram que interromper suas operações em todo o mundo. No Brasil a malha aérea foi reduzida a cerca de 10% do normal. A Gol, líder no mercado doméstico, reduziu a oferta em 92% e mantém 50 voos ao dia. A Latam, em 95%, e suspendeu os voos internacionais em abril. A Azul manteve 70 voos diários, 90% a menos que o normal.
Há duas semanas, o presidente da Azul Linhas Aéreas, John Rodgerson, disse que o pacote de ajuda via Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) às três grandes companhias aéreas que atuam no país deve ser de cerca de R$ 4 bilhões.
Sem voar, a empresa perde receita e ainda tem custos para manter o avião em solo. Um arrendamento de aeronave pode custar até US$ 100 milhões (R$ 543 milhões), valor diluído em parcelas mensais ao longo do contrato.
A companhia aérea Avianca Holdings também anunciou no dia 10 de maio que formalizou um pedido de recuperação judicial nos Estados Unidos para "preservar e organizar os negócios". Em comunicado, a empresa citou os efeitos econômicos da pandemia de coronavírus no setor aéreo.
Na segunda-feira (25), a companhia aérea Lufthansa e o governo alemão concordaram com um plano de resgate da empresa de EUR 9 bilhões (R$ 53,3 bilhões). A ajuda fará do Estado o principal acionista do grupo com 20% do capital.
— Antes da nova pandemia de coronavírus, a empresa estava com boa saúde e lucrativa e tinha boas perspectivas para o futuro — disse o governo federal alemão em comunicado anunciando a mistura de investimentos e empréstimos estatais.
Em avaliação feita no fim de março, a Iata disse que as companhias no mundo todo precisam de uma injeção imediata de recursos de US$ 200 bilhões (cerca de R$ 1 trilhão) para que não haja uma onda de falências.